O governo vai condecorar esta manhã o Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIP) da GNR pelo trabalho que tem desempenhado em cenários como os dos incêndios que devastaram o país este ano. A distinção que, segundo o i apurou, terá gerado algum desconforto entre elementos de outras entidades envolvidas na prevenção e combate aos incêndios, surge numa altura em que ainda não foram apuradas as responsabilidades pelas falhas no terreno.
A proposta de atribuição do Louvor e Medalha de Ouro de Serviços Distintos de Segurança Pública ao GIP partiu do ex-secretário de Estado da Administração Interna e foi decidida pela ex-ministra Constança Urbano de Sousa a 17 de outubro, ou seja, poucas horas após os incêndios que voltaram a consumir o país naquele mês e na véspera do pedido de demissão da então governante.
No texto que serve de base à condecoração, publicado em Diário da República, poder ler-se que a mesma se deve à “forma extraordinária e competente como [o grupo] tem desempenhado a sua missão, prestando um serviço caracterizado pelo elevado profissionalismo, inexcedível competência técnica e grande dedicação em serviço de segurança pública, demonstrando tratar-se de uma subunidade ímpar que em muito contribui para projetar a imagem da Guarda Nacional Republicana e de que Portugal e os seus cidadãos se devem orgulhar”.
Lembrando a exigente missão que o GIP tem desde 2006, é elogiada ainda a “energia, coragem e bravura aplicada em cada uma das desgastantes intervenções desenvolvidas, muitas vezes com elevado risco para a própria vida dos seus militares, sendo uma atuação sempre marcada por uma invulgar entrega, empenho e elevado espírito de sacrifício”.
Referência aos incêndios de 2017 Mas o papel desta subunidade da GNR nos incêndios deste verão tem um grande destaque no texto, dada a “prontidão e provado esforço colocado em prática neste exigente ano”.
O grupo, defende o governo, foi “além dos limites físicos e psicológicos, para garantir a segurança das populações e dos seus bens, intervindo não só no combate aos incêndios nascentes, mas também nas ocorrências extremas com que o país se confrontou”.
O louvor 408/2017 deixa ainda claro que a resposta que este grupo da GNR deu durante os incêndios de Pedrógão Grande foi o de “uma Unidade de excelência, altamente preparada e treinada, dotada de um elevado sentido do dever, que não olha a meios para cumprir a missão que tem à sua responsabilidade, sempre em busca da salvaguarda das vidas humanas e do bem-estar da comunidade que abnegadamente serve”.
Além a distinção ao GIP, será ainda atribuído um Louvor e Medalha de Serviços Distintos ao comandante deste grupo, o major da GNR Marco Paulo Cura Marques.
Questionada pelo i sobre a oportunidade desta condecoração, a GNR limitou-se a dizer que a cerimónia “acontece na sequência do louvor atribuído à subunidade, publicado no Diário da República n.º 212/2017, Série II de 2017-11-03”.
Já o Ministério da Administração Interna reforçou que é “reconhecida a intervenção de primeira linha do GIPS em situações de emergência, proteção civil e socorro”.
O gabinete do ministro Eduardo Cabrita destacou ainda a “intervenção terrestre de combate a incêndios florestais, busca de pessoas desaparecidas ou intervenções diversas de proteção e socorro em inundações”, acrescentando que “o GIP assume-se, atualmente, como uma referência a nível nacional”.
Críticas ao GIP No relatório da comissão independente que analisou Pedrógão a pedido do parlamento é referido que “alguns técnicos [das organizações de produtores florestais] mencionaram […] que o esforço de fiscalização e sensibilização da GNR/GIPS é insuficiente e pouco articulado com os Gabinetes Técnicos Florestais, por exemplo são efetuadas autuações antes que o município possa fazer o trabalho de aproximação e sensibilização”.
No documento pode ler-se que “por conseguinte o processo global de notificação, aplicação de coimas e execução da rede secundária é deficiente, sendo por vezes desencadeado por reclamações de proprietários vizinhos”.
O recado de Xavier Viegas Em declarações ao i, Xavier Viegas, coordenador da equipa que produziu o relatório sobre Pedrógão Grande a pedido do governo, disse esperar que as condecorações não se fiquem apenas pelos GIPs, dado que outras entidades também tiveram um papel fundamental.
“É sempre oportuno louvar quem tem mérito e os GIPs têm, mas por outro lado não se deixe também de louvar outras pessoas que também se tenham distinguido de alguma forma neste contexto”, disse, adiantando: “Não tenho dúvidas de que os GIPS tenham feito um bom trabalho de modo geral no tema dos incêndios durante todo o verão, mas também digo que há outras pessoas e outras entidades que devessem ser distinguidas. Não digo que seja inoportuno, mas seria importante que os louvores não ficassem por aqui”.
O investigador lembra ainda que na investigação que coordenou foram referidos, a título de exemplo, três casos – dois bombeiros e um civil – que também tiveram um papel fundamental. “Mas deve ter havido muitos mais”, concluiu.
Investigação em curso O incêndio de Pedrógão Grande teve início a 17 de junho, tendo rapidamente alastrado a vários outros conselhos. Além das 66 vítimas mortais (diretas e indiretas), fez mais de duas centenas de feridos. Os prejuízos ascendem a mais de 500 milhões de euros.
Esta semana, a Procuradoria-Geral da República esclareceu que a investigação do Ministério Público a estes incêndios conta já com dois arguidos.
Em causa, segundo a mesma fonte, “estão factos suscetíveis de integrarem os crimes de homicídio por negligência e ofensas corporais por negligência”.
Meses depois, nos incêndios de grandes proporções que deflagraram a 15 de outubro, morreram outras 45 pessoas.