Entre o pântano e a tanga

De 95, data em que Cavaco abandonou o Governo, a 2025, passaram 30 anos. Passámos dos verdes anos para os tristes anos.

No seu gabinete na Pampulha, Cavaco Silva deve estar a pensar que ele é que teve razão. Governou no seu estilo austero, sem concessões à comunicação social, com o foco em executar reformas no país e em tirar o máximo proveito da enorme quantidade de fundos europeus que entravam em Portugal por aqueles anos. É certo que os tempos de então não são comparáveis com os tempos de agora, mas o jornal O Independente, dirigido por Paulo Portas, esteve lá para provar que o escrutínio não era meigo para o Governo, nem para nenhum governante. Houve ministros a cair por causa de notícias, mas Cavaco manteve-se por dez anos e saiu por sua decisão, não sendo credível que tivesse perdido eleições se a elas tivesse concorrido mais uma vez. Porquê? Porque o país via resultados, respirava futuro, não estava angustiado, nem afogado em crises sucessivas. Os jovens de então, como era o meu caso, apostavam em Portugal.

Desde 1995 tudo mudou. Guterres, chegou com a promessa da ‘Razão e Coração’. Muitos, como eu, achámos que era boa a mudança. Só podíamos ganhar com um novo ciclo, que pegasse no que vinha de trás e lhe acrescentasse uma nova abordagem social para que o país pudesse crescer com mais oportunidades para todos. Foi o primeiro engano. Seis anos depois Guterres demitiu-se sem honra nem glória, para que o país não caísse num pântano.

Durão Barroso anunciou que estávamos ‘de tanga’. Foi a primeira vez, que ouvi dizer que tínhamos de fazer sacrifícios. Arregaçámos as mangas e aceitámos o desafio. Mas quando tudo parecia estar a endireitar-se, eis que o primeiro-ministro decide aceitar um emprego melhor. O emprego era bom, talvez irrecusável, mas para o aceitar, podia ter acautelado o futuro e não nos deixar no pântano outra vez.

Sócrates, independentemente das questões jurídicas que não são de somenos, deu cabo do pouco tecido empresarial, gerador de riqueza, que tínhamos. Portugal Telecom. Banco Espírito Santo, TAP, para só falar nas mais importantes, foram todas para o galheiro por causa da interferência pérfida do Estado em conluio com gestores incompetentes, oportunistas e corruptos.

Passos Coelho veio a seguir. Adotou uma teoria que ouvi muitas vezes quando era adolescente: ‘é preciso sofrer para ser bela’. Tenho muitas dúvidas de que a frase esteja certa, mas à custa desta máxima fazem-se sacrifícios que trazem vantagem. Sim, foi duro, mas Passos Coelho pôs o país com o cronómetro a zeros.

Quatro anos depois os portugueses voltaram a votar nele. Mas não foi suficiente, faltou uma maioria absoluta. António Costa assumiu o poder com a famosa ‘geringonça’ e. apesar de ser um político com capacidade e experiência, usou o poder para desfazer o trabalho feito e gerir o pântano. Durou oito anos até cair com absoluto desinteresse e falta de energia.

Entretanto e Chega chegou e impôs-se. Num país muito diferente do tempo da minha juventude, onde se respira desalento e não se vê futuro. Montenegro chegou ao Governo pela margem mínima, não chegou a ter tempo para mostrar o que valia. Não sabemos se vai ter. Mas sabemos que o homem que fez política toda a vida, que se notabilizou pela sua intuição política em tempos difíceis, tropeçou numa mentirinha de criança. Montenegro achava mesmo que nos dias que correm era possível manter uma empresa naquelas circunstâncias, com aquelas avenças no seu perímetro familiar, sem que nenhum dos membros da família tivesse competência para cumprir aquelas tarefas?

É pena, mas mais um Governo falhou em Portugal, e o tempo de voltar a trazer esperança ao país está a sumir-se.