SNS. Sindicato quer que doenças crónicas pesem no tamanho das listas de utentes

Estudo do SIM quantifica diferenças no uso de consultas consoante idade e situação clínica. Sindicatos reúnem-se com a tutela na sexta-feira

Um jovem saudável vai ao centro de saúde uma vez por ano. Um jovem com diabetes, hipertensão ou depressão recorre a quatro a seis consultas. Nos idosos, a existência destas doenças crónicas, das mais prevalentes na população, também se reflete num maior uso dos cuidados. Entre os 80 e os 89 anos, um idoso sem nenhum destes diagnósticos usa em média três consultas por ano, enquanto alguém que tenha as três doenças recorre, em média, a 7,6 consultas.

A análise surge num novo estudo do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) com o apoio da Universidade do Porto, trabalho que foi entregue ontem ao Ministério da Saúde.

Nas últimas semanas, os sindicatos têm-se batido para que a tutela reduza as listas de utentes dos médicos de família, que em 2013 passaram de 1500 para 1900 pessoas. Agora, o SIM defende que se deve ir mais longe e afinar o processo de formação das listas com um modelo de “ponderação” dos utentes mais ajustado às necessidades. Atualmente, já é tida em conta a idade dos utentes, mas o estudo sugere que ter uma ou mais doenças crónicas faz diferença.

A nova forma de cálculo é proposta no estudo conhecido ontem. Hoje, o sistema de unidades ponderadas determina que 1900 utentes equivalem a 2358 unidades. Utentes dos 0 aos 6 anos valem 1,5 unidades; dos 7 aos 64, valem uma; dos 65 aos 74, valem 2, e com idade igual ou superior a 75 anos valem 2,5. A nova análise, que teve por base o uso de consultas em 2016 por 85 mil utentes, sugere um maior escalonamento e seria para aplicar num cenário em que os médicos tivessem listas até 1500 utentes, defende o SIM. Em última instância, os idosos com diabetes, hipertensão e depressão, e que chegam a usar perto de oito consultas, devem ter, por exemplo, um peso quatro vezes maior na lista dos médicos do que os jovens saudáveis.

Jorge Roque da Cunha, secretário-geral do SIM, sublinhou ao i que estes cálculos ditariam maior acessibilidade ao médico, pois traduziriam de forma mais realista o tempo disponível por parte dos clínicos, que poderiam assim acompanhar melhor os seus doentes a seu cargo.

O médico admite que, no curto prazo, seriam necessários mais clínicos, mas salienta que é por “incompetência” da tutela que não tem havido um reforço mais rápido dos médicos de família no SNS. O secretário-geral do SIM refere-se ao facto de, desde abril, haver 291 médicos que concluíram a especialidade à espera de concurso para integrarem os centros de saúde. “No ano passado, a 1 de agosto já estavam em funções”, diz Roque da Cunha.

Depois de vários apelos, as Finanças deram luz verde a estas contratações na semana passada. Por outro lado, argumenta Roque da Cunha, a sobrecarga e a desmotivação continuam a levar a reformas antecipadas. Dentro de três anos, com as novas entradas de médicos e um equilíbrio das aposentações, Roque da Cunha garante que o cenário será diferente. Neste momento há 2131 internos de medicina geral e familiar em formação.

925 mil sem médico

De acordo com os últimos dados oficiais, há 925 587 utentes sem médico de família e estima-se estarem em falta 526 médicos. Depois de, na última legislatura, o governo ter falhado a promessa de garantir médico a todos os portugueses, o objetivo do executivo é baixar o número para 500 mil até ao fim do mandato.

Resta saber se os planos prosseguem com mais ou menos consenso entre tutela e clínicos. A existência de fatores de ponderação que tenham em conta as diferenças geográficas do país, dado o envelhecimento do interior, era uma reivindicação antiga da Associação Portuguesa dos Médicos de Família que, segundo o i apurou, estaria a ser equacionada pela tutela.

A nova proposta do SIM deverá ser discutida numa nova reunião com a tutela agendada para esta sexta, no âmbito das negociações sobre a redução da lista de utentes e do trabalho nas urgências, de 18 para 12 horas semanais. Mantendo-se um impasse sobre o fim das “medidas lesivas transitórias impostas pela troika”, como consideram os sindicatos, os médicos admitem convocar uma greve para depois das autárquicas.

Numa nota divulgada ontem, o SIM assinala que as mudanças desde 2012 levaram não só a um aumento das listas mas a mais utentes utilizadores, efeito do despacho que, há quatro anos, impôs que quem deixasse de ir ao centro de saúde perderia o médico. Segundo o sindicato, há mais 55% de utentes utilizadores nas listas, quando o aumento do período de trabalho para 40 horas levou apenas a um reforço de 14% no período de trabalho, desfasamento que contribuiu para maior risco de burnout.