“Pois eu, nesse caso, chorarei”, respondi-lhe carrancudo. “É para isso que vais votar nas primárias do PS no Seguro?”
“Já te disse as razões por que vou votar nas primárias do PS no Seguro, e não há por aí mais segundas intenções. Mas como também te disse, para além de estilos pessoais e alguma maior profundidade numa proposta ou outra, não vejo diferenças notórias entre os 2 candidatos. Quando falo num ‘Hollande’ à portuguesa, vale para qualquer deles”.
“Mas então, como diz a imprensa francesa, desde o clássico de direita Le Fígaro ao irreverente de esquerda Libération, passamos a estar, não numa crise politica, mas numa crise de regime”, comentei queixoso.
“Lá estás tu a ser melodramático”, rebateu logo Calisto Elói, animado. “E porque não havemos antes de achar que o PS português, tal como a cúpula do francês, admite que a linguagem e a retórica politicas não têm de ser sinceras como outras mais privadas (e não metamos nisto os negócios, a não ser quando os grupos caem por incompetências várias, ou invejas internas, o que vai dar no mesmo) – e que talvez tenhamos mesmo chegado ao fim da História com a vitória do Liberalismo, apesar de Fukuyama andar agora a recuar”.
“Lá na linguagem e retórica politicas até podes ter razão”, lamentei. “Mas no resto, a avaliar pelos resultados internos (a dívida não pára de aumentar, quanto maior é a austeridade), e externos (até países com superávite entram em recessão, como a Alemanha), parece-me que andas errado”.
“Niquices”, contrariou Callisto. “Enquanto foram apenas as classes baixas a perder, quer na pequena quer na mais enfezada média burguesia, não temos de nos preocupar demasiado, e podemos sempre almejar o momento em que as empresas europeias compitam com as asiáticas pelos ordenados, com a vantagem da nossa formação. E repara que, para manter a determinação dos poderes europeus, podemos sempre exportar a nossa originalidade das mordomias politicas – que já vai dando resultados nos órgãos da UE (tirando alguns deputados europeus mais ingratos)”.
“Enfim, só me resta esperar que não tenhas razão”, comentei, com um assomo ético. E algum pragmatismo: “Nem sequer vejo como é possível manterem-se empresas prósperas, sem poder de compra que as sustente”.
“Pois espera sentado”, rematou ele. “E não te esqueças de que há sempre mercados externos, para exportação”.