O terramoto político de sábado, com a publicação da entrevista de Montebourg ao diário francês, fez-se sentir com frases como “A França é um país livre e não tem vocação para se alinhar com as obsessões da direita alemã”. Mas o então ministro da Economia disse mais, revelando que tinha pedido ao PR e ao PM “uma grande mudança na política económica”, apostada nos caminhos da austeridade.
Cada palavra de Montebourg parece ter ecoado “traição” nos corredores do Eliseu e de Matignon: só havia uma opção, abrir a porta para deixar o ministro da Economia sair. Com ele – e a formar um trio da ala mais à esquerda dos socialistas saíram também o ministro da Educação Benoît Hamon e a da Cultura, Aurélie Filippetti. Já solto das amarras governamentais, Montebourg não foi subtil nas críticas. Chamou de “absurdo financeiro” as políticas de austeridade na Europa e em França, cujo resultado é “atolar a zona euro na recessão e em breve na deflação”. No adeus ao cargo, reforçou a ideia de que as medidas impostas por Bruxelas e Berlim “não só não funcionam e são ineficientes como são também injustas”.
Um homem do Presidente
Valls redesenhou o Governo à sua imagem. Ou, pelo menos, tê-lo-á posto a falar a mesma linguagem económica, sem vozes críticas às medidas do Pacto de Responsabilidade que Hollande anunciou no início do ano. Com o desemprego nos 10% e um crescimento estimado para 2014 de apenas 0,5%, o documento prevê cortes de 50 mil milhões de euros, entre 2015 e 2017, na despesa pública – cortes esses alinhados com as exigências de Bruxelas para reduzir o défice, além de mais benefícios fiscais para as empresas, que poderão encaixar 41 mil milhões de euros.
Quem teve dedo nesse pacote de medidas foi precisamente Emmanuel Macron, 36 anos, conselheiro económico e financeiro do Presidente entre 2012 e Junho deste ano. Alcunhado de 'petit Macron' ou 'Manu' nos corredores do poder, no currículo destacam-se as funções como inspector das finanças deste adepto de políticas liberais vindo do mundo da finança, com passagem no banco de investimento privado Rothschild.
Para a esquerda, a sua nomeação é sinónimo de provocação: quer flexibilizar o mercado de trabalho, aumentar impostos, reduzir o papel do Estado na economia.
Ao Huffington Post, um dos amigos de Macron diz que ele tem sentido de humor. Quando foi elaborada a taxa de 75% sobre os altos rendimentos, ele terá brincado: “É Cuba, mas sem o sol”.
No plano pessoal, é casado com uma professora de Francês, Brigitte, 20 anos mais velha, que lhe deu aulas na escola jesuíta. E para fazer completar o quadro – sim, Macron toca piano e até venceu um prémio pelo Conservatório de Amiens.
O que poderá fazer pelo Governo de Valls e por Hollande é já outra cantiga. A popularidade do Presidente caiu para uns envergonhados 17%, numa queda acompanhada pelo coro de críticas da sua esquerda que não lhe perdoa a promessa por cumprir do crescimento económico. Valls, que quando tomou posse este ano reunia a simpatia de 58% dos franceses, desceu agora para 36%.
Também a nova ministra da Educação, Najat Vallaud-Belkacem, que já teve a pasta da Igualdade, pode trazer dores de cabeça ao Executivo. O jornal Le Figaro chama-a de “Khmer Rosa”, pela defesa dos direitos da comunidade gay, lésbica e transexual. A ministra, de 36 anos, apoia o casamento e a adopção por casais homossexuais, uma questão que divide a França.