Bonecas para evitar pedofilia?

É mesmo esta a sociedade que queremos? A do facilitismo? A sociedade que fecha os olhos aos seus problemas e, ao invés de os tentar ultrapassar e resolver, opta antes por os contornar, como se fosse uma criança que tapa os ouvidos e os olhos quando não quer ver os pais zangados consigo? 

A notícia saiu no início deste ano mas tinha tanto de surreal que tornava difícil a missão de acreditar: estavam a ser desenvolvidas bonecas, do tamanho de crianças reais, com rostos de crianças e cobertas de uma silicone em tudo semelhante à pele humana. Estas bonecas tinham sido criadas por um homem que admitiu sentir-se sexualmente atraído por crianças e que viu na sua criação uma forma de controlar os seus impulsos sexuais e ajudar outros pedófilos a satisfazerem os seus impulsos sem cometerem um crime. Ao mesmo tempo que ainda faturava, claro está.

Esta semana este assunto voltou aos jornais – ingleses sobretudo. Primeiro porque foi revelado que estas bonecas, nomeadamente no tamanho equivalente a uma criança de três anos, já estavam disponíveis para compra, através de um site internacional que entrega em Inglaterra, com valores entre os 500 e os 850 euros. E, aparentemente, estas bonecas são completamente legais neste país. Ou, pelo menos, ocupam um vazio legal, que permite a sua venda. Isto apesar da multiplicidade de críticas que se têm feito ouvir, como as de Kathleen Richardson, da campanha Against Sex Robots, que alega que estas bonecas “fazem parte de um sistema que explora crianças vulneráveis, não tendo qualquer mérito terapêutico”.

O que é certo é que as bonecas estão aí e tem havido compradores para elas. É mesmo esta a sociedade que queremos? A do facilitismo? A sociedade que fecha os olhos aos seus problemas e, ao invés de os tentar ultrapassar e resolver, opta antes por os contornar, como se fosse uma criança que tapa os ouvidos e os olhos quando não quer ver os pais zangados consigo? Podem dizer-me que dar uma boneca destas a um pedófilo é o mesmo que dar metadona a um heroinómano. Mas não é. É, isso sim, o elogio de uma sociedade que se demite. 

Crónica originalmente publicada na edição em papel do B.I. de 25/06/2016