As mais recentes notícias que nos chegam na Roménia não deveriam passar como um caso de relevância reduzida num país que aparentemente nada nos diz. A decisão de impedir Calin Georgescu de concorrer às próximas eleições presidenciais em maio, após o Tribunal Constitucional ter anulado as eleições em que o próprio venceu a primeira volta, no início do passado mês dezembro, devia-nos preocupar por vários motivos.
Primeiro, foi declarada uma alegada influência externa, neste caso russa, no financiamento da campanha, focada principalmente na disseminação de conteúdos nas redes sociais. Relembro que a plataforma principal foi o TikTok e estamos a falar de umas supostas 800 contas nessa plataforma. Agora, o bloqueio a uma nova candidatura de Georgescu baseia-se em meras suspeitas, tendo o Gabinete Central Eleitoral dito que «não satisfaz as condições de legalidade», dado que «violava a própria obrigação de defender a democracia». É importante deixar claro que não se trata de simpatia por Georgescu – algo que não me parece minimamente relevante para o assunto em causa –, é mesmo uma questão de princípio. Qualquer defensor da liberdade e da democracia, que ao que parece não existem tantos quanto se faz parecer, deveria sentir-se incomodado, independentemente de se concordar ou não com a matriz ideológica do ex-diplomata e professor romeno.
Segundo, fica mais uma vez clara a posição da União Europeia. O seu silêncio foi ensurdecedor à data da anulação das primeiras eleições, manifestando-se apenas para dizer que deixariam «aos cidadãos romenos a decisão sobre o seu destino». Para além de ser uma declaração fraca, é altamente contraditória. O que aconteceu foi precisamente o atropelo da escolha democrática dos romenos que, a julgar pela declaração anterior, teve o aval de Bruxelas. E o mesmo está a acontecer agora com a proibição da candidatura. É uma imagem indecorosa por parte de uma instituição que apregoa valores democráticos e direitos humanos de forma sistemática.
O Tribunal Constitucional romeno e a mais alta instância eleitoral do país, com o apoio tácito da Comissão Europeia, estão a assumir uma posição de um certo paternalismo, sentindo-se responsáveis por não deixar cair os romenos nas mãos de alguém que consideram um perigo tão evidente. «Como é possível votar em alguém que pense diferente de nós?», é a pergunta que os baluartes da democracia se devem ter colocado. Mas votaram, e, se a vontade popular é soberana numa sociedade democrática governada por alguém com quem nos identificamos, não deixa de o ser quando os resultados são diferentes do que gostaríamos. Acreditar que uma série de conteúdos nas redes sociais tolda a capacidade do povo para discernir é altamente desrespeitoso. E acreditar que quem tomou as decisões acredita nisso acaba por ser ingénuo.
Por fim, parece-me também que, de uma forma geral, tem-se esquecido algo importante: a Europa de Leste sofreu durante décadas as consequências de estar subjugada ao Estado central soviético, que resultou em ferimentos ainda por sarar. Por isto, não será surpreendente que um candidato como Georgescu, que se opõe à submissão perante um regime centralizado, mesmo que o poder esteja concentrado noutra geografia e que desta vez se vista de arco-íris, consiga mobilizar uma vasta percentagem de apoio popular. Toda esta situação não é nada mais que passar um atestado de estupidez ao povo romeno, descredibilizando, no processo, as instituições.