Devo ser dos poucos que não ficou chocado com a notícia. “O Bloco de Esquerda convocou um morto para ser ouvido na Assembleia da República”.
Não só pela vertente sempre agradavelmente cómica deste partido – ora das vestes de dormir que usam como farda parlamentar, ora na oposição a um governo que existe com o seu apoio –, mas, essencialmente, por isto: se o parlamento conta com o Bloco, cuja ideologia está defunta e derrotada há décadas, qual é a surpresa de o Bloco querer levar ao parlamento alguém que já faleceu há dois anos? Como não passaria despercebida uma gaffe num partido que é uma gaffe em si? E como não sorrir perante ateus que decidem apostar na ressurreição?
Vindo de quem vem, até parece mais lúcido do que o habitual. Em vez de adorações a Trotsky, ressuscita-se Alfredo Bruto da Costa – um vulto sem dúvida mais digno e com um grão de excecionalidade face à maioria dos preferidos pelo BE: não propagou ideologias anti-democráticas, não fez carreira política contra a realização de eleições livres e não conta com executados no currículo.
Foi, pelo contrário, presidente do Conselho Económico e Social e provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (uma instituição, caros bloquistas, de matriz católica).
Talvez seja, afinal, verdade: a amizade com o PS está a moderar o Bloco de Esquerda. Agora, só falta convidarem gente viva – que isto de famílias lerem o nome de quem perderam nas notícias devido a um “lapso” não é muito bonito.
Nem mesmo para jovens adultos que vão trabalhar de pijama.