No Brasil, os partidos catch-all são chamados ‘partidos ônibus’, ou seja, partidos autocarro – onde toda a gente cabe. A imagem é humorada mas serve o seu propósito. Em política, os partidos catch-all são aqueles que promovem uma visão mais plural para conseguirem um eleitorado igualmente mais diverso e assim numeroso. Em Portugal, entre a década de 90 e a primeira deste século, o PS e o PSD representaram fenómenos dessa natureza, sem especial ortodoxia ideológica que afugentasse um eleitor independente e moderado. Esse é o primeiro ponto que gostaria de enaltecer: não há mal nenhum em ser um partido catch-all porque não há mal nenhum em querer governar. E em Portugal é assim que se governa – ou que se tem governado
Não estranhei, por isso, ouvir Diogo Feio propor a defesa do Estado social como bandeira. Por um lado, porque o CDS está na Oposição e chamar à atenção para a atual degradação dos serviços públicos é algo lógico. Por outro lado, porque para um partido com ambições de crescimento o «acantonamento», de facto, não serve. Conseguir votos à esquerda, à direita e ao centro, não é mau nem populista. A apresentação de propostas para necessidades reais tem essa consequência – a expansão eleitoral – e Assunção Cristas provou-o nas autárquicas em Lisboa com coisas tão simples quanto parquímetros. Que tem isso a ver com esquerda ou direita? A conversão do CDS num partido ‘onde toda a gente caiba’, a que alguns chamam catch-all, não se trata de um objetivo em si, mas de uma inevitabilidade perante o seu verdadeiro objetivo: crescer.
Eu, que sou um apaixonado pelo estudo das ideologias, não deixo de separar a apresentação de propostas para necessidades reais da apresentação de um populismo que promete o que não quer cumprir. Essa é a questão a fazer aos centristas: querem cumprir ou não? Porque se querem cumprir têm também de querer governar. E os partidos de nicho ideológico não governam.
É preciso olhar para o país que se tem antes de falar no partido que se quer. Hoje, os portugueses olham para o PS como o partido moderado, cumpridor mas simpático, e para a direita como radical e austeritária. A dita ‘catch-allização’ do CDS foi aquilo que o resgatou dessa gaveta ideológica em que os eleitores arrumaram o PSD. Perder tempo com discussões identitárias, como Rui Rio faz, sobre ser mais isto ou mais aquilo, não é chave que destranque essa gaveta. Bem pelo contrário. Alguém acha que os eleitores que não querem saber o que é a social-democracia querem saber se o partido em que votam é catch-all ou democrata-cristão?
O CDS pode, claro, voltar a ser o partido do táxi – preferir dizer-se «de direita» a dizer-se Governo – por receio de tornar-se num dos tais partidos autocarro, onde toda a gente cabe. Nesse caso, perante as circunstâncias contemporâneas, o primeiro prejudicado não seria o CDS. Seria a democracia portuguesa – entregue ao centrão porque o centrismo não se soube encontrar. Afinal, se Peter Pan tinha medo de crescer, ninguém diz que o mesmo não pode acontecer a um partido político.
P.S. – Um obrigado à académica portuguesa que me informou da tradução brasileira para ‘partido cactch-all’. Às vezes, não sei o que faria sem ela.