Chocolate, carne, ovos, farinha e azeite são alguns dos produtos mais usados na Páscoa e que viram o seu preço disparar nos últimos anos, com destaque para os últimos meses. A mesa desta época vai ficar mais cara e os consumidores assumem redução de custos. APED confirma essas subidas, justificadas com o contexto geopolítico, mas garante que os supermercados estão a tentar absorver as subidas. O futuro é incerto mas tudo indica que os valores podem continuar a aumentar
Páscoa é sinónimo de chocolate. Ovos, coelhos, amêndoas, bolos, tudo nos remete a este sabor. Mas este ano, o chocolate à mesa dos portugueses pode ser mais amargo. Pelo menos no preço que disparou neste último ano. Uma volta pelos supermercados tradicionais permite perceber que não se encontra um ovo da Páscoa a menos de sete euros. E estamos a falar dos da chamada marca branca.
Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), só entre dezembro de 2024 e janeiro de 2025, o preço do chocolate subiu 9,87% em Portugal.
Já uma análise da Deco Proteste revela que nos primeiros três meses deste ano, registou-se um aumento de 26% no preço de uma cesta com quatro chocolates à venda nos supermercados em Portugal: uma tablete de chocolate de leite de marca própria, uma tablete de chocolate de leite da Milka, uma tablete de chocolate para culinária de marca própria e uma tablete de chocolate para culinária da Pantagruel. Entre 1 de janeiro e 26 de março, estes quatro chocolates aumentaram 2,06 euros, para um total de 10,09 euros.
Só para se ter uma ideia, a Deco Proteste revela que, nos últimos três meses, o chocolate cujo preço mais aumentou foi o chocolate para culinária da Pantagruel, com uma subida de 44%, de 2,84 euros para 4,09 euros. A tablete de chocolate de leite da Milka aumentou 27%, de 1,82 euros para 2,30 euros, e o chocolate para culinária de marca própria aumentou 16%, de 2,26 euros para 2,62 euros. Já o chocolate de leite de marca própria foi o único desta cesta cujo preço desceu neste período (menos 3%), embora apenas alguns cêntimos, de 1,11 euros para 1,08 euros. No entanto, mais caro que há uns meses, altura em que o seu preço não chegava a um euro. Só durante o ano de 2024, o preço do chocolate subiu mais de 40%, uma subida que vem a acontecer ao longo dos anos, uma vez que entre 2022 e 2023 os preços aumentaram 11%. Estas subidas dos chocolates tradicionais estenderam-se, claro, aos doces mais consumidos nesta Páscoa, como é o caso dos ovos de chocolate e das amêndoas.
Mas a que se deve estas discrepâncias de preços face a anos anteriores?
À LUZ, Henrique Tomé, analista da XTB, refere que os máximos históricos foram atingidos a 16 de dezembro do ano passado e que, desde essa data, os preços do cacau já recuaram mais de 30%. No entanto, o analista sublinha que «o que levou ao aumento dos preços foi, na altura, a crescente preocupação acerca da qualidade das colheitas e o consequente impacto na oferta global». E adianta que os dados mais recentes sobre as colheitas de cacau na África Ocidental «não são encorajadores». Na Costa do Marfim, por exemplo, «estima-se uma produção de 400.000 toneladas de cacau durante a época de meados da colheita, em comparação com 440.000 toneladas no ano passado».
«Em contrapartida, a última previsão da ICCO [Organização Internacional do Cacau, em português], do final de março, indicava um excedente de 142.000 toneladas no mercado do cacau para a época 2024/2025 – o primeiro excedente em quatro anos –, o que pode estar associado a uma queda na procura devido aos preços significativamente mais elevados», diz Henrique Tomé.
À LUZ, Gonçalo Lobo Xavier, diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) recorda que o cacau tem sofrido aumentos de preços na produção e que, consequentemente, «os produtos que têm cacau, particularmente o chocolate, têm sofrido aumentos decorrentes dessa escassez e da pressão do mercado». E defende que «torna-se cada vez mais difícil suportar estes aumentos sem os passar de alguma forma para o produto final, pois a indústria também o faz, naturalmente».

Outros produtos mais caros
Mas nem só de chocolate vive a Páscoa dos portugueses e produtos tão típicos desta época como os ovos, o cabrito ou o borrego também viram os seus preços disparar.
Segundo dados da Deco Proteste, alguns produtos associados tradicionalmente à Páscoa, viram os preços crescer muito desde 5 de janeiro de 2022, altura em que a associação começou a fazer este levantamento dos preços. A carne de novilho, por exemplo, viu o seu preço duplicar, com um aumento de 100%. Está, atualmente, a custar uma média de 11,64 euros o quilo, um crescimento de 5,82 euros face a 2022. Se olharmos apenas para o intervalo entre 1 de janeiro deste ano e 9 de abril, o valor desta carne registou um crescimento de 11%.
Já os ovos, tão usados nesta quadra, dispararam 80% desde 2022, 27% só nos últimos quatro meses. O azeite aumentou 56% e a farinha para bolos viu o preço crescer 49% em três anos.
Além disso, dados divulgados pelo Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral revelam que o preço de um borrego vivo com mais de 28 quilos subiu mais de 40% em comparação com o valor registado em março do ano passado. Já o cabrito revela um crescimento de 16% face ao ano anterior.
Gonçalo Lobo Xavier justifica o aumento do preço dos ovos com o facto de o setor estar a enfrentar uma sequência de vários surtos de gripe aviária que ocorreram em diversos países, «com consequências na produção», defendendo que o caso dos Estados Unidos «será o mais mediático, mas teve impacto em todos os mercados pois, no caso português, não só não somos autossuficientes em ovos, para fazer face à crescente procura que se tem verificado no nosso país, como os países de onde temos de importar, também sofreram ruturas e distorções decorrentes desta situação».
Importa dizer, segundo o diretor-geral da APED, «que se tem verificado um crescimento na procura de ovos por parte dos consumidores que tem diversas explicações, entre as quais a substituição de proteínas da carne e do peixe – tipicamente mais caras – pela proteína do ovo, mais em conta e também como base de uma alimentação saudável e associada ao desporto».
Quanto à carne, Gonçalo Lobo Xavier diz que o aumento do preço «tem também explicações decorrentes do aumento dos preços dos cereais e das rações, que continuam a pressionar o mercado e a influenciar negativamente os preços», acrescentando que a tensão geopolítica e a guerra económica de tarifas «tem, infelizmente, impacto na cadeia de valor e nos preços, embora os retalhistas estejam a fazer um enorme esforço para acomodar estes aumentos, estabilizando as margens».
O responsável atira que os retalhistas nacionais «têm um histórico de absorver os aumentos de preços e as flutuações de mercado», como aconteceu, por exemplo, em períodos de alta inflação. E o mesmo está a acontecer agora.
Questionado sobre se os valores podem continuar a crescer, Gonçalo Lobo Xavier diz que a tensão geopolítica provocada por esta guerra de tarifas entre os Estados Unidos «e o resto dos blocos económicos, mesmo no caso português e especificamente no retalho alimentar, provoca sempre distorções a médio prazo. Não se pode dizer que, por via do aumento das tarifas, os preços vão aumentar de imediato».