Ò Facadas! Muda o nome da rua

A noite prende-nos no mato. Ninguém viaja pela noite dentro

CATIÓ – O Facadas, ao qual alguns, sei lá porquê, chamavam de João Matias, é «manú velho» como se diz por aqui. Para aí aos 11 anos já éramos companheiros de carteira no início do liceu. Depois ficámos camaradas para a vida. Esquecíamo-nos muito de ir às aulas para ficar a jogar à bola no lajedo dos Viveiros; éramos férreos adversários no Subbuteo; ele era o guarda-redes da rua dele e eu o avançado-centro da minha. A rua dele tinha mais nome de clube: Vila de Catió. Soava assim a III Divisão, ou algo do género. O campo deles era de cimento: o Maracangalha, em cima da Draivimpe; o nosso de relva, na Cidade de Luanda, com umas árvores e um pedaço de passeio pelo meio. A gente queria era jogar em casa, e eu que dava pontapés de bicicleta sentia-me diminuído no Maracangalha. Depois fomos colegas de equipa em A Bola, e aí, além de jogar no teclado, o Facadas passou a defesa central. Até ao lado do Humberto Coelho foi titular, mas o seu companheiro de zaga era o António Aguilar. Quando cheguei a Catió, aqui, pelo meio dos rios Combidjam, Camechade e Cobade, e me sentei debaixo de uma mangueira a chupar um limão, não consegui deixar de voltar no tempo, cinquenta anos depois. Já não é mais vila. E assim fiquei horas vendo os meninos correrem atrás de uma bola tal como nós, não nos Olivais Sul, mas aqui na região do Tombali, lugar onde jamais a mão de Deus pôs o pé, tal e qual dizia o brasileiro dos documentários que vinham antes dos filmes no Cinema Paris. Apesar disso, Deus que não se queixe: tem uma igrejinha azul. Uma mamã grande tem cervejas em gelo dentro de um balde. Bebo. Outra vende tomate e cebola. Gosto deles crus e aqui ninguém se preocupa com o meu hálito. É noite escura e as estrelas brilham como pirilampos graças à falta de candeeiros na rua. Ao longe um homem alto, de dishdasha azul até aos pés, equilibra-se numa perna só como um flamingo. Mantem-se imóvel e olha para o chão como se procurasse qualquer coisa. Talvez a esperança…