Os radicais não reconhecem o direito à habitação

As áreas metropolitanas estão a ficar cheias de pessoas que não têm para onde ir. A capital já tem zonas de barracas debaixo de viadutos, paredes meias com habitação de luxo.

A campanha de desinformação em torno das alterações no Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), publicamente conhecida como a nova Lei dos solos, assumiu contornos próximos do absurdo, promovendo uma cortina de fumo que trata a comunidade como se esta estivesse coletivamente embrutecida.

Os opositores das alterações legais começaram por afirmar que estas iriam violar a REN (Rede Ecológica Nacional) e a RAN (Rede Agrícola Nacional). Na verdade, isso nunca esteve em causa. O que as alterações pretendem é permitir que sejam desafetados, para construção de habitação (70% pública, 30% privada), solos rústicos que não estejam classificados como REN ou que não tenham elevado potencial agrícola.

Posteriormente, foi utilizado o argumento do terror: aqui del-rei que, permitindo que sejam os órgãos municipais (câmara municipal e assembleia municipal) a promover essas desafetações, ‘vem aí a corrupção’. Este argumento, não fosse trágico, seria até divertido, determinando que os funcionários das Comissões Conjuntas de Desenvolvimento Regional (CCDR) são mais sérios do que os técnicos dos municípios que analisam o território concelhio. São também mais sérios do que os eleitos pelo Povo. Serão os técnicos da CCDR feitos de uma qualquer massa humana diversa dos técnicos dos municípios? Ou será que os técnicos das CCDR estudaram em escolas diferentes?

Saberá, quem propõe estas coisas, que as administrações das CCDR são constituídas por quadros políticos, a maioria deles ex-autarcas, que foram nomeados para o efeito? Serão, estes quadros políticos, aquando da mudança de cadeira, dos edifícios municipais para as CCDR, ‘ungidos e benzidos’ de modo a alcançar um qualquer outro estágio de evolução humana?

Por fim, somando ao argumento anterior, pôs-se em causa a seriedade dos agentes políticos que promoveram as alterações legais. Mesmo no caso do ex-secretário de Estado da Administração local, que criou a sua empresa após ser nomeado para o caso, nada indicia que estivesse no seu fito a promoção imobiliária em solos rústicos, a desafetar nos termos destas alterações legais.

O caso do primeiro-ministro é, no que respeita à questão concreta, particularmente ilógico. O chefe do Governo tinha, desde há alguns anos, uma empresa familiar, com possibilidade de intervir em diversos setores de atividade, coisa que fez. O que tem isto a ver com as alterações em discussão? Nada! Mas serviu para intimidar e inquinar o debate, como aconteceu.

Na verdade, subjacente a tudo isto, estão os preconceitos e a ideologia dos extremistas e dos ignorantes. Tudo serve para impedir que se faça construção para habitação, num momento no qual os portugueses estão tão necessitados dela.

Conheço, no meu círculo próximo, dezenas de pessoas que precisam de uma casa que possam pagar. Não têm. Contacto, diariamente, por dever de ofício, com gente em desespero por falta de casa. Não vão ter casa no curto prazo. Já não será possível.

As áreas metropolitanas estão a ficar cheias de pessoas que não têm para onde ir. A capital já tem zonas de barracas debaixo de viadutos, paredes meias com habitação de luxo, muita dela vendida a mais de 10 mil euros o metro quadrado de construção. Isto não envergonha a maioria dos políticos portugueses? Não os toca? Devia, mas não faz. Não sei quem estão a servir, mas não é o Povo. Sentados, no conforto do seu lar, vão acreditando que ‘pimenta no olho do outro é refresco’.

Acredita, a atual geração de políticos, ser possível manter este regime enquanto condenam milhares de portugueses a viver miseravelmente? Não será. Uma democracia não cria miseráveis, protege o Povo da miséria.