Os marcianos somos nós

A ciência e a tecnologia são inseparáveis. Se a tecnologia é filha da ciência, a ciência é impulsionada pela tecnologia.

a ciência é, por exemplo, o conhecimento da lei da gravitação universal e das leis da aerodinâmica, que ajudam a explicar o movimento na atmosfera da terra ou de qualquer outro planeta. tecnologia é, sabendo-as, colocar um carro de quase uma tonelada numa cratera de marte, depois de uma impecável manobra de aterragem (ou amartagem?) totalmente automática.

também eu, logo que acordei a 6 de agosto, estava curioso em saber se o robô curiosity, lançado pela nasa a 26 de novembro último, tinha chegado com segurança ao seu destino, na cratera gale de marte, onde vai procurar vestígios de vida. tinha. e tinha porque as leis que conhecemos da mecânica, tanto gravitacional como dos fluidos, estão certas e porque, conhecendo-as, e de posse de várias outras leis naturais, como as do electromagnetismo e da mecânica quântica que explicam a electrónica, construímos mais um engenho para chegar ao planeta vermelho. invadimos, mais uma vez, marte com sucesso, não temendo a praga que parecia vir do facto de, das 38 missões a marte, metade ter falhado. o robô opportunity, em marte desde 2004, já tem companhia, o curiosity.

não sabemos se existiu ou se existe vida em marte. os instrumentos do novo robô vão procurá-la e, passados alguns minutos, logo teremos notícias na terra. mas um dia havemos de ir a marte, levando connosco a vida que lá eventualmente falta. este é o único planeta conhecido, além do nosso, que tem condições para ser habitável pelo homem. essas condições poderão ser melhoradas com o auxílio da tecnologia. demorará, mas atrevo-me a prever: será tão ou mais confortável viver em marte como aqui.

o escritor norte-americano ray bradbury, autor das crónicas marcianas, morreu em junho passado sem ter tido oportunidade de assistir ao êxito do curiosity. mas há três anos, já de cadeira de rodas, visitou o laboratório da nasa em pasadena, que controla o opportunity e o curiosity. ouviu os cientistas e engenheiros dizerem-lhe que a exploração marciana não teria sido possível sem a inspiração dada pelos seus livros. foi bradbury que escreveu que os marcianos somos nós. mas só quando lá chegarmos…

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