Vanessa. Os homens não falam. Marcelo é excepção

É uma regra praticamente universal que os homens não falam. Falam os mínimos. Em caso de terem mesmo que falar fazem-no muitas vezes sem jeito. Cavaco era um destes exemplares – maioritários, de resto, no sexo masculino. Não falava habitualmente. Quando falava saiam-lhe pérolas que desde 1985 estão arquivadas na memória coletiva. Do “homem do…

Isto dos homens não falarem ou falarem pouco é das coisas que mais irrita as mulheres.

– Então diz coisas.

– Não tenho nada para dizer.

– De certeza que existe qualquer coisa.

– Nada.

– O que tu estás é a esconder-me alguma coisa.

E por aí fora. Estes diálogos nunca acabam bem. As mulheres não entendem a incapacidade masculina de contar pormenorizadamente uma história todos os dias. Ou pelo menos três vezes por semana. Ou definirem-se.

– Mas o que é tu achas exatamente sobre isto?

– Estou a pensar.

– Não pensaste o suficiente?

– Ainda não.

– Mas porque não me dizes pelo menos em que é que estás a pensar?

– Não sei bem. É complexo.

Os homens são muito complexos, apesar de ganharem a vida a dizer o contrário e a atirar-nos para cima o slogan cansativo “as mulheres são muito complicadas”.

Mas estando as mulheres tão habituadas a que os homens, por sistema, não falem ou falem pouco, quando aparece um que fala muito, é fácil seduzi-las. Toda a gente que o que é inabitual é sedutor. Foi o que aconteceu com a Vanessa quando Marcelo foi eleito Presidente da República: primeiro ficou embasbacada, depois apaixonou-se e chegou ao cúmulo de pensar que com algum jeitinho conseguia convencer o Marcelo a casar e a fazer dela a estimável primeira dama que tanta falta faz ao país. Mas esta semana a coisa parece que mudou. E a Vanessa, que partilha com o seu apaixonado fazer telefonemas a altas horas da noite, ligou-me às três da manhã de quinta-feira. Eu já estava mais para lá do que para cá, a adormecer em cima das páginas da “Viagem a Itália” de Goethe.

– Ouviste o Marcelo a dizer que depois das autárquicas pode deitar abaixo o governo?

– Sim.

– E isso não é inacreditável?

– É chato, sim.

– Mas é normal um Presidente da República dizer este tipo de coisas?

– Já sabes como é o Marcelo.

– Mas já viste que ele entretanto telefonou ao Observador para dizer que não tinha dito exatamente o que disse?

– Sim, mas isso é o Marcelo.

A Vanessa estava estarrecida com a declaração e contra-declaração do Presidente da República.

– O Marcelo fala demais. Não sei se afinal gosto de homens que falem demais.

Da minha leitura ensonada da “Viagem a Itália” só me sobrou dizer o óbvio.

– O Marcelo sempre foi assim. Como é que não sabias?

– Quando o vi a anunciar a candidatura lá em Celorico todo hirto achei que tinha mudado. Parecia tão tímido ali, não parecia?