A cidade brilhante sobre a colina

Sob o comando de Milei, Buenos Aires é, cada vez mais, a cidade brilhante sobre a colina.

Na última edição expus, de forma mais ou menos sucinta, a nova internacional conservadora, colocando em evidência aquilo que a une. Hoje, parece-me importante abordar aquilo que a separa, destacando o seu exemplo de maior sucesso: a Argentina. Sendo mais específico, a Argentina de Javier Milei.

Para quem se limita a acompanhar a análise política mainstream, assente num commentariat apressado e obcecado com a simplificação – salvo raras exceções –, a homogeneização de todos estes líderes da direita mundial pode parecer algo garantido e sem grande margem para contestação. Todos eles representam o ressurgimento de uma era obscurantista, reacionária e, claro, fascista. Esta tentativa de categorização, delimitada por contornos ideológicos estanques que ignora por completo a heterogeneidade inerente às correntes do pensamento político, em nada contribui para a séria e rigorosa análise dos fenómenos que marcam a conjuntura. Ora, uma vez excluído o Leviatã global que une todos estes movimentos, Milei surge claramente sozinho.

Primeiro, escapa aos padrões que hoje caracterizam um político. É um académico, especialista em Teoria Económica, que foi traçando o seu caminho na política através de intervenções na televisão que combinavam um tom inflamatório com rasgos de brilhantismo frequentes. Segundo, é um economista que vê na Escola Austríaca a forma ideal de organização socioeconómica, inspirando-se em grandes nomes como Friedrich Hayek, Murray Rothbard, Ludwig Von Mises, Milton Friedman e outros pesos pesados do ideário liberal e libertário. Só estes dois aspetos, por si, colocam imediatamente o Presidente argentino numa categoria à parte.

Milei é um verdadeiro outsider, que sacrificou a relativa pacatez da vida académica para assumir um país em ruínas, mesmo contra o conselho de Jesús Huerta de Soto, um dos seus mentores. As impressoras do Banco Central Argentino operavam a alta rotação, triturando, a cada peso impresso, o poder de compra dos argentinos e a bola de neve inflacionária transformava-se rapidamente numa avalanche empobrecedora. A sua vitória frente a Sergio Massa chocou o mundo. Não foram poucos os casos de cobertura mediática em que se utilizou o termo «extrema-direita» para descredibilizar o recém-eleito Presidente no final de 2023.

A já mencionada necessidade de simplificação brinda-nos com esta falta de rigor gritante. Como pode alguém como Javier Milei – cujo pensamento assenta na redução do aparato estatal – ser conotado como «extrema-direita»? Esta perversão dos conceitos contribui para a crescente descredibilização dos meios de informação tradicionais, muitas vezes toldados por uma ou outra agenda ideológica.

Conceitos e teoria à parte, vamos aos números: em dezembro de 2023, a taxa de inflação mensal era de 25,5%; um ano depois, está nos 2,7%. A taxa de pobreza caiu dos 55,5% para os 36,8% em apenas um ano. A dívida passou de 99,5% do PIB para 45%. Um défice fiscal de 15% do PIB transformou-se em excedente – o primeiro nos últimos dezasseis anos. Para além disto, a atividade económica recuperou em “V”. Os sucessos que florescem do processo de liberalização continuam e estão a olhos vistos.

Nos últimos anos assistimos a um crescimento do Estado e das suas inerentes ramificações burocráticas, uma tendência que teimava – e ainda teima – em cessar, à medida que os cidadãos iam sendo asfixiados em vários setores. É por isto que, hoje, Buenos Aires é a cidade brilhante sobre a colina, podendo servir de inspiração para outros intervenientes.