Estados de Alma

Independência do Banco de Portugal. A independência dos bancos centrais dos países mais desenvolvidos economicamente é um estatuto historicamente recente. Data do final dos anos 80 do século XX, e traduz as lições aprendidas com o combate à estagflação (desemprego+ inflação: lembram-se de tal ter existido? ) que assolou a generalidade das economias depois do…

Foi a resposta encontrada para controlar governos gastadores que achavam que combateriam o desemprego ‘forçando’ os bancos centrais a criar moeda. Entendeu-se que um banco central (e, portanto, um governador) que não dependesse do governo e do ministro das finanças traria disciplina ao processo orçamental e, assim, permitiria ancorar mais credivelmente as expetativas de inflação.

É destes tempos o recurso à analogia clássica de um Ulisses atando-se ao mastro do barco para resistir ao canto das sereias. Não obstante ser, em termos da sua tradução prática, recente, a independência dos banco centrais representa a vitória de uma corrente de pensamento económico que por vezes se chama ‘monetarista’ num combate intelectual que durou décadas. Talvez por isto, ou talvez por limitar a possibilidade de financiar desmandos dos gastos públicos, a independência do banco central é um ódio de estimação da esquerda. Recordo, a propósito, os planos ‘secretos’ do inefável Yanis Varoufakis. Ou, ainda, como a construção de um banco independente foi um dos mais importantes legados de Fernando Henrique Cardoso ao Brasil -que possibilitou a decapitação da inflação crónica e décadas prosperidade – e como Dilma Rousseff tem destruído essa independência, com os resultados conhecidos.

A independência do banco central está na lei, mas preservá-la requer um grande esforço de contenção dos poderes públicos pois implica aceitar que a forma e o processo são mais importantes do que a justeza das decisões em concreto. Este exercício, esta contenção, é muito difícil de conseguir em democracias jovens pois,  com alguém disse, “a forma é irmã gémea da democracia”. Mas deve ser acarinhada.  E a opinião pública deve ser educada nas virtudes do instituto. Sobretudo quando as decisões do banco central podem ser erradas; sobretudo quando elas não são populares.

As tentativas descarados do Governo PS/BE/PC para levar o governador Carlos Costa a pedir a demissão são um erro tremendo que  aproxima Portugal das ditaduras populistas de esquerda da América Latina. E, note-se, afirmo isto independentemente de qualquer juízo sobre a atuação do Banco de Portugal e do seu Governador na crise bancária.