Portugal vulnerável

Quase todos os dias surgem notícias sobre a evolução da economia portuguesa e das nossas finanças públicas. Quando são boas notícias – como o crescimento do PIB no terceiro trimestre – o Governo e os seus apoiantes exultam e aproveitam para atacar a oposição. Quando são más notícias – como a queda de 3,5% nas…

No ‘ping-pong’  político-partidário perde-se a noção de que a economia portuguesa vive à beira do abismo. E é grande a probabilidade de em 2017 se acentuarem as crises na Europa e no mundo, com inevitáveis reflexos negativos no nosso país.

 A perigosa evolução nos juros da nossa dívida pública revela uma das facetas daquela vulnerabilidade. Entrevistado pelo jornal eletrónico ECO, António Costa e Silva, presidente da Partex (empresa petrolífera pertencente à Fundação Gulbenkian), sublinhou que, se as taxas de juro da dívida pública portuguesa a dez anos chegarem aos 4%, um novo resgate a Portugal será inevitável. Ora elas estão muito perto desse valor…

 Não é um fenómeno passageiro. Tudo indica que os próximos meses serão de alta geral nos juros. Por causa dos Estados Unidos, antes de mais. A Reserva Federal (o banco central americano) subiu há três dias a sua taxa de referência; outras subidas se seguirão em 2017. E as obras públicas em infraestruturas anunciadas por Trump farão regressar as tensões inflacionistas, o que pressionará em alta os juros.

 Por sua vez, a dramática situação da banca em Itália aumenta a tendência altista dos juros, até porque há agora em Roma um Governo transitório. Entretanto começam a subir os juros noutras grandes economias europeias, como a francesa. 

 Portugal não ficará imune à tendência de alta nos juros. Ora as taxas de juro da nossa dívida soberana são duas ou mais vezes superiores às que pagam a Espanha, a Itália, a França, etc. Acresce que boa parte da melhoria do défice orçamental em 2016 se deve a medidas não repetíveis – cortar investimento público, cativar despesa, perdão fiscal, etc.

Entretanto o Banco Central Europeu iniciou a moderação do seu programa de compra de títulos, que tem contribuído para que o Estado português não pague juros ainda mais elevados. Aliás, mesmo sem essa inflexão o BCE estava já impedido de comprar grandes volumes de dívida soberana portuguesa, porque essas compras estão prestes a atingir os limites fixados pelo próprio BCE.

 Juntando estes fatores, é provável que o Estado português venha a ter dificuldades em financiar-se no mercado internacional de dinheiro, por causa do previsível nível exorbitante dos juros que nos serão exigidos. Daí o espetro de um novo resgate. 

 Tudo isto é agravado pela circunstância de não existir entre nós uma política económica e financeira de longo prazo, estratégica. O Presidente da República e a Comissão Europeia têm apelado a uma tal política. Mas como, se as medidas governamentais são negociadas pelo Governo quase semanalmente com o PCP e o BE? 

António Costa tem mostrado habilidade para os malabarismos que esta navegação à vista exige. Mas tal habilidade não permite qualquer política de médio-longo prazo digna desse nome. Apenas algumas generalidades sem consequências. O pior é que muitos não querem ver os perigos da situação. Assim, não se tomam medidas para evitar o desastre, enquanto é tempo.

 

Opinião de Francisco Sarsfield Cabral