Fátima Lopes: “Viver sem gratidão é uma tristeza. É não honrar a vida”

É uma das comunicadoras mais acarinhadas pelo público português. Recentemente, decidiu mudar de vida, afastando-se da televisão, desdobrando-se agora em inúmeros outros projetos. Sonhos? Tem muitos, mas não os partilha, por serem seus. 

Quando entramos na famosa pastelaria Tentadora, em Campo de Ourique, vemo-la ao fundo da sala. Cumprimenta com cumplicidade quem lá trabalha e percebemos que é uma cliente habitual. Também nos recebe com um sorriso.

Não foi difícil o país apaixonar-se por si e pelo seu trabalho. Tenho a ideia de que é muito acarinhada pelo público e, muito desse carinho, vem da sua personalidade. A Fátima parece uma mulher muito calma, transparente e sensível. Vê-se dessa maneira?
Vejo-me como uma pessoa normal. Acho que a normalidade é uma grande virtude. E eu sei que sou uma pessoa normal, que faz uma vida normal, dentro do possível, e tendo em conta que sou uma figura pública. Mas sim, sei que sou uma pessoa acessível e gosto do contacto com as pessoas. Gosto de as ouvir, de as perceber, de dar espaço para que elas se manifestem… Isso tem a ver com as características da minha personalidade. Se o país se apaixonou ou não, eu não sei. Sei que o país, durante estes 30 anos, colocou-me onde estou e as pessoas têm me permitido permanecer. Às vezes é difícil chegar lá, mas é ainda mais complicado mantermo-nos nesse lugar. O ano passado fez 30 anos que me estreei em televisão. É uma vida. As pessoas continuam a respeitar o meu trabalho, as minhas escolhas… É um sinal de grande consideração. Eu só posso estar muito grata.

Então nunca criou uma persona…
Acho que não tenho nenhuma persona. «Agora ligaram-se as câmaras e vou ser assim», «Agora estão jornalistas presentes e vou ser assim». Não consigo conceber isso. Acho que seria o princípio de uma enorme infelicidade e eu não quero ser infeliz. Todos temos os nossos momentos de infelicidade, temos fases em que não somos felizes por esta ou aquela razão… Isso é a coisa mais normal do mundo. Porém, viver uma pessoa que não se é deve ser muito cansativo. Deve ser uma coisa desesperante… Agora sou a Fátima ou a persona? Não… Sou sempre a mesma! É um descanso!

Viveu em Moçambique dos 8 aos 11 anos. Já disse noutras entrevistas que tem muito presente o cheiro a terra molhada… O que recorda mais dessa infância?
Acima de tudo a liberdade e a leveza. Quando as pessoas não têm nada, seja lá o que for é sempre muito. Esse é um ensinamento que fica! Em Moçambique tudo era muito leve. As pessoas não tornavam num problema coisas que, bem espremidas, não têm importância nenhuma. As pessoas não perdiam o seu precioso tempo a conjeturar sobre coisas que na verdade pouca importância têm para a felicidade delas. Em Moçambique a peneira é muito mais apertada em relação à vida. Portanto, aquilo que passa para baixo como um problema, são muito menos coisas. Moçambique deu-me esta dimensão de olhar e perceber o que é que é realmente importante. Por outro lado, deu-me a noção de que eu sou sempre uma privilegiada. No dia a dia, tenho uma série de facilidades que muitas pessoas no mundo não têm. Essa perceção ficou-me nessa idade. Fui para Moçambique, fiquei numa escola moçambicana, era a única criança branca, era a única criança da turma que levava lanche, das poucas que ia calçada… Apesar de pertencer a uma família humilde, comparada com as outras famílias tínhamos imenso. O meu lado excessivamente pragmático vem daí. Quando passas uma fase importante da tua vida pela experiência de que consegues viver com muito menos e que está tudo bem e até és feliz, passas a olhar para tudo de uma forma muito diferente.
Eu sou muito assim… Dificilmente crio um problema.

Como é que foi regressar a Portugal?
Foi difícil. Muito difícil… Era olhada como retornada. Nasci em Portugal e era portuguesa. Fui para Moçambique depois da independência… Foi uma sensação muito estranha regressar ao meu país e não me sentir pertença. Levei algum tmpo a voltar a sentir-me em casa.

Estreou-se na televisão na SIC em 1994 no programa ‘Perdoa-me’ da SIC. Quem era essa jovem? Sempre quis seguir esse caminho?
Não! De todo! (risos) Eu fui parar à televisão por um acaso. Eu não a procurei. Foi a televisão que me encontrou. Foi o Emídio Rangel que propôs o meu nome para um casting e que me chamou. Ele não me perguntou se eu queria. Chamou-me e disse que eu o ia fazer! (risos) Ele achava que eu tinha características de apresentadora. Eu pensei: «O que é que eu tenho a perder? Se não tiver talento, a vida continua». Quando comecei foi muito naquela de: «Deixa ver!». Eu não sabia se ia gostar… Depois percebi que sim, que gostava. Mas não sabia se ia ter sucesso… Depois percebi que tinha… Não sabia se ia ter longevidade… As oportunidades foram surgindo umas atrás das outras.

O que é que mais lhe interessou neste universo televisivo?
A magia da televisão. Aquilo que a televisão pode fazer à vida de uma pessoa, no bom sentido. Pode ajudar, transformar, resolver. Mais do que a fama que me dava… Eu ia a qualquer lugar e as pessoas vinham falar-me. Tinham uma verdadeira admiração. Tudo parava. Hoje em dia é muito mais tranquilo. Faço a minha vida toda normalmente. As pessoas já estão muito habituadas, veem muitas figuras públicas. As redes sociais normalizaram muito a nossa vida. Deram acesso a muita coisa que as pessoas antes não sabiam como eram. Mas aquilo que mais me fascinava não era isso. Era perceber que o conteúdo aparecia na televisão e podia mudar para sempre a rota da vida de uma pessoa. E na verdade esse é o bocadinho da magia da televisão que eu preservo. A televisão ainda consegue transformar vidas! 

No dia em que fez o casting para apresentadora de televisão, a sua mãe disse-lhe para nunca se esquecer de onde vinha. É muito fácil deslumbrar-se neste meio… Há muitos egos inflamados… Como se escapa disso?
Primeiro quando se teve uma educação que ajuda nesse aspeto… Na educação que eu recebi, nunca houve espaço para os egos. Portanto, eu já vinha treinada. Ninguém é mais importante que ninguém. Ninguém tem direito a passar por cima de ninguém. Às vezes as pessoas vêm de famílias humildes, mas não aprenderam estes princípios básicos que no fundo permitem saber onde é que é o seu lugar, o lugar do outro, as fronteiras e saber respeitar. Eu posso vir de uma família humilde e não saber isso. A humildade é uma coisa que pressupõe muitos valores, mas às vezes há determinados valores básicos que não estão lá.
Em segundo lugar, tive sempre ao meu lado pais que me disseram coisas desse género. Sempre dei muito valor às coisas que eles me diziam. Sempre me disseram a verdade. A sua opinião foi sempre uma coisa a respeitar… Onde é que eu vou hoje? Ao Barreiro, à minha terra natal. E nos últimos dois anos tenho vindo a fazer cada vez mais coisas aí, ajudando naquilo que eu posso. É uma forma de dar de volta aquilo que eles me deram a mim.  

Foram muitos os programas apresentados por si. Há algum que mais a tenha marcado?
Não há um programa que mais me tenha marcado. Eu diria que há um tipo de programas que me marcou… Os programas que fiz em daytime… Porquê? Porque sinto que foram os que fizeram a apresentadora que eu sou. Não foram os programas de primetime, no suposto «horário nobre». Essa é uma expressão que eu nunca gostei, porque acho que é muito pouco respeitosa em relação a quem trabalha nos outros horários. Então os outros horários são o quê? De segunda qualidade? Os melhores profissionais da praça, mais completos, são os que fazem daytime. Quem faz daytime faz tudo, é o maior desafio de todos. No espaço de uma hora nós temos uma história que é dramática até à última casa e a seguir temos um momento de humor. Esta ginástica emocional e até intelectual é dificílima. Uma pessoa que faz primetime se lhe tirarmos o teleponto, muitas vezes, pouco ou nada faz…

Tal como referiu, a Fátima ouviu milhares de histórias tristes, duras, violentas, ao longo do seu percurso no daytime. Quando somos pessoas empáticas, é fácil que vivamos a vida dos outros… É essencial sermos acompanhados para conseguirmos fazê-lo sem levar esse peso para casa?
Completamente! Eu sei que nem todos têm, mas acho que deveriam ter. Podem haver pessoas que sabem lidar com isso absolutamente bem, ótimo! Mas eu, ao fim de muitos anos a ouvir essas histórias, comecei a perceber que tendo em conta a minha empatia, começava a ser muito difícil não me deixar afetar.  Comecei a perceber que me estava a tornar uma pessoa triste. Portanto, trabalhei com uma psicóloga durante sete anos. Trabalhei muito com a parte da psicoterapia, coaching, etc. Se nós estamos realmente a ouvir uma pessoa, olhar nos olhos como eu estou a olhar nos seus, é muito difícil não sentir aquilo que a outra pessoa está a sentir. A respiração daquela pessoa, o olhar de dor, a nuvem que percebemos que a acompanha… É mesmo muito difícil que isso não nos afete. Temos de ir buscar recursos e ferramentas para sabermos fazer o nosso trabalho sem nos deixarmos contaminar.

É impossível criar um escudo…
Um escudo total é impossível, pelo menos no momento em que se está com a pessoa à frente. Se não, vai ser uma entrevista fria e distante. Vamos deixar a palavra «entrevista» de lado… Se estamos a falar de uma conversa, essa conversa nunca será profunda se no meio existir uma barreira de acrílico como nos tempos da Covid. Tem de ser assim… A outra pessoa tem de sentir que eu estou mesmo aqui.

Marcou muita gente ao longo do seu percurso… Lembro-me de ver uma das suas entrevistas com um pai que tomava conta dos seus cinco filhos sozinho… A Fátima estava visivelmente muito emocionada. As crianças todas a chorar… Sente que uma das suas missões de vida é ajudar os outros?
Lembro-me perfeitamente dessa história. Essa é a tal magia de que falava. A televisão transformou-se muito ao longo dos anos, mas mantém isso. Ainda consegue fazer milagres. Esse é o lado mais lindo da televisão. Ao mesmo tempo, é preciso ter muito cuidado. Não se pode brincar com a vida das pessoas. Não se pode pôr lá qualquer coisa, de qualquer maneira.
Portanto, em histórias como essa, eu sentia que tinha o privilégio de ter na minha mão o meio que ia transformar a vida das pessoas. O meu papel tinha de ser utilizar isso da melhor forma. Se é uma missão ou não, não faço ideia. Mas eu não sei fazê-lo de outra maneira. E é muito engraçado Sara, porque nestes anos todos de profissão, eu já estou naquela fase em que entrevisto filhos de [anteriores] convidados. Onde já me cruzo com pessoas com as quais eu acho que nunca estive na vida, mas que estive. As pessoas dizem: «Fátima estive no seu programa há 15 anos! A minha vida transformou-se». Aquilo que para mim é mais bonito, quando tenho estes reencontros, é quando alguém me relata o impacto positivo da conversa que teve comigo. Isso é o melhor presente que alguém me pode dar. E graças a Deus que isso me acontece muitas vezes…

É preciso uma grande sensibilidade e sentido de responsabilidade… A maneira como a conversa é conduzida também tem muita influência…
Claro. Não pode ser feita de qualquer maneira… Não pode ser feita porque queremos provocar sangue. Provocar sangue é fácil. Nem é preciso ter grande mestria, nem grandes técnicas de entrevista. Basta fazer duas ou três perguntas… Não pode ser. Estamos a fazer uma entrevista com uma pessoa real, com a sua história. Temos de ter respeito por isso! 

Nos últimos anos tem falado muito sobre saúde mental. Na verdade, já disse que foi aos 27 que começou a estudar técnicas de desenvolvimento pessoal. Medita todos os dias ao acordar. Esse hábito veio desse cuidado?
Sempre que posso… Nem sempre consigo! Esse hábito foi aprendido muito cedo. Precisamente nessa altura em que comecei a despertar para o desenvolvimento pessoal. A meditação é das ferramentas mais poderosas que existem para a nossa saúde mental. Tal como a respiração. Saber usar duas ou três técnicas de respiração pode fazer-nos sair de uma crise de ansiedade, de uma situação de profunda tristeza… Gostava muito que muitas destas ferramentas estivessem acessíveis desde o infantário. Se desde tenra idade as crianças aprendessem essas ferramentas de inteligência emocional nós tínhamos crianças, jovens e adultos menos ansiosos, mais capazes, mais resilientes, com maior capacidade de fazer uma gestão dos seus comportamentos, de se autorregular. Há uns dias estive em Albufeira, que criou um projeto fantástico chamado ‘Projeto Ser’. O objetivo é levar a inteligência emocional às escolas… Começaram com os infantários e, neste momento, já está no secundário. Temos crianças mais focadas, mais capazes, com muito menos violência, com maior produtividade, maior resposta escolar. Só coisas boas. Porque é que isto não está no país todo? É preferível gastar imenso dinheiro em medicação? Temos de fazer prevenção. Começar na base!  Hoje a minha vida é sempre na estrada. Ou porque vou gravar um programa, ou porque vou dar uma entrevista, ou apresentar um seminário, moderar mesas de debate…

Isso enriquece-a…
As pessoas já sabem que eu medito, que eu uso estas técnicas. Muitas vezes abordam-me. Eu percebo que Albufeira me tenha vindo buscar a mim. Não é apenas porque eu tenho a plataforma Simply Flow, que é dedicada absolutamente à saúde e bem estar… Isso dá-lhes a certeza que eu me interesso por estes temas, mas não sou uma especialista. Tenho consciência que sei um bocadinho acima da média nos temas da educação, porque me interesso, leio muito. Quando sou chamada para estas iniciativas fico muito feliz. Eles percebem que não precisam de me explicar as coisas, eu já estou dentro do meio… Eu sempre priorizei a inteligência emocional.

Também diz ser uma pessoa muito grata, que agradece muitas vezes. É uma maneira de levarmos a vida de uma forma mais leve?
Viver sem gratidão é uma tristeza. É não honrar a vida. Quem me estiver a ler deve pensar assim: «Como é que eu posso estar grato se já me aconteceu isto…». A todos já aconteceu uma lista de coisas, umas coisas mais pesadas do que outras… Todos temos consciência disso. Mas ao lado dessa página das coisas menos boas, há sempre alguma coisa boa. Tem de haver! Ou porque temos filhos, ou porque temos amigos fantásticos que nos ajudam, ou porque fazemos um trabalho de que realmente gostamos, ou porque temos uns pais que nos acarinham… Não estou a falar de coisas mega… Estou a falar de coisas normais… Se eu consigo pagar as minhas contas todos os meses, estou grata por isso. Se eu tenho saúde, quando há tanta gente que não tem, eu estou grata por isso! Se eu tenho uma boa relação com a minha família, estou grata por isso!

Já falou muito de limites. Há que saber os nossos, principalmente no mundo laboral. No mundo da televisão acredito que não seja fácil «parar». É também muito exigente consigo própria. A dada altura isso pode virar-se contra nós? Já revelou que teve um princípio de burnout…
Acho que é importante impor limites em qualquer profissão. Cada um tem os seus e devemos conhecê-los. Independentemente do trabalho de cada um, temos de ter consciência de que a vida tem de ter equilíbrio. A vida não pode ser só trabalho nem só ócio… O que acontece com o burnout é isso, a dificuldade de impor limites. E esses limites têm de se impor também na relação que temos com os outros. «Parou aqui. Daqui para a frente não dás mais nenhum passo!».

Não ter medo de dizer «não».
Eu sou conhecida por ser muito assertiva. Eu digo as coisas sem papas na língua com cuidado. Quando era nova não era assim. Saia-me tudo da boca para fora, sem filtros. Mas a vida depois ensina-nos… Temos de perceber que há formas e formas de dizer as coisas. Hoje sou muito cautelosa na forma como o faço, mas não deixo nada por dizer. Isso é que não! Faz-me mal.

Como é que vê a sua evolução enquanto profissional?
A evolução normal de quem esteve sempre disponível para aprender. A pessoa que atinge um determinado patamar e depois acha que não precisa de aprender mais nada, que já é o suprassumo na sua profissão, está no princípio do fim. Porque falta uma coisa importantíssima se queremos manter o sucesso: a humildade! Eu acho que a pessoa que eu sou hoje continua a ser uma profissional muito curiosa. Continuo a gostar de ver os meus colegas a trabalhar. Vou a um programa qualquer como convidada, gosto de chegar mais cedo para os ver trabalhar! Gosto mesmo. Gosto de ver quais são os métodos que usam, as suas técnicas… Aprendo sempre qualquer coisa. Fora da televisão a mesma coisa. Quantas vezes me convidam para ir dar uma palestra num dia em que vão várias outras pessoas… Eu tenho a minha marcada para determinada hora, mas gosto de ir mais cedo para assistir às outras. Quero entender se há alguma margem para o meu crescimento. Eu sou esta profissional e espero ser sempre assim enquanto trabalhar.

Tem falado sobre a menopausa em alguns podcasts. Este assunto continua a ser um tabu?
Acho que está muito melhor. Já se fala no tema, já não é uma coisa que se fala apenas numa mesa entre mulheres. Isto vai ser ainda melhor quando finalmente deixarem de existir preconceitos com a idade das mulheres! Porque nos homens não tem importância nenhuma, não é? Os homens são ótimos quando envelhecem… Os cabelos brancos ficam-lhes lindamente, até a barriguinha lhes dá charme. Nós, somos descuidadas…

Aquela ideia de que a mulher tem um «prazo de validade».
Convidam-me muito para falar de questões de idade… Mesmo as empresas quando têm essencialmente mulheres a trabalhar. Eu sou mesmo muito resolvida com isso. Este ano faço 56 anos e gosto muito da idade que tenho.

Lida bem com o passar do tempo e com as transformações que ele acarreta…
Completamente! Não há nada a fazer… O que é que me serve e me adianta ficar zangada com o andar do relógio biológico? Estou cá, tenho de aceitar que o corpo se vai degradando, que a frescura física se vai perdendo. Mas há uma série de outras coisas que só a idade traz e quando ponho na balança as duas coisas, prefiro as coisas boas. Quando as pessoas me dizem: «Não tens saudades de quando tinhas 30 anos?». Zero! Não sabia tudo aquilo que sei hoje. Sofria com coisas que hoje não sofro, tinha dúvidas que hoje não tenho. Saudades? Nenhumas!

Vemos surgir uma nova geração de apresentadores. A Fátima trabalhou muito em direto. Quais os principais desafios?
Estarmos absolutamente bem preparados para o que vamos fazer. Porquê? Porque não se pára para repetir. O grande desafio é saber que a nossa preparação tem de estar tão bem feita que as falhas têm de ser evitáveis. Não quer dizer que não aconteçam. Acontecem porque somos humanos, mas devemos evitá-las. O que se faz está feito e não é alterável. O que é que isso implica em termos de preparação? Isso já depende de cada um. Há pessoas que estudam exaustivamente os materiais, outras que leem só uma vez e acham que é melhor não saber assim tanto da história…

A Fátima estuda tudo…
Exatamente! Estudo tudo, absolutamente tudo o que houver para estudar. As minhas equipas brincavam comigo porque eu não só lia os textos sobre cada convidado como, se havia uma nota, seguia. Lia essa nota. As coisinhas em rodapé, que quase ninguém lê. Para mim é também um sinal de respeito para com o jornalista que esteve horas a entrevistar uma pessoa para fazer um documento para eu estudar. Acho que é o mínimo que eu posso fazer… Ter o documento bem estudado. Eu vou para uma reunião numa empresa, não chego lá a perguntar o que é que eles querem que eu faça. Primeiro faço um diagnóstico. Faço imensas perguntas… Aviso-os logo que eu pergunto tudo. Primeiro tenho de recolher muita informação, só depois podemos começar a falar. Tenho de estar dentro do tema. 

Tem assim algum momento mais caricato que se lembre?
Quando me adormeceu uma convidada em direto… A senhora já tinha alguma idade, tinham-lhe dado um medicamento e ela adormeceu em direto. Fiquei sem convidada e fiz a entrevista toda com o afilhado que estava na primeira fila.

Tem de se pensar rápido nesses momentos…
Hiper rápido. O direto dá-nos uma elasticidade total fantástica… Uma capacidade de inventar respostas incrível. Aquilo não pára para nós pensarmos.

E o sentido de humor também ajuda nesses momentos…
Absolutamente! E eu, graças a Deus, tenho muito! Sempre me ajudou muito! (risos) Brinco muito com as coisas.

Tem também 11 livros publicados. Encontra-se também na escrita? O que é que ela significa para si?
A escrita é uma espécie de extensão da comunicação que eu gosto de fazer. Ou seja, através da escrita posso falar de temas que eu acho importantes. Quando crio as minhas personagens, a minha trama, ponho em cima da mesa temas de que quero falar envolvidos numa história. É uma oportunidade de dizer mais coisas sobre aquilo que eu penso. Por isso, as minhas personagens podem ser a antítese daquilo que eu penso, porque quero chocar as pessoas… Às vezes, só chocando e abanando é que as pessoas refletem. Gosto de escrever desde miúda! Sou daquelas que era muito boa na composição a português. Era o que eu mais gostava, porque podia inventar histórias. Adoro isso! Se eu tiver uma criança pequena comigo, quando dou por mim, estou a inventar uma história para lhe contar. E para os meus filhos inventava imensas. Tanto que eles brincavam: «Oh mãe, essa é tua?». Outras vezes utilizava coisas que tinham acontecido na vida deles e integrava na história. Quando chegava a esse momento a Beatriz perguntava-me: «Essa sou eu, não sou mãe?».

Depois de muitos anos, afastou-se recentemente da televisão. Como lidou com essa mudança na sua vida? A rotina muda…
O que eu deixei de fazer foi programas diários. De resto continuo a fazer televisão. Continuo a fazer coisas para a SIC, continuo com as minhas temporadas do ‘Aqui há Mão’, no canal Casa e Cozinha. Deixei foi de ter as rotinas diárias. No princípio estranha-se, claro. Foi muito tempo a fazer a mesma coisa. De repente não tenho de ir para o programa, não tenho reunião de alinhamento…

Isso faz-nos sentir algum vazio?
No princípio, sim. Tive de ir à procura do que são as minhas rotinas, a minha vida agora, como é que eu me defino… Aos poucos fui-me encontrando. Sou uma comunicadora, não sou só apresentadora. Dou palestras, escrevo livros, dou formações… Hoje não tenho dois dias iguais… Mas tenho uma coisa muito valiosa… Sempre que eu preciso de integrar tempo para mim e para os meus, posso fazê-lo. Antes era mais difícil. Esta liberdade é incrível. Se eu tiver de dizer que não posso porque quero ir a uma consulta com a minha mãe, posso fazê-lo.

Isso significa que está a redescobrir-se nesta fase?
Talvez… Está a ser um processo de redescoberta no sentido em que de repente percebo que tenho dimensões que não conhecia, capacidades que não sabia. Se há uns anos me perguntassem: «Achas que hoje és capaz de dar uma palestra ligada aos hotéis, amanhã dás uma palestra numa empresa de saúde e no outro dia uma conferência?». Esta variedade toda de conteúdos… Acho que não saberia. Agora sei que sou capaz.

Como vê o futuro? O que é que lhe falta fazer?
Sonhos tenho muitos, mas nunca os partilho, porque são meus. (risos) Projetos? Vamos seguir com a 2.ª temporada do ‘Aqui há Mão’, que está fantástica. Cruzámo-nos com artistas e artesãos fantásticos, estou muito expectante… Sei que vou continuar a fazer projetos com o Casa e Cozinha. Estou feliz com isso… Quero retomar o meu projeto do Simply Flow, porque correram muito bem os episódios. Fala de saúde de uma forma séria, mas muito acessível, e as pessoas precisam disso. E os livros… Quero sempre continuar a escrever. Não posso contar mais! (risos)