Avaliar o quê?

Se os professores nas escolas e universidades avaliassem como os comentadores, os alunos estavam tramados.

Já faz parte do quotidiano dos jornalistas políticos. Ao ritmo a que se sucedem as campanhas eleitorais as ferramentas dos avaliadores deviam estar já mais apuradas, naqueles que têm por missão ir dando a conhecer o noticiário político.


No papel de juízes de debates entre os líderes dos partidos, os jornalistas não estão lá para dar notícias, nem sequer para comentar, uma outra função a que são chamados regularmente. Não, ali a missão é mesmo dar notas e explicar porquê. Não interessa se gostamos ou não dos protagonistas. Nem se concordamos ou não com as suas ideias. É simples, é ouvir e avaliar a prestação. Para tal, é imprescindível que o avaliador deixe as suas ideias em casa e se coloque na pele do recetor da mensagem. No final pontua-se de acordo com a eficácia do mensageiro.


Basicamente é o que se exige a um bom professor. Se não fosse assim, Álvaro Cunhal, o histórico dirigente comunista, não teria sido aprovado na defesa da sua tese na Faculdade de Direito de Lisboa com 16 valores. Um dos avaliadores era nada mais nada menos do que Marcelo Caetano e a tese, em plena época do Estado Novo, versava sobre o aborto e a sua despenalização. O aluno foi competente e passou com distinção, embora, seguramente nenhum dos membros do júri tivesse simpatia pelo conteúdo da tese, ou pelo seu autor.


Vem tudo isto a propósito da forma como me parece que os jornalistas, comentadores, defensores de causas e avaliadores, estão a confundir totalmente o seu papel nos debates de avaliação que se seguem aos debates de apresentação de políticas. Alguém lhes devia explicar que não, aquele não é o local próprio para defenderem as suas opções ou para agirem de acordo com as suas simpatias ou antipatias. Até porque se têm alguma intencionalidade de ganho político, a sua técnica resulta ao contrário.
Quando André Ventura entra num debate, está a falar para os seus fiéis e para os seus potenciais eleitores, que têm um perfil determinado. Não adianta os jornalistas virem a seguir dizer às pessoas que ele teve uma má prestação e que perdeu o debate, quando quem esteve com disponibilidade para o ouvir percebeu exatamente o contrário. A técnica não funciona, como os resultados das eleições de 2024 deixaram por demais evidente.
Mas André Ventura é só um exemplo. Talvez o mais evidente, porque também ele é o mais contundente dos contendores. À esquerda e à direita, há outros exemplos de candidatos que, conforme os gostos dos avaliadores, são avaliados erradamente pela prestação que tiveram. E o pior é quando algum(s) desses avaliadores tentam ser honestos na sua missão. Aí cai o Carmo e a Trindade. São torpedeados com interrupções e críticas dos companheiros de painel, acabando sempre por transformar uma avaliação numa discussão de opções políticas. Chega mesmo a acontecer, que há debates de avaliadores bem mais acesos do que os debates que os avaliadores avaliam. É o mundo de pernas para o ar. Mas no final do dia, a audiência ouve e não muda de opinião, provavelmente aproveita para confirmar a convicção que teve no debate, o dos políticos.


Jogar limpo é o que se pede, aos jornalistas avaliadores. Eu juíza jornalista me confesso. Avaliarei bem ou mal, mas tentarei não misturar convicções com avaliações. Se Raimundo estiver bem terá boa nota. Se Montenegro ou Pedro Nuno se enrolarem nos argumentos terão chumbo garantido. Se Sousa Real convencer poderá vencer e se Mortágua, Tavares e Ventura fizerem o seu papel, não terei problemas em dar-lhes nota positiva.