CGD: socialistas indignados com António Domingues

Decisão do presidente da CGD de não apresentar declaração de património gera críticas no PS. “Inacreditável” e “lamentável”, dizem os socialistas

A decisão do presidente da Caixa Geral de Depósitos, António Domingues, de não apresentar a declaração de património no Tribunal Constitucional está a provocar mal-estar no PS. Os socialistas temem as consequências negativas de um processo que ficou manchado por várias polémicas.

“Lamentável, incompreensível e injustificável.” Foi desta forma que o deputado socialista Tiago Barbosa Ribeiro classificou a decisão dos gestores da Caixa de não tornarem públicas as declarações. O parlamentar socialista e líder do PS/Porto alerta que “o sucesso político do governo na resolução dos graves problemas do setor, nomeadamente a recapitalização da Caixa Geral de Depósitos, não pode ser beliscado pela posição de um gestor. O banco público também se defende com transparência e escrutínio”.

O deputado garante que não está “sozinho nesta posição”. O primeiro a mostrar algum incómodo com a resistência da nova administração do banco público foi Carlos César. O líder parlamentar dos socialistas assumiu em declarações ao i, na quinta-feira, que “os gestores da Caixa Geral de Depósitos têm de entregar declarações de rendimentos no Tribunal Constitucional, como resulta da lei geral aplicável aos gestores públicos”.

A tese de César está longe de ser pacífica. O Ministério das Finanças já esclareceu que a Caixa foi “retirada do Estatuto de Gestor Público” e a nova administração está isenta dessa obrigação. No meio desta confusão, a administração pediu um parecer aos serviços jurídicos da Caixa que aponta no sentido de a entrega não ser obrigatória. Costa foi mais subtil: “A única coisa que posso dizer é que eu apresentei a minha declaração de rendimentos ao TC.” 

"Inacreditável" A confusão está instalada e alguns socialistas pensam que a única saída é haver um recuo. O ex-deputado do PS José Junqueiro é bastante crítico deste processo e considera, em declarações ao i, “inacreditável” que os gestores da CGD possam ficar isentos de apresentarem a declaração de património. “Era o que faltava. O que é exigido a todos os titulares dos órgãos de soberania, a todos os autarcas, a todos quantos desempenham na administração pública lugares de especial responsabilidade, não poderia nunca ser exceção na Caixa Geral de Depósitos”, afirma Junqueiro, lamentando que o PS se tenha deixado “isolar nesta matéria”. 

O ex-governante alerta que, se o governo “não arrepiar caminho, arrisca-se a ter o primeiro rombo sério no porta-aviões”. Fonseca Ferreira é outro dos socialistas que consideram “inadmissível” a possibilidade de os gestores da CGD não tornarem pública a declaração e critica o governo por dar “cobertura a uma falta de transparência”. 
A polémica vai chegar ao parlamento a seguir à discussão sobre o Orçamento do Estado. O PSD já apresentou um projeto de lei sobre os salários da Caixa e as obrigações de transparência dos novos gestores. O diploma que foi entregue no parlamento vai agora ser dividido em dois para facilitar um entendimento com a esquerda, já que em relação aos salários é impossível ter o apoio do PCP e do BE. 

A intenção é obrigar a administração da Caixa a entregar a declaração de rendimentos no Constitucional. Mas não só. O diploma prevê que “antes do início de funções, o gestor público indica, por escrito, aos respetivos órgãos de fiscalização e de gestão ou administração e à Inspeção-Geral de Finanças, todas as participações e interesses patrimoniais e contratuais que detenha, direta ou indiretamente, na empresa na qual irá exercer funções ou em qualquer outra, incluindo concorrentes, assim como quaisquer relações que mantenham com os seus fornecedores, clientes, instituições financeiras ou quaisquer outros parceiros de negócios, suscetíveis de gerar conflitos de interesse”. O diploma dos sociais-democratas prevê ainda que as declarações sejam “objeto de publicitação” na internet. 

O CDS também optou por apresentar dois diplomas distintos: um sobre os salários e outro sobre a questão da transparência. Assunção Cristas explicou ontem o projeto dos centristas: “Durante este tempo de exceção deve haver um teto, na nossa perspetiva, o teto do salário do primeiro-ministro, com uma hipótese de haver algum prémio, mas um prémio ligado a objetivos concretos.” 

O Bloco de Esquerda também já anunciou que vai apresentar uma iniciativa para impedir que os gestores públicos ganhem mais do que o primeiro-ministro – incluindo os da Caixa Geral de Depósitos. O Bloco limita-se a apresentar um diploma sobre os salários porque entende que a atual lei já obriga os gestores do banco público a apresentarem a declaração de rendimentos. Catarina Martins disse mesmo que “não pode estar à frente da Caixa Geral de Depósitos quem não quiser cumprir deveres de transparência sobre os seus rendimentos”.

O PCP já apresentou nesta legislatura uma proposta para limitar os vencimentos dos gestores públicos a 90% do ordenado do Presidente da República, mas que foi chumbada pelo PS e PSD. Jerónimo já se distanciou da proposta do PSD e recusa alinhar na “operação de hipocrisia” da direita. O constitucionalista Vital Moreira alerta para que as alterações que eventualmente os deputados venham a fazer só deverão aplicar-se no futuro. “Em princípio, essa alteração só poderá valer para o futuro, não podendo alterar as situações profissionais criadas.”