Inglaterra. Manchester United-Liverpool: um estudo em vermelho

Disputa-se este domingo o mais clássico dos clássicos ingleses – o “Dérbi do Noroeste”, como ficou conhecido. É em Old Trafford, pelas 16 horas pontuais de Greenwich

Os ingleses chamam-lhe o “North-West Derby”. Dizem os canhenhos que de Liverpool a Manchester distam exatamente 49,84 quilómetros, em linha reta. Quanto ao jogo, é certamente o mais clássico de todos os clássicos ingleses. O próximo está marcado para dia 15, domingo, pelas 16 horas de Greenwich, em Old Trafford.

A primeira vez que Liverpool e Manchester United se encontraram foi, imagine, no dia 28 de Abril de 1894. Na altura, o United ainda era o Newton Heath. E o Liverpool nascera há apenas dois anos, fruto de uma divergência entre adeptos do Everton. Encontraram-se num jogo especial que punha frente a frente o primeiro classificado da II Divisão (Liverpool) e o último da I (Newton Heath). Vitória dos primeiros, no verdadeiro sentido do termo: 2-0.

Em 1906, já havia Manchester United, assim mesmo. E o Liverpool já fora, por duas vezes, campeão inglês. No ano seguinte, o United conquistava o seu primeiro título. A rivalidade dava passadas largas. Tão largas que, em 2010/11, os rapazes de Alex Ferguson festejaram duplamente a vitória na Premier League: com 19 triunfos ultrapassavam finalmente os 18 dos seus rivais da beira mar. Quanto aos “scousers” – nome que deriva de um antigo dialeto de Merseyside – cumprem um jejum rigorosíssimo: a última vez que se sagraram campeões foi em 1989/90. Daí para cá já viram o United comemorar por 13 vezes. Doloroso!

Desta vez, estarão no banco de um e de outro treinadores estrangeiros: o português Mourinho e o alemão Klopp. Nada de muito vulgar, sublinhemos. E cinco pontos os separam, com vantagem para os “Reds” de Liverpool. Tudo muito vermelho já que os adversários são conhecidos por “Red Devils”.

Falamos, aqui, de uma rivalidade que vai para além do futebol. É também uma competição económica e industrial entre duas cidades que disputam uma supremacia regional desde o Século XVIII. E se Manchester surgiu mais depressa como urbe representativa do norte da Grã Bretanha, Liverpool acabaria por desenvolver-se como grande porto marítimo do país na altura em que no Império Britânico o sol nunca se punha.

A duas grandes guerras afetaram o futebol inglês de uma forma devastadora. Duas gerações foram praticamente engolidas pelo esforço militar. Não admira que a outra guerra, a mais comezinha, entre Liverpool Football Club e Manchester United Football Club, tenha ficado entre parêntesis até 1945. Aí renasceu em todo o seu esplendor, com pompa e circunstância, como diria Sir Edward Elgar.

Dois mitos

Foi após o final da II grande Guerra que surgiram duas figuras absolutamente marcantes para ambos os clube. No United, Matt Busby deu início aos “Busby Babes” que, apesar da tragédia de Munique, em 1958, conseguiram a primeira vitória inglesa na Taça dos Campeões Europeus, à custa do Benfica, em Wembley. Bill Shankly daria início ao grande Liverpool que viria a dominar a Europa nos anos 70.

Rivais mais do que nunca! Para os adeptos do Liverpool, o United será sempre um clube bem visto pela imprensa e com uma imagem beneficiada que choca com a ideia de esforço e trabalho dos “scousers”, bem retratada numa das célebres frases de Shankly: “If you are first, you are first; if you are second, you are nothing”. Também aí, há filosofias que se opõem. E, muito fundada nessa diferença, a superioridade de Liverpool e Manchester United prolongou-se nas décadas seguintes. Os excitantes “derbies” foram marcando o seu lugar na história deste desporto único inventado na Grande Ilha, como por exemplo a final da Taça de Inglaterra de 21 de Maio de 1977. O Liverpool vivia o sonho da tripla: fora campeão e iria jogar a sua primeira final da Taça dos Campeões uns dias mais tarde, frente ao Borussia de Münchengladbach. Não estiveram os “mancunians” – alcunha dos habitantes de Manchester derivada de uma cidade romana do local – pelos ajustes. Venceram por 2-1, golos de Stuart Pearson e Jimmy Grenhoff contra um de Jimmy Case – e ficaram na posse de um dos troféus mais cobiçados de sempre.

Dizem as estatísticas, às vezes convenientes para sublinhar estes pormenores que, para o campeonato, o United leva vantagem: 67 vitórias para 55 derrotas, com 45 empates pelo meio. E que, em casa, essa vantagem até é maior: 42 vitórias, 16 derrotas e 25 empates. Nos últimos dez jogos em Old Trafford, o Liverpool perdeu oito. Mas, para compensar, os outros dois foram vitórias suculentas como uma muito britânica empada de rim: 3-0 em 2014 e 4-1 em 2009. No jogo da primeira volta, em Anfield, um empate sensaborão: 0-0. Resultado mais desnivelado de sempre para o campeonato: 6-1 em 1928. Última goleada do United em casa: 4-0 em 2003. Nada que se compare com um terrível 7-2 aplicado pelo Liverpool no primeiro jogo em Anfield, no tão distante ano de 1895, a contar para o campeonato da II Divisão: 7-1. Já agora, o jogo com mais golos data de 25 de Março de 1908: 7-4 para o Liverpool.

Veremos como vai ser este encontro entre dois treinadores de estilos e personalidades tão diferentes, quase opostos. Se é a matemática de José Mourinho e a sua frieza resultadista que levarão a melhor se, pelo contrário, vai prevalecer a dinâmica, o entusiasmo e a vertigem do futebol de Jürgen Klopp. O espetáculo está prometido. Que os dois maiores clubes ingleses saibam cumprir a promessa…