o território do fmm tinha sido queimado na noite anterior pelo napalm cénico dos nipónicos shibuza shirazu orchestra, mas por entre a devastação surgiu a semente do afrobeat de femi kuti para terminar o festival em apoteose.
tomando de empréstimo a gíria desportiva, coube a cristina branco dar o pontapé de saída. e que chuto elegante. a cantora portuguesa canta zeca afonso, chico buarque ou um fado com a mesma contenção e beleza. ajuda estar bem acompanhada — tal como é criteriosa na escolha de repertório, também o é nos músicos. um bernardo moreira no contrabaixo ou um bernardo couto na guitarra portuguesa são uma garantia. mas é claro que foi a voz de cristina branco que tocou fundo na audiência.
do castelo para o concerto de crepúsculo na avenida vasco da gama o público perdeu-se. os chineses dawanggang tiveram uma missão difícil. experimentalismo fundado na música tradicional da ásia central não é para todos. song yuzhe, o líder do grupo, fá-lo com qualidade, mas teve um palco e um horário pouco propícios.
de regresso ao castelo, a turba assistiu aos tamikrest. um grupo tuaregue (com um elemento francês) na esteira dos tinariwen. só que, apesar de usarem os mesmos instrumentos e de serem provenientes da mesma latitude, perdem na comparação. estes descafeinados blues do deserto não chegam a ser psicadélicos – apenas interessantes.
a multidão parece ter achado interessante a actuação seguinte, a da norte-americana akua naru. talvez porque desde o início tenha puxado pelo público para que este cantasse, talvez porque o hip hop repetitivo se tenha entranhado, naru e o seu grupo alemão passou como gente grande pelo fmm, mas a sua proposta soou pequena.
antes do concerto, femi kuti disse ao sol que a palavra ‘cansaço’ não existe no seu dicionário. e em palco não se deu por isso, apesar de estar em fim de digressão. é certo que, aos 50 anos, femi kuti já não envereda tanto pela componente física, deixando isso para as três dançarinas e coristas, mas do palco transborda energia.
com o nigeriano veio o tradicional fogo-de-artifício que encerra as actividades no castelo. um início de concerto apoteótico e vibrante, a mistura do afrobeat de kuti e o seu grupo the positive force (11 elementos) com o foguetório. o filho da lenda fela kuti veio apresentar o novo disco, ‘no place for my dream’, um documento de intervenção política do primeiro ao último acorde. inclusive a meio de uma música defendeu que a dívida de portugal e de outros países europeus deve ser perdoada, pelo nosso futuro. esta fusão de activismo político com os ritmos contagiantes do afrobeat resulta num alimento espiritual e corporal ao mesmo tempo, uma liturgia dançante.
para dançar foi a última proposta do fmm, os skip & die. uma salada electrónica servida pela sul-africana cata pirata e pelos holandeses que formam o conjunto e que foi bem acolhida pelos milhares que enchiam a avenida. um som algures entre os brasileiros bonde do rolê e os franceses daft punk, ideal para estafar os corpos que ainda estavam ávidos de acção.
como um cartaz de um candidato às autárquicas promete, para o ano há mais.
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