estamos perante uma crise económico-financeira, social ou ambiental? pedro norton de matos junta as três dimensões numa só resposta: «vivemos uma crise de sustentabilidade». para o mentor do green festival, que se realizou em setembro passado pelo quinto ano consecutivo, «o actual modelo de crescimento está falido», já que se apoia no hiperconsumismo, «que é uma droga», e na economia do descartável, isto é, «na obsolescência programada».
a emergência económica de países como brasil, china ou índia, a par da sua expansão demográfica, desmascarou as reais consequências de um crescimento que ignora as preocupações ambientais e sociais. «e daí os refugiados das alterações climáticas, a primavera árabe no norte de áfrica e a crise económico-financeira nos estados unidos e depois na europa».
nas próximas décadas, prevê-se um agravamento da escassez de recursos naturais e energéticos, como água potável, petróleo ou carvão, mas também de bens alimentares como o trigo. basta analisar as estatísticas da organização das nações unidas (onu): em 2050, seremos nove mil milhões, quando actualmente somos sete mil milhões. «são novos desafios que exigem respostas diferentes e mais audazes». pedro norton defende o empreendedorismo como motor do desenvolvimento sustentável, tema do último greenfest, e sintetiza, socorrendo-se de gandhi: «sê a mudança que queres ver no mundo». em causa está, segundo este empreendedor, «um apelo à responsabilidade cívica, dizendo a cada cidadão que tem a capacidade de ser um agente de transformação tanto no trabalho, como em casa, na sua cidade e no seu país».
ser empreendedor não é criar empresas
ao contrário dos conceitos mais simplistas que se vulgarizaram pela literatura económica, na visão de pedro norton ser empreendedor não se resume a criar o próprio emprego ou lançar start-ups. «é, sobretudo, ter espírito de iniciativa no local de trabalho, com os colegas e o patrão, é aquilo a que se chama de intrapreneur. é uma atitude de resiliência, construtiva e criativa». para o sócio-fundador do grupo gynkgo, que todos os anos promove o fórum de discussão ambiental greenfest, «é essa maneira de estar que os portugueses precisam de cultivar». segundo o global entrepreneurship monitor (gem), que compila e compara indicadores nesta área, «a cultura portuguesa está pouco orientada para o empreendedorismo». os dados de 2010 mostram que a taxa de actividade empreendedora em portugal era de apenas 4,5%, quando em frança atingia os 5,8%, nos estados unidos da américa (eua) chegava aos 7,6%, na china aos 14% e no brasil aos 17%.
a revista britânica the economist escreveu, recentemente, que «a europa não tem apenas uma crise do euro, mas também uma crise de crescimento, que resulta de uma falta crónica de incentivo ao empreendedorismo». pedro norton subscreve a afirmação e destaca também a importância de ter no greenfest empresários de diversos sectores de actividade, que participaram activamente nas conferências e workshops sobre sustentabilidade e atitude empreendedora. aliás, esta é uma das principais diferenças do green festival dos eua, que serviu de modelo inspirador. «enquanto na américa este fórum dirige-se sobretudo a cidadãos, famílias e estudantes, em portugal há o envolvimento das empresas», explica o gestor.
neste momento, a maior parte do tecido empresarial português produz dois relatórios de actividade, um de contas e outro sobre a sustentabilidade. «mas a pressão dos consumidores informados e inteligentes, chamados de smart buyers, vai conduzir a que, dentro de alguns anos, as administrações passem a emitir um só documento que aborde a sustentabilidade económica, mas também a social e ambiental», acredita pedro norton.
a crise aguça a mudança
os mais cépticos acreditam num recuo destas políticas face à conjuntura de recessão económica, mas este responsável contra-argumenta: «diria que esta estratégia é ainda mais premente hoje em dia. o modelo de desenvolvimento levou-nos a profundos desequilíbrios sociais, ambientais e económicos e, portanto, há uma oportunidade de repensar. e o que se nota nesta altura de maior crise é que as empresas, comparando com as últimas edições do greenfest, deram um maior ênfase à componente social».
o constante aumento do preço dos combustíveis de origem fóssil e o agravamento do efeito estufa são oportunidades que os empresários devem agarrar para investir nas tecnologias verdes, como os painéis fotovoltaicos, turbinas eólicas, mas também redes inteligentes de informação e comunicação. pedro norton defende uma viragem completa da base energética na nossa sociedade, que deverá assentar em fontes de energia renovável. «tal como qualquer tecnologia no início de vida tem incentivos do estado, também agora sou favorável a certos incentivos fiscais contra algumas vozes discordantes».