O próximo Presidente

Marques Mendes decidiu seguir a mesma receita. Caso não se disponibilizasse, duvido que o PSD o escolhesse como candidato. Mas a partir do momento em que o fez, será incómodo para o partido afastá-lo da corrida. Será um bom candidato? Um candidato vencedor? Julgo que não.

Verdadeiramente, o tema das presidenciais foi lançado por este jornal quando disse que Mário Centeno podia avançar, proporcionando uma alternativa a Augusto Santos Silva na área socialista.

Este, como presidente da Assembleia da República, não conseguiu construir uma imagem de isenção e independência.

Sendo um homem inteligente, deixou-se arrastar para polémicas estéreis, surgindo muito encostado à esquerda.

Pareceu, a espaços, regressar aos tempos em que dizia, com falta de propósito: «Eu cá gosto é de malhar na direita».

E as sondagens dececionantes provam que não será um candidato forte.

Centeno será melhor, porque entrará no centro.

É impossível ganhar as presidenciais sem ter os votos de boa parte do eleitorado central – e o atual governador do Banco de Portugal leva aí clara vantagem sobre Santos Silva.

Na área socialista, há ainda António Costa, Vitorino, Ana Gomes e António Guterres.

Costa chegará lá desgastado por mais de dez anos no Governo, Vitorino não tem carisma e está há demasiado tempo longe do país, Ana Gomes já se candidatou com pouco sucesso.

Resta António Guterres.

Que, se se disponibilizar, matará qualquer outra candidatura na área socialista.

Ninguém se candidatará contra ele.

Mas não sei se seria um candidato ganhador.

Já lá iremos.

Na área do PSD, Marques Mendes declarou inesperadamente a sua disponibilidade.

Diz-se que o fez antes de tempo.

Mas condicionou todo o jogo.

Há quase 30 anos, no início de 1994, à hora do almoço, no meu gabinete no Expresso, recebi um telefonema de Jorge Sampaio – que na altura era presidente da Câmara de Lisboa.

As secretárias tinham ido almoçar, e fui eu que atendi o telefone.

Sampaio perguntou-me sobre o que versaria a entrevista que o Expresso lhe iria fazer nessa tarde, eu achei a pergunta estranha e avancei umas banalidades, até que ele se descoseu: queria fazer uma declaração sobre as presidenciais e esperava que o jornalista lhe fizesse uma pergunta nesse sentido.

Liguei ao jornalista (Fernando Diogo), pu-lo ao corrente do que se passava, e umas horas depois ele entrava-me no gabinete a dizer: «Já temos manchete. O Sampaio diz que gostava de enfrentar o Cavaco nas presidenciais».

A frase foi mesmo a manchete do Expresso – não nessa semana, por umas peripécias que aqui não vêm ao caso, mas na semana seguinte.

E, desde esse dia, Sampaio passou a ser o candidato presidencial do Partido Socialista.

Depois dessa declaração, ninguém no PS quis avançar contra ele.

Se não tivesse dado aquela entrevista nessa altura, provavelmente não teria sido o eleito pela direção.

E nunca teria sido Presidente.

Marques Mendes decidiu seguir a mesma receita.

Caso não se disponibilizasse, duvido que o PSD o escolhesse como candidato.

Mas a partir do momento em que o fez, será incómodo para o partido afastá-lo da corrida.

Será um bom candidato? Um candidato vencedor?

Julgo que não.

Se no timing seguiu as pisadas de Sampaio, no percurso tenta fazer o mesmo que Marcelo Rebelo de Sousa, preparando uma candidatura presidencial através do comentário televisivo.

Mas falta-lhe a imaginação e a imprevisibilidade de Marcelo.

Os seus comentários parecem por vezes aulas de instrução primária, em que o professor explica aos alunos o bê-á-bá: repare-se o número de vezes que repete a expressão «Ou seja…» ou diz «para as pessoas lá em casa perceberem»).

Na política, foi um bom ministro mas um mau presidente do partido.

Como tal, nunca pegou.

E como candidato presidencial dificilmente pegará.

Na direita há outras figuras possíveis. Além de André Ventura, que quer marcar terreno, há Santana Lopes, que também já se disponibilizou, há Passos Coelho, que não parece interessado, há Durão Barroso, que estará na mesma situação, há Rui Moreira, há Paulo Portas, há Leonor Beleza, até há Rui Rio.

Todos dariam bons candidatos.

Mas o melhor não será nenhum destes.

O melhor será Gouveia e Melo, se quiser candidatar-se.

Por várias razões.

Tem prestígio, tem presença, tem autoridade… e é militar.

Há hoje uma grande desconfiança em relação aos políticos.

Quase sempre houve.

Já no fim da Monarquia e na 1.ª República os políticos eram olhados com pouco respeito.

E há também um grande distanciamento em relação aos partidos.

Não pertencendo a nenhum partido, e não sendo politico, Gouveia e Melo tem uma vantagem à partida.

Depois, o facto de ter autoridade é importante numa época de grande conflitualidade social.

E, last but not least, há um fator circunstancial que pode pesar.

Vivemos um tempo de grande turbulência na Europa, e um militar oferece uma imagem de maior segurança.

Julgo que, se avançar, Gouveia e Melo protagonizará uma candidatura à direita mais forte do que qualquer outra, e ganhará a qualquer candidato da esquerda.

Mesmo a António Guterres.

Pese embora o prestígio internacional que conquistou, Guterres é visto em Portugal como um homem bem-falante, bem-intencionado, preocupado com as questões sociais, mas indeciso, pouco determinado e sem grande autoridade.

A questão presidencial é, pois, fácil de equacionar: Gouveia e Melo candidata-se ou não?

Se sim, o próximo Presidente da República está encontrado.

Se não, haverá uma grande caldeirada, e tudo o que agora se disser será prematuro.

Só há nesta equação um pequeno problema a resolver: para se candidatar, o almirante precisa de uma máquina atrás de si.

Caso o PSD o apoie, não haverá problema.

Mas se isso não acontecer, pode ser um bico-de-obra.

Firmino Miguel esteve um pouco na mesma situação, e acabou por nunca ser candidato, acabando por morrer estupidamente num acidente na Marginal.

P.S. – Há uma semana, referi nesta coluna o alinhamento do coronel Mendes Dias com as posições da Rússia na guerra da Ucrânia. Várias pessoas me alertaram para o erro: o seu posicionamento nada tem que ver com o Kremlin. Pelo juízo errado peço desculpa ao próprio e aos leitores.