Por Miguel Santos
Deputado Municipal do PAN em Lisboa
Luanda, 25 de abril 1974, contava nessa altura 16 anos de vida. Se bem que a narrativa (como agora se diz) da nação portuguesa pluricontinental fosse para mim atraente, já há muito me tinha apercebido tratar-se de uma fábula, nem sequer piedosa, sobretudo para quem a difundia. Tiveram oportunidade de tornar a fábula real quando a nossa capital esteve no Rio de Janeiro, ou quando Norton de Matos sugeriu que a mudassem para Luanda, mas nada aconteceu.
Encontramo-nos assim em 1974, com uma bela fábula destruída e com vários pedaços desgarrados da nossa aventura colonial. Aprendi desde esses idos aos dias de hoje que nem tudo foi mau: disseminamos cultura, a língua e uma forma de viver em que nos reconhecemos e que nos irmana. Pertencemos a um Império que podia ter sido mais do que apenas matéria e vaidade. Aqui chegados, contemplemos então qual o tema atual de discussão, os brasões do Jardim do Império.
Os feitos realizados pelos nossos heróis do passado, e que foram imortalizados na monumentalidade dos Mosteiros da Batalha e dos Jerónimos, ou da própria existência de um conjunto de países designados como Lusófonos, farão para sempre parte da nossa história, do nosso património construído e do nosso imaginário coletivo.
Se querem realmente celebrar um império que falhou na sua missão principal e mais ambiciosa e continuar a chamar-lhe Jardim do Império, então temo que esse Império possa estar bem representado por esses brasões da técnica do mosaico-cultura floral, tão ao gosto de um tempo passado. No entanto, tal como a arte efémera que representam, em nada irão contribuir para aquilo que as nossas andanças pelo mundo de melhor nos deixaram: a arte e a língua que nos irmanam e que hoje é conhecida como Lusofonia, e que vai da Galiza a Timor.
Em 2017, na sequência duma petição sobre este tema, o PAN propôs na Assembleia Municipal de Lisboa que o Jardim do Império fosse renomeado como Jardim da Lusofonia e fosse objeto de um projeto de remodelação com base numa ‘atualização’ cultural, que fizesse o jardim ultrapassar o tempo colonial e o projetasse nos valores do 10 de Junho, como um organismo vivo da cultura lusófona, com homenagem aos maiores da nossa cultura, imortalizados em estatuária e num festival cultural anual, projetando definitivamente o antigo Jardim do Império na aventura do futuro, nomeadamente a fraternidade linguística entre os povos irmãos da Lusofonia, do galaico-português até aos povos dos dias de hoje.
Poderá ser feita uma evocação no domínio da estatuária das figuras históricas maiores que tiveram e têm manifesto relevo na difusão da Lusofonia, podendo ser colocadas em lugares de relevo na praça, como sejam, por exemplo, o rei Dom Dinis, Luís de Camões, Padre António Vieira, Fernando Pessoa, Rosália de Castro, Agostinho da Silva, bem como poetas dos vários países Lusófonos, a realizar de forma concertada com esses países.
Tendo ainda esta semana Fernando Medina mostrado abertura para repensar conceptualmente a praça, parece-nos adequado fazer um debate profundo e participado onde todas estas ideias sejam discutidas e possam ser incorporadas num novo caderno de encargos para uma nova praça. Concluindo, podemos optar apostar numa solução de celebração do passado ou, pelo contrário, gizar uma nova solução para o futuro.