A Itália ameaça o euro

Em março deverá celebrar-se na capital italiana o 60.º aniversário da assinatura do Tratado de Roma, que lançou a CEE (hoje UE). Será que a Itália, um dos seis países fundadores da CEE, estará nessa altura a debater uma eventual saída da zona euro?

Tal saída, provavelmente fatal para a moeda única, não é de facto impossível. À semelhança de Portugal (que só acedeu à CEE em 1986), a economia quase deixou de crescer desde que a Itália entrou no primeiro grupo do euro, em 1999. Sem poder desvalorizar a moeda, a economia italiana perdeu competitividade. E ainda não a recuperou, pois os vícios ancestrais da sociedade mantiveram-se em Itália: corrupção, grande poder das ‘corporações’, isto é, dos interesses instalados, impedindo as necessárias mudanças. 

Nisso também existe um certo paralelismo entre Itália e Portugal, com uma agravante do lado italiano: lá a regionalização avançou muito, criando mais uma escalão de poder e assim multiplicando as oportunidades de corrupção e a dependência das empresas em relação às instâncias públicas. Isto, sem falar na forte presença das várias máfias ao Sul de Roma.

A Itália tem uma dívida pública ao nível da portuguesa. O que limita a capacidade de o Estado intervir na capitalização da banca italiana. Oito bancos italianos estão à beira da rutura financeira. O crédito malparado nos bancos de Itália atinge o valor estratosférico de 360 mil milhões de euros. 

É mais um paralelismo com Portugal, só que os nossos números são bem inferiores. A Itália é a terceira maior economia da zona euro. Um resgate semelhante ao português ou ao grego é inviável em Itália. 

É certo que a Comissão Europeia assume agora uma posição menos favorável à austeridade. E o presidente holandês do Eurogrupo compreendeu ser impossível exigir a Roma, neste momento, medidas extraordinárias de contenção orçamental. Mas Schäuble mantém uma posição intransigente, pelo menos face à Grécia: ou os gregos fazem reformas ou saem do euro, diz ele.

O problema é que esta não é uma mera opinião pessoal de Schäuble – é algo partilhado por inúmeros alemães. Estes foram levados por Kohl a abandonar o seu querido marco (uma moeda forte, por não ser depreciada pela inflação), trocando-o pelo euro. Não gostaram, mas não lhes foi dado exprimirem-se em referendo. E foi-lhes prometido que, no euro, não haveria resgates – ora estes já vão em mais de meia dúzia: Grécia (três), Irlanda, Portugal, banca espanhola, Chipre… Mais resgates não é propriamente uma ideia popular na Alemanha e noutros países do Norte da Europa. 

Nesta situação difícil tem valido o intervencionismo do Banco Central Europeu. Mas, como tem dito e repetido M. Draghi, o BCE não pode resolver os problemas sozinho, apenas os tem adiado. Falta a contribuição dos governos da zona euro, adotando políticas orçamentais menos restritivas – aqueles que têm margem para o fazer, o que não é o caso de Portugal mas é o da Alemanha, com os seus excedentes fiscais e externos. Ora essa coordenação de políticas económicas na zona euro só existe na área orçamental e apenas para travar défices. A sobrevivência da moeda única está em causa. 

Entretanto, os problemas italianos irão refletir-se em Portugal. Na alta dos juros, que nos pode fechar o acesso aos mercados; e em tornar mais cara a capitalização da CGD.

Opinião de Francisco Sarsfield Cabral