A política portuguesa é, como sabemos, uma verdadeira caixinha de surpresas, muitas delas deprimentes. E são cada vez mais os avisos de que esta trágico comédia irá contribuir para afastar gente competente que não quer ver o seu nome na lama, injusta ou justamente. O nível que o Parlamento atingiu, com algumas figuras bizarras como o deputado Miguel Arruda, não augura nada de bom. Ninguém gosta de ser conotado com a ilustre flor do entulho e a Assembleia da República não é, atualmente, um bom cartão de visita. Se aliarmos ao nível dos políticos o nível da maioria dos comentadores, percebemos que vivemos num autêntico circo, em que os participantes procuram ganhar protagonismo fazendo números alarves.
Esquecendo a novela da moção de confiança e o fim da Legislatura, com eleições anunciadas para maio, não deixa de ser curioso como os temas que estavam em cima da mesa, como que por artes mágicas, desapareceram da agenda política. O caso mais emblemático é o das Presidenciais que, apesar de se realizarem depois das eleições autárquicas, abria telejornais com muita frequência, mas depois da anunciada queda do Governo, praticamente desapareceu do radar informativo. Se o almirante se preparava para começar a dar um ar da sua graça, cedo percebeu que era gastar cartuchos em vão. O mesmo se passa com Marques Mendes que terá refeito a sua agenda dos próximos meses, esperando que o vento das Legislativas se afaste, tendo, contudo, que depois aguardar que as autárquicas não ocupem muito espaço mediático. Até André Ventura, que chegou a ter dia para anunciar a sua candidatura a Belém, ficou baralhado com as contas, e vai ter de anunciar primeiro a sua candidatura a primeiro-ministro.
António Vitorino e António_José Seguro, à semelhança de Gouveia e Melo, ganharam tempo e tudo indica que só para meados do corrente ano é que começarão, timidamente, a dar um ar da sua graça. Claro que os especialistas em presidenciais logo mudaram as agulhas para as Legislativas. Os que estão de um lado da barricada logo atribuíram as culpas a Pedro Nuno_Santos e a André Ventura, enquanto os outros dispararam na direção de Luís Montenegro. Atendendo às sondagens, não vai mudar grande coisa em maio, pois um ano não foi suficiente, aparentemente, para os eleitores mudarem muito o seu sentido de voto. Supostamente, o Chega verá alguns dos seus indefetíveis passarem para a abstenção, e a Iniciativa Liberal e o Livre deverão ser os que mais sobem. O Bloco de Esquerda deverá ficar conhecido como o grupo do meio Bolt, tal deverá ser o castigo das pessoas grávidas…
Mas isso são tudo conjunturas que a ida às urnas esclarecerá.
Falando como espetador do circo político, acho imensa piada à nervoseira que se instala no PSD sempre que se fala em eleições legislativas, temendo muitos que Pedro Passos Coelho avance para a liderança do partido._Não faço ideia se será a salvação da direita ou não, mas, do que vejo, os sociais-democratas nunca poderão voar ‘livremente’ sem resolverem essa eterna questão. Montenegro, aparentemente, não conseguirá, caso vença, uma maioria absoluta, e como quererá continuar a deixar o Chega de fora, o PSD não poderá fazer obra que fique para o futuro. Também Pedro Nuno_Santos não está em melhores lençóis, pois se for derrotado pelo ‘consultor’ Luís Montenegro terá a porta de saída aberta.
Politicamente falando, vai ser um ano muito divertido, esperemos é que não apareça mais nenhum Miguel Arruda.
Telegramas
Um partido monárquico invisível
Por causa de uma sigla, AD, o PSD foi obrigado a ‘contratar’ o CDS e o PPM para as suas listas nas últimas legislativas. O CDS, que estava morto, ressuscitou e conseguiu ‘nomear’ um ministro e um secretário de Estado. Veremos o que terá direito nas próximas eleições. E em maio irá o fadista do PPM fazer outra vez figura de papagaio do pirata? Isto é: aparecer nas fotos atrás de Montenegro e desaparecer depois da noite eleitoral?
Grevista arrependido
Rui Tavares, o líder do Livre, gosta muito de defender o direito à greve, mesmo que, por vezes, seja completamente injustificável essa forma de luta – veja-se o que se passa na CP ou na CML – mas o homem que andou pelo BE e fundou o Livre foi apanhado a protestar, nos anos 90, contra o fecho a cadeado da universidade. A explicação que deu para essa atitude é hilariante. Que era contra as propinas, mas fechar a universidade a cadeado «passava a imagem de não estarmos confiantes na mobilização dos estudantes». Genial.