O mundo está a transformar-se e, penso, que todas as mudanças nos obrigam a compreender o seu núcleo central. O que se perspetiva, num futuro, não muito longínquo, fará uma grande revolução na construção social e na educação humana. O encontro que ocorreu em França, na última semana, sobre a Inteligência Artificial promete revolucionar muitas das dimensões da nossa vida.
A invenção da imprensa foi uma das realidades mais incríveis na transformação da forma de pensamento. Ela introduziu a capacidade de confrontar o conhecimento com outras ideias, revolucionando completamente o pensamento. Outro fator que mudou a forma como vivemos foi a industrialização. A revolução introduzida pela invenção do telefone, do computador e da internet mudou a relação que estabelecemos com o tempo e com o espaço.
Ainda não temos ideia do que irá mudar na nossa vida com a introdução da Inteligência Artificial. Sabemos que já existem formas muito diferentes de trabalho. Só para falarmos alguns casos portugueses: um professor universitário, ao ler os trabalhos dos alunos, percebe que todos tinham frases curtas e semelhantes à língua inglesa e deu-se conta que aqueles trabalhos não tinham sido escritos por humanos; jovens são identificados por desenvolverem plataformas de Inteligência Artificial para funcionar na Dark Web.
Há uma questão que tenho procurado responder nestes dois anos do boom deste novo sistema de trabalho: como está a Igreja a preparar-se para se enquadrar nesta nova forma de vida humana?
É com tristeza com vejo que a primeira palavra sobre a Inteligência Artificial vai no sentido de lhe meter balizas, fronteiras, limites. Ora, a primeira coisa que procuramos é um julgamento ético sobre esta nova linguagem, mas penso que deveríamos criar um novo dicastério que se encarregue de desenvolver esta relação entre a Igreja e a Inteligência Artificial.
Numa Igreja do Papa Francisco que procura quebrar todas as barreiras e limites que nos incapacitam de uma relação salutar entre nós, gostaria de ver uma inovação na nossa forma de trabalhar.
Ao contrário do que se diz, a Idade Média foi não foi a idade das trevas mas a idade das luzes. Não há como negar que foi a Igreja quem inventou o sistema universitário e produziu um novo sistema de pensamento que desembocou na criação da ciência moderna. Não há como negar que na Idade Média a Igreja desenvolveu os sistemas de saúde, nos cuidados hospitalares, no cuidado pelos órfãos e pelos mais fracos. Não há como negar que o próprio iluminismo é uma consequência da busca do inteligível, isto é, de uma procura de não contradição pela própria razão iniciado pelo próprio pensamento cristão.
Penso que não precisamos de ter medo de abraçar as novas realidades que estão a surgir na sociedade, deixando de olhar apenas para a ética como missão da Igreja. A Igreja não é tanto um tribunal da ética, mas uma vida livre que vive no mundo sem ser do mundo, nunca renunciando ao que no mundo existe. Ora a ética que é introduzida por Cristo no mundo é, acima de tudo, a capacidade de liberdade para viver no mundo sem ser do mundo.
É por isso que penso que estamos numa altura de criarmos um organismo que se debruce sobre a Inteligência Artificial para compreender que proveitos pode a Igreja receber desta nova realidade, mas principalmente que inputs a Igreja lhe pode dar.