Os desconectados. Há quem faça like a uma vida sem redes sociais

Obrigam os amigos a enviar os convites de aniversário por sms e são os últimos a conhecer o vídeo viral do dia. Mesmo assim, quem escolhe estar ausente das redes sociais não esconde um certo orgulho e garante que, mais cedo ou mais tarde, fica-se sempre a par de tudo

Os amigos já sabem que, se organizam um jantar de aniversário no Facebook, não vão contar com o clicar no “vou” ou “não vou” de André. “Mas não é por isso que fico sem jantar”, brinca o jovem de 24 anos, fã de conversa de café, cigarro e esplanada, mas avesso à conversa escrita a teclas de computador.

Não tem Facebook, Instagram ou Snapchat, mas confessa, ainda que se denote um baixar de voz de alguma vergonha, que teve Hi5. “Usava mais para publicar textos meus e para falar com amigos, como toda a gente.” Com o tempo, “acho que até mais com a idade”, conta, percebeu que não precisava de redes sociais para chegar a quem queria. Mesmo assim, fez uma tentativa. “Quando comecei a trabalhar, criei uma conta de Facebook e de Twitter mas, sinceramente, se me perguntarem, nem me lembro do nome de utilizador.” E nem mesmo o facto de ser jornalista o leva a ver as redes sociais como ferramenta de trabalho. “Ainda tentei fazer um ou outro contacto pelo Facebook, como forma de teste, e nunca tive resposta. Acabei por desistir e voltar aos emails e telefonemas.”

A obrigação profissional de estar sempre atualizado faz com o que o canal de televisão esteja eternamente ligado em programas de informação e que os jornais online sejam obrigatórios. “Nunca senti que fiquei sem saber alguma coisa por não ter Facebook”, garante ao i. “Por exemplo, sei que o Pedro Dias acabou de roubar um jipe em Vila Real”, fazendo jus ao que passava em rodapé à hora da entrevista. Já os memes, os gifs e os vídeos virais chegam-lhe um pouco mais tarde. “Mas quando a piada é boa, acabo sempre por saber.”

Fugir à norma A decisão de se alienar das redes sociais faz de André uma exceção à regra e são os números que o justificam: entre 2008 e 2015, os utilizadores de redes sociais em Portugal cresceram de 17,1% para 54,8%. Segundo um estudo recente da Marktest e da IDC Portugal, o Facebook é a rede social com maior taxa de penetração em Portugal, com 93,6%, seguido do YouTube (41,4%), Google + (40,2%), LinkedIn (37,3%), Instagram (28,9%) e Twitter (23,6%).

Mesmo perante dados que mostram um Portugal altamente conectado às redes sociais, a psicóloga Marina Carvalho lembra que esta não deve ser uma imposição. “Apesar de ser habitual o uso de redes sociais como forma de socialização, a sua não utilização não pode ser vista como algo que fuja à norma”, refere. A especialista em comportamento juvenil lembra que as redes sociais são um veículo de comunicação, mas não são o único, e se alguém se decide pela sua não utilização é porque terá outros interesses ou fica satisfeito com outras formas de comunicar.

Exatamente por ver as redes sociais como uma opção e não uma obrigação, Marina não consegue olhar para os que decidem não ter Facebook ou Twitter como “especiais”. “Não estão nem acima nem abaixo de ninguém. Diria que apenas estão num patamar diferente.”

Quase que ignorando o lado profissional da questão, Luís Catalão não se inibe de mostrar o orgulho que sente na frase “eu não tenho Facebook”. “A verdade é que hoje em dia marca a diferença”, considera.

Do seu grupo de amigos, só tem um que o acompanha nesta vida offline, mesmo que – ironicamente – os dois trabalhem em informática. “Uso gadgets, WhatsApp e computadores, só não estou presente em redes sociais.” Mas tal como aconteceu a André, já esteve, e na mesma. “Não havia como escapar ao Hi5”, diz entre risos. E até chegou a ter Facebook, mas a namorada, que continua com conta aberta, não apreciava que a cara-metade tivesse uma forma de comunicar com o mundo mais privada. “Acabei por fechar a conta nessa altura e nunca mais senti necessidade de a voltar a abrir”, admite.

Apesar de obrigar os amigos a enviar um sms quando há combinações de jantares feitos através de eventos no Facebook, não sente que perde alguma coisa por se manter afastado das redes. “Todas as manhãs leio jornais online, por isso mantenho-me a par do que se passa”, conta. “Já as fofoquices de ‘aquele casou’, ‘aquele acabou com a outra’, etc., isso deixo para a minha namorada. Ela avisa-me sempre.”