Os reembolsos do IRS referentes aos rendimentos do ano passado estão a deixar os portugueses à beira de um ataque de nervos ou por serem mais baixos em relação aos anos anteriores ou porque são obrigados a pagar, o que leva muitos a reclamarem junto das repartições de finanças, como admite ao Nascer do SOL, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos.
«Todos os dias somos surpreendidos pelo aumento do número de pessoas que se dirigem às repartições descontentes com a situação e a pedirem explicações», explica Gonçalo Rodrigues. E admite que o problema ganha maiores contornos no caso dos contribuintes que têm de pagar. «As pessoas contavam receber um valor x e agora deparam-se com um valor inferior, mas enquanto é a receber o problema é menor é mais complicado quando têm de pagar» e dá exemplo de uma senhora que costumava receber 100 a 150 euros e agora tem 400 euros para pagar. «Faz-lhe diferença e o problema principal é o efeito surpresa. É o choque».
A par do descontentamento, o dirigente sindical chama ainda a atenção para o facto de estas reclamações irem entupir ainda mais os serviços. «Temos poucas pessoas para fazerem o atendimento. Os trabalhadores das finanças passam os dias inteiros a receber contribuintes portugueses e imigrantes que querem saber o que aconteceu, provocando um acréscimo de trabalho. E como já estavam sobrecarregados, essa situação ainda aumenta mais o stress laboral. Ficamos com a ideia que praticamente só damos más noticias, é o ónus da nossa função», confessa.
É certo que este acerto de contas já estava previsto. O Nascer do SOL já tinha avançado em setembro do ano passado que as novas tabelas de retenção na fonte em sede de IRS iriam dar um alívio fiscal em setembro e em outubro – altura em que foi aplicado um período transitório para que fosse corrigido o imposto retido a mais desde janeiro até agosto e que para muitos contribuintes foi visto como uma ‘borla’ fiscal – poderia levar muitos trabalhadores e pensionistas a serem chamados a pagar imposto no acerto de 2025. Uma realidade com a qual muitos são agora confrontados.
Ao Nascer do SOL, a bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados reconhece que apanhou muitos de surpresa, apesar dos alertas que tinham sido feitos anteriormente. «Há muitos anos foi criada uma expectativa, desde que nos conhecemos enquanto contribuintes, que há sempre reembolsos elevados e a mudança na fórmula da retenção na fonte que é o adiantamento que fazemos ao Estado estar nos últimos dois, três anos a alterar e a diminuir este adiantamento tem apanhado um bocadinho os contribuintes desprevenidos».
Uma realidade que foi ouvida pelo nosso jornal junto de quem já entregou a declaração de rendimentos e por técnicos de contas. «Já entreguei declarações de alguns clientes e não há dúvida que o efeito surpresa tem causado algum choque. Tenho vários casos de contribuintes a pagar 300, 500 euros», afirma um dos profissionais.
Paula Franco chama, no entanto, a atenção para o facto de os contribuintes não estarem a ser prejudicados. «Simplesmente ficaram com o dinheiro mais cedo no seu bolso e estavam a aguardar por este reembolso que era uma espécie de poupança forçada que faziam do lado do Estado». Mas deixa um recado: «Na prática, muitos contribuintes queixavam-se desta poupança forçada, agora que a deixaram de fazer também estão surpreendidos e sentem que as suas expectativas foram defraudadas. Os contribuintes já têm o dinheiro do seu lado porque os impostos baixaram em 2024».
Tabela mal calibrada
Também Gonçalo Rodrigues lembra que durante dois meses houve descontos mais reduzidos e admite que «tecnicamente essa redução foi bem intencionada para que o dinheiro ficasse do lado dos contribuintes e não ficasse do lado dos cofres do Estado».
No entanto, reconhece que o problema poderá estar relacionado com a tabela ter sido mal calibrada. «Deveria ter havido o cuidado de não criar diferenças tão grandes face ao que estavam habituadas. Neste momento, a diferença é pagar antes ou pagar mais para receber mais tarde porque mesmo que a pessoa seja reembolsada já pagou a sua parte com as retenções que fez. No final, a conta seria igual»
De acordo com as contas da bastonária, só vai pagar imposto quem já teria próximo de o fazer ou quem tinha reembolsos baixos. «Em setembro e outubro, os trabalhadores dependentes recebeu muito muito mais dinheiro porque entregaram menos dinheiro ao Estado e ficaram, nessa altura, com mais dinheiro disponível, mas como já passaram alguns meses, os contribuintes não se lembram», salienta.
Pagar mais para receber mais
De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, um dos truques para evitar estas surpresas passa por fazer maiores descontos mensais, tal como está previsto no código do IRS. «Qualquer um de nós pode optar por fazer uma retenção superior e pode mudar o valor a descontar todos os meses. Se pensasse que ia pagar ou se preferir receber mais no momento do reembolso poderia ter optado por reter mais todos os meses e depois ter um pé de meia no final. O problema é que as pessoas não sabem isso e como as reduções foram em setembro e outubro também não deu muito tempo de reação», diz ao nosso jornal.
Outro dos cuidados a ter diz respeito ao modo de preenchimento da declaração de IRS. Paula Franco reconhece que a declaração automática poderá ser uma opção, mas para quem fez o trabalho de casa anteriormente. «É uma boa solução para quem tem as situações completamente controladas, quer ao nível de rendimento, quer ao nível de despesas», refere.
Já para quem não validou as faturas, não verificou todas as despesas e para quem não tem a certeza se a declaração automática contempla todos esses dados então aí, a responsável aconselha a ter cuidado e a optar pela declaração normal.
Outro cuidado a ter diz respeito à entrega nos primeiros dias, principalmente para quem rendimentos de outras categorias. E explica o porquê: «A liquidação pode não estar ajustada e a simulação que se faz pode sofrer alterações por alguma das situações foram entretanto introduzidas. É preciso ter algum cuidado na confirmação dos dados».
Já em relação ao IRS Jovem, a bastonária acredita que não iremos assistir a grandes sobressaltos, uma vez que, o sistema contemplado para a entrega da declaração diz respeito às regras que estavam em vigor em 2024: aplicava-se até aos 26 anos e dependia de um ciclo de estudos. «O sistema ainda não está tão aberto como o que se aplica em 2025. Só contempla aqueles que têm ciclos de estudos e, como tal, há aqui um controlo grande sobre estas situações», conclui.