Há quem tenha toques especiais que diferenciam os contactos filhos. Toques prioritários, chamadas que não podem ficar sem resposta, que têm de ser atendidas com urgência como se o número dos pais fosse o 112 dos filhos. Um filho que liga é um filho que quer socorro, pensamos nós. Estamos assim: somos o INEM deles. Seja o que for que estejamos a fazer, para tudo quando um filho liga. Atendemos apreensivos que desta vez seja mesmo uma urgência ou apenas o telefonema que tem como finalidade uma simples e agradável conversa. Nunca é. Chamada após chamada e as razões são sempre as mesmas: todas elas de interesse próprio. Um interesse só deles e sempre em nosso prejuízo. Mas atendemos denunciando que sofremos de uma variável do síndrome de Estocolmo. Saímos apressadamente de reuniões, paramos tudo o que estamos a fazer como se o telefonema viesse de Deus ou do Show Me the Money.
Os telefonemas que mais me irritam são os que começam bem e acabam com um pedido. Os telefonemas dissimulados. Em que eles conversam sem revelar interesse nenhum mas no fim denunciam ao que vêm. «Já agora» – rematam eles depois de dez minutos de conversa mole – «precisava de dinheiro, de chamar um Uber, se posso levar o carro, encomendar comida, boleia». Tudo pretensões que nos levam paulatinamente à falência. Tremo quando o telefone toca e o número que grita é o de um deles: ou é urgente e não é coisa boa, ou é anúncio de prejuízo.
Por mensagem é mais fácil responder que não sem justificação. Não! É uma palavra que alivia imenso. «Mas porquê?», insistem. «Porque não», escrevemos de volta. «Vá lá…» «Não ». Sente-se a frustração e o rancor do lado de lá, mas o diálogo acaba ali. Quando ligam é pior. O tom de voz muda quando a resposta é não. «Acabaram-se os Uber, vem a pé ou de metro». Ouvem-se os nomes que nos chamam em silêncio e percebe-se a raiva por terem investido numa conversa que não levou a qualquer lado.
Os autores dos esquemas de fraudes para sacar dinheiro aos pais fazendo-se passar por filhos teriam mais sucesso se fossem menos elaborados. Caros senhores, os nossos filhos pedem dinheiro sem grandes cerimónias e poucas justificações. É assim: Precisava de dez euros. Para quê?
- Vão todos ao McDonalds e eu queria ir.
- Ok.
É básico e limpinho. Quando o texto é grande os pais desconfiam, tal como os pobres quando recebem uma esmola grande.
Por outro lado, quando somos nós a ligar, eles não atendem. E porquê? Porque os filhos só falam com os pais quando precisam de pedir coisas. Eles sabem que os pais não lhes ligam para oferecer dinheiro e estão perfeitamente conscientes que do lado de lado só vão ouvir perguntas difíceis, ordens ou pedidos de prestação de contas. «Tenho um por cento de bateria…», respondem invariavelmente. O que é o mesmo que dizer: «Tens apenas 10 segundos para me chateares. Está a contar».
É esta maravilha de ser pai ou mãe: o dia em que forem eles a ligarem para saberem de nós, sem pedidos no fim e apenas por cuidado, quer dizer que já devíamos ter apresentado os papeis para a reforma. Enquanto isso não acontece, é lidar ou remover o MB Way.