Esta versão provinciana do Lago dos Cisnes dançada em torno do Orçamento faz doer a alma e perder a paciência. Não é Rudolf Nureyev ou Margot Fonteyn quem quer. O génio e a leveza não se compram. Têm-se ou não. Luís e Pedro Nuno terão outras qualidades. Aquelas seguramente que lhes são radicalmente alheias.
As apostas voam de todos os lados: O teatrinho pega fogo ou sobreviverá na apagada mediania da sua compleição campestre e domingueira? Ninguém sabe. Nem, no fundo, quer saber. Conhecem a peça de cor. Há cinquenta anos que passa por ali, os figurantes mudam, mas o desempenho pindérico esse, é sempre o mesmo. Só muda o preço dos bilhetes. Para mais. Sempre mais e mais.
E, contudo, resta uma esperança de que, desta vez, algo possa mudar e abrir novas rotas para fora da apagada e vil tristeza do lugarejo.
Eu explico, saindo da metáfora e entrando na realidade. Na última campanha eleitoral para as legislativas, Luís aponta para os ‘racistas’ e ‘xenófobos’ do pequeno Chega e diz não e que não é não, nunca fará qualquer acordo com aquela gente. Acha que vai ganhar folgadamente, talvez com maioria absoluta. Ilusões. E as ilusões em política pagam-se caras. Porque não, não ganhou e quase perdeu. O pequeno partido passou a médio partido, o sistema político passou de bipolar a tripolar, uma revolução no nosso velho sistema partidário. E um dado novo: 60% dos deputados, 78 do PSD e 50 do Chega, a maior maioria absoluta de direita de sempre.
Na própria noite eleitoral André Ventura desafia Montenegro para um acordo para uma legislatura e tendencialmente para duas, um acordo que permitiria meter ombros a todas as reformas estruturais de que Portugal há tanto tempo necessita. Luís Montenegro disse que não, que governaria sozinho. E como tal se manteve. A navegar sobre a espuma dos dias, tentando penosamente chegar ao dia seguinte. Necessitando, para se manter à tona, do PS ou do Chega, sem autonomia, Luís escolheu o PS. E André pôs-lhe, logo de início, a questão da seguinte e clara forma: com ele, não haveria negociações casuísticas, de mera sobrevivência: Ou era um acordo de fundo, robusto, para durar e permitir inverter o caminho de Portugal para a irrelevância. Luís, até agora, não aceitou. Prefere a espuma dos dias às águas profundas, a velha cumplicidade de 50 anos com o PS a responder aos anseios do seu eleitorado de direita, que votaria no Chega não fosse o velho tropismo de votar ‘útil’ no PSD.
E é a esse eleitorado que hoje me dirijo, pois que importa que para além do nevoeiro lançado pela comunicação social esse eleitorado possa entender o que se passa. E o que se passa é que Luís Montenegro, recusando um acordo de fundo com o Chega deitou borda fora a maioria absoluta que esse eleitorado, unido ao eleitorado de Chega deu à direita. Importa que esse eleitorado saiba que se o Orçamento não passar e houver eleições foi porque Luís Montenegro teimou em não entender a mensagem do seu eleitorado. O que se passa é que, caso haja eleições, o eleitorado de direita não poderá voltar a cometer o erro de votar em quem faz campanha à Direita para depois governar à esquerda.
Chega de governar à esquerda com os votos da direita. Se o PSD se diz de centro-esquerda e como tal se comporta, então que ganhe eleições com os votos do centro-esquerda, não com os da direita. A cada um o seu eleitorado.