A imigração escalda

O primeiro-ministro, o secretário-geral do PS, o diretor da PJ, todos falaram sobre imigração e provocaram controvérsia. Um assunto até há pouco tabu tornou-se o tema central do debate político.

Não fizemos tudo bem nos últimos anos no que diz respeito à imigração», assumiu Pedro Nuno Santos numa entrevista ao Expresso.
Na opinião do líder do PS, o «Estado e o país não se prepararam para a entrada intensa de trabalhadores estrangeiros», e deu como exemplos as dificuldades de resposta de serviços como o SNS e a educação.
«Precisamos de falar de imigração de forma descomplexada, como infelizmente não se tem feito», adiantou ainda o secretário-geral socialista, concluindo: quem procura Portugal para viver «tem de perceber que há uma partilha de um modo de vida, uma cultura que deve ser respeitada».

Como é natural, muitos socialistas caíram-lhe imediatamente em cima.

Acusaram-no de estar em ‘contradição’ com a linha do partido.

Pedro Nuno Santos negou.

Mas é óbvio que a contradição existe e que o líder do PS mudou mesmo de opinião.

Qual era a linha oficial do Partido Socialista?
Era esta: «Venham todos os que quiserem!».
Bastava a ‘intenção’ de procurar trabalho para um imigrante entrar.
Agora, Pedro Nuno Santos vem dizer que tem de haver regulação, pois os nossos serviços públicos não aguentam.

E adianta que os imigrantes têm de se adaptar à nossa cultura.

Até aqui, toda a responsabilidade pela ‘inclusão’ era nossa.

Quando um imigrante não estava integrado, éramos nós que não o tínhamos sabido integrar.

Ora, Pedro Nuno Santos vem pôr a responsabilidade também no lado de lá: eles têm de fazer um esforço para se adaptar.

O líder socialista percebeu que o discurso sobre a imigração está a mudar em toda a Europa (e não só) e o PS não podia ficar agarrado a posições dogmáticas.

Foi uma pedrada no charco – mas a primeira é sempre a mais difícil.

Desde a operação policial no Martim Moniz, o tema nunca mais saiu da agenda.
Foi a manifestação contra a Polícia – em que participou Alexandra Leitão, numa decisão infeliz que lhe vai ficar colada à pele –, foi a contramanifestação, foi uma batalha campal entre imigrantes rivais no mesmo local, foram violações aparentemente praticadas por imigrantes.
Entretanto, numa iniciativa insólita, o diretor nacional da PJ, Luís Neves, veio dizer que a perceção de que a criminalidade é maior entre os imigrantes é falsa, pois o número de estrangeiros nas prisões portuguesas é muito inferior em percentagem ao dos reclusos portugueses.

Se o diretor da PJ tivesse razão, todo o discurso dos que relacionam imigração e insegurança cairia com estrondo.

Acontece que, logo no dia seguinte, um deputado do Chega, Pedro Frazão, veio desmenti-lo com todas as letras.

Afirmou que a percentagem de estrangeiros nas nossas prisões é de 16,7%, número muito superior ao dos portugueses.

E, numa entrevista a este jornal, o insuspeito presidente do Sindicato dos Chefes dos Guardas Prisionais afirmou depois: «Não consigo decifrar os números que o Dr. Luís Neves apresenta. Temos 203 reclusos estrangeiros por cada 100 mil presos. Ora, se os nacionais são cento e tal pelos mesmos cem mil, qualquer coisa não bate certo».

E – acrescento eu – mesmo este número de estrangeiros deve estar subavaliado, pois há muitos presos considerados portugueses que são naturais de outros países, tendo-se naturalizado ou adquirido dupla nacionalidade.

O que pretendeu o diretor da PJ com a sua intervenção?

Obviamente, calar as vozes que levantam reservas à imigração e, no limite, responder ao Governo. Na sequência da operação no Martim Moniz, Luís Montenegro afirmara que havia naquela zona uma «perceção de insegurança» e era preciso agir para tranquilizar a população.

Ora, Luís Neves veio dizer o contrário: a perceção de insegurança relativamente aos imigrantes é errada, é uma treta, pois baseia-se sobre dados falsos.

Na prática, Neves tirou o tapete a Montenegro.

Sendo um polícia, quis fazer política.

Só que os números errados ou enganosos, afinal… eram os dele!

Foi um tiro pela culatra.

Uma coisa é evidente: uma das primeiras tarefas do Estado é controlar as fronteiras.

Também resulta óbvio que não podem entrar em Portugal todos os que o desejem, pois o país não tem capacidade para os receber – a nível da saúde, da educação, da habitação, etc.

Isto não é ideologia, são factos.

É preciso, pois, regular.

A política de ‘portas escancaradas’, que a esquerda defendeu durante muito tempo, com a intervenção ativa do PS e a conivência do PSD, não é sustentável.

Pedro Nuno Santos já o percebeu.

Mas há muita gente no PS que ainda não.

E na máquina do Estado, a começar por Luís Neves, também não.

A luta vai ser dura – mas é decisiva.

Portugal, a Europa e a América do Norte – as regiões que atraem imigrantes e para onde todos gostariam de vir –, têm de se proteger dessa invasão silenciosa.

Caso contrário, rebentarão elas por dentro.