Opinião

‘Opinião’ é a categoria em que se inserem os meus artigos neste jornal. 

Ora bem, ‘opinião’ é um substantivo feminino, que se refere à maneira própria que o emissor tem de julgar um assunto. Sendo uma opinião uma emissão orgânica e, portanto, exclusiva do emissor, eis a minha opinião desta semana, sobre um tema que tem vindo a tornar-se cada vez mais presente em todo o tipo de notícias, das sensacionalistas às mais pirosas: maternidade. 

Um tema que no mundo ocidental, de geração em geração, tem vindo a tornar-se cada vez mais secundário, por causa de tantas razões que acabam quase sempre por ser de natureza ‘carreirista’ e do ‘atraso’ que um filho representa na hipótese de progressão da fêmea num mundo ainda dominado por machos. 

Novos feminismos à parte, este assunto é preocupante se pensarmos em todas as consequências que a queda lenta do capitalismo tem tido nos jovens e na sua precariedade. Já não bastava tudo aquilo que nos aconteceu, dos convites à emigração à saída cada vez mais tardia da casa dos pais e a consequente infantilização do jovem adulto, para termos de nos preocupar agora com um novo tema, que regula de forma coerciva uma das nossas últimas liberdades, o útero. 

Mais aterrador que o terror do despedimento de um trabalho que já é precário por si só, imaginem o que é para uma geração inteira, cheia de formação e sonhos e desejos e ansiedades maiores que a própria vida, pensar em ter filhos. Se os trintas já são os novos vintes e a vida se vive livre e sem grandes decisões de fundo, com inícios, retrocessos e recomeços cada vez menos importantes, porque a consequência da precariedade é a indecisão, e voltar atrás no percurso já ‘é normal’, a tomada de decisões é cada vez mais adiada até que as coisas se endireitem. Só que parece que teimam em não se endireitar nunca, daí que muito dificilmente se criem as condições para as primeiras braçadas fora de pé. Nem para dividir casa, quanto mais para ter um filho!…

Foi ao multibanco levantar dinheiro e nos trinta e três segundos de distracção, olhou para o lado e viu alguém com uma criança. E ali estava ela, uma das muitas jovens férteis, se bem que já a passar do prazo, a tentar uma vida adulta no último grito da moda que se pode gritar, um bocado roufenha, de smartphone em punho enquanto faz um update da sua maravilhosa vida ficcional numa rede social e coscuvilha o que andam os outros a fazer. Está ali só para levantar dez euros, totalmente concentrada para não perder as estribeiras. Sempre no limite. A espera parece longa, mas é interrompida pelo barulho fino e leve da criança cheia de vida e cor, com as bochechas rosadas. Chega a sua vez de avançar para as teclas. Levanta ‘outras importâncias’ porque a sua situação financeira já é permanentemente importante; está de tal forma distraída que se esquece de rejeitar o talão como faz sempre, na tentativa de exercitar um hábito para se convencer que é amiga do ambiente, quando na verdade é, mas é amiga da sua sanidade mental e do impacto profundo que o saldo da sua conta pode ter em tudo e mais alguma coisa.

Oufffff! Onde é que já vai a sucessão de contratos de seis meses, a prisão do Sócrates ou os vistos gold?… Bof!… São tão velhos como o post do Instagram que fez antes de tudo isto acontecer…! 

Pensar em ter filhos depois de ver o saldo da conta, por exemplo, é olimpicamente pior do que pensar em ter filhos porque a empresa para a qual se trabalha encara a maternidade ou a vontade manifesta de enveredar por esse caminho com um despedimento. É uma resposta clara que não deixa margem para dúvidas. Diz-se que o decréscimo do índice de produtividade da Mulher está intimamente ligado à maternidade, logo, na lógica corporativa e empresarial, não é possível admitir colaboradoras qualificadas a preços baixíssimos que ainda por cima desejem constituir família. 

Discordo. Discordo de tudo isto com tanta violência, que se me parece absurdo atrasar um dos maiores acontecimentos da vida por falta de dinheiro, mais me parece absurdo despedir uma Mulher porque decide ser Mãe. Alguém teve de engravidar para pôr no mundo quem condena e está a obrigar as Mulheres de hoje a este fatídico retrato-da-ainda-não-mãe-enquanto-já-não-tão-jovem.

joanabarrios.com