‘Gestão privada nos cemitérios é um aproveitamento’

A nova lei entra em vigor no dia 15 mas gera contestação no sector funerário.

as associações do ramo funerário receiam que a alteração da legislação que regula o sector venha a contribuir para o fecho de muitas empresas. e são unânimes: a gestão dos cemitérios não devia poder estar nas mãos do sector privado, para não haver concorrência desleal, em particular entre a funerária que administre um cemitério e as que façam apenas funerais.

a conferência episcopal portuguesa (cep) nunca debateu esta questão. mas, em entrevista ao sol, d. jorge ortiga, presidente da cep e arcebispo de braga, considerou que a atribuição da gestão dos cemitérios aos privados se afigurava como uma exploração da morte: «às vezes, as coisas privadas correm melhor, mas isto é como negociar com a morte, é um aproveitamento». o arcebispo de braga acrescentou ainda: «acho que a gestão de um cemitério tem uma dimensão pública e terá de ser assumida como tal».

em causa está o facto de o decreto-lei n.º109/2010, que entra em vigor a 15 de dezembro, permitir que os cemitérios venham a ser geridos pelo sector privado, abrindo espaço às funerárias e às associações mutualistas. era já possível concessionar alguns serviços, de que é exemplo a segurança do local e o arranjo dos espaços verdes. mas agora as autarquias podem delegar a própria administração dos espaços cemiteriais ao sector privado.

a associação dos agentes funerários de portugal (aafp) manifesta-se «totalmente contra a privatização dos espaços cemiteriais» e teme «a concorrência desleal». o presidente da aafp, joão barbosa, explica ao sol que a associação se opõe à privatização, mas não à possibilidade de empresas funerárias construirem os seus próprios cemitérios – ideia, aliás, partilhada pela associação nacional de empresas lutuosas.

joão barbosa diz que a possibilidade de também as instituições particulares de solidariedade social (ipss) poderem gerir cemitérios e fazer funerais será um duro ‘golpe’ para o sector: «aí é o fim do sector das funerárias, que é composto por micro-micro-empresas».

«se querem abrir a possibilidade das ipss fazerem funerais, que estas paguem taxas como nós, porque estão isentas de tudo e recebem incentivos dos estado», critica o presidente da aafp.

o responsável pela associação nacional de empresas lutuosas (anel), nuno ramos monteiro considera que «um cemitério não é uma situação para dar lucro» e que, por isso, deveria permanecer sob a alçada das juntas de freguesia e autarquias. «uma sociedade que vá para lá é para ter lucro e o que acontecerá é que irão aumentar as taxas», evidencia nuno monteiro.

em portugal, já não é novidade uma funerária administrar um cemitério. recorde-se que a servilusa, através da empresa funelvas, gere o cemitério de elvas, desde 2008. contactado pelo sol, o director comercial da servilusa, paulo carreira, esclarece que a empresa não pensa gerir mais nenhum cemitério, «mas está atenta às oportunidades». em relação ao cemitério de elvas, paulo carreira reforça que não houve aumento de taxas de gestão. a rentabilização do investimento passa pela oferta de serviços, como florista, marmorista, forno crematório ou salas de velório

 

liliana.garcia@sol.pt