As sombras do feminismo

Por cá ainda não tivemos direito a ver As Cinquenta Sombras de Grey no cinema. Não que me tivesse feito falta. Mas já vi filmes piores em cartaz no cinema municipal. Quem tiver muita curiosidade e não puder esperar por meados do mês de Março pode, pelo menos, requisitar o livro na biblioteca.   

Eu trabalhava numa livraria na altura em que o livro foi posto à venda em Portugal. Apesar de já vir como um grande sucesso nos Estados Unidos, nunca o abri. Tinha muitos outros livros à mão de semear, e a literatura de romance – no sentido de histórias de amor – não me interessava. Mas confesso que agora tenho pena de não ter pelo menos espreitado. E, para compensar a ignorância na matéria, fui lendo tudo o que encontrei por aí sobre o assunto. 

Nessas leituras, até encontrei um texto que explicava os sucessos do livro e do filme com a 'igualdade de género'. Ora, se As Cinquenta Sombras de Grey são um sucesso, é pela simples razão de combinarem amor e sexo. Não tem nada que ver com o facto de a pornografia ser um mercado de tradição machista e de as mulheres não terem mais nada para ver. As mulheres precisam de amor. Se for só sexo já não vai tão bem. Contra mim falo, que achei o Henry Miller uma seca. 

Depois lembrei-me de que, lá por Lisboa, o mulherio está todo envolvido no que parece ser uma nova onda de feminismo, e até a história da barbearia que proíbe a entrada a mulheres voltou à baila, com uma invasão feminina ao estabelecimento.  

Talvez por viver na província, essas coisas não assumem para mim o mesmo grau de importância. Mas penso que, se as feministas lisboetas fossem consultar as suas camaradas noutros pontos do país, estas prefeririam declarar guerra às tarefas domésticas e deixar os homens e as suas barbearias em paz. 

Aliás, aqui no Alentejo não há tempo para isso. Inclusivamente desconfio que alguns homens morreriam à fome se não tivessem em casa uma mulher para lhes preparar o almoço ou o jantar. 

Quando leccionei informática na Universidade Sénior cá da terra, uma das aulas era do meio-dia à uma da tarde. Ora, as senhoras preferiam quase todas a aula das nove. Porquê? Porque os maridos almoçavam ao meio dia e meia,  e elas tinham de fazer o almoço. Sugeri que deixassem a comida feita e pronta a aquecer. Mas disseram-me que não dava: os maridos não saberiam sequer pôr o tacho ao lume. 

Numa das primeiras aulas – e perante o mundo gigantesco que é a internet – perguntei às senhoras o que lhes interessava ver. Não obtendo resposta, mudei um bocadinho de estratégia e resolvi perguntar o que mais gostavam de fazer, para tentar arranjar uma ligação às possibilidades infinitas que a internet lhes poderia vir a proporcionar. A maior parte das senhoras elegeu 'passar a ferro' como a sua actividade preferida. Nem música, nem cinema, nem viagens. Decidi insistir – e ensinei as senhoras a fazer pesquisa no motor de busca. Tentei de tudo: as músicas e filmes da sua época, os galãs do cinema, os acontecimentos históricos, as receitas gastronómicas de outros países. Acabei a ensinar-lhes a pôr 'gostos' no Facebook. 

Se calhar, se perguntarem a estas senhoras se acham bem que haja uma barbearia onde não podem entrar, elas até agradecem que os maridos lá vão passar o dia todo -e lhes dêem uma folga.