Um pacto para a habitação

O 1.º congresso internacional sobre habitação pública foi uma oportunidade para aprender sobre o tema, ouvindo as melhores experiências internacionais e dando voz aos verdadeiros especialistas

O presidente da Câmara de Oeiras, Isaltino Morais, lançou recentemente um desafio ao primeiro-ministro e ao líder da oposição: se a habitação é tão importante, como por todos vem sendo afirmado, e tão impactante na vida dos portugueses, devia ser objeto de um pacto de regime entre os dois maiores partidos portugueses (os que verdadeiramente podem governar).

O objetivo é alcançar, tão rápido quanto possível, a disponibilidade de habitação pública para 10%. Recordar que Portugal tem cerca de 2% de habitação pública, contra o 14% da França, 24% da Áustria ou os 34% dos Países Baixos. Este contexto tem corolário no estudo recente da OCDE, que afirma que Portugal é o estado-membro daquela organização no qual o acesso à habitação é mais difícil. Duro, mas revelador.

Na semana passada, no Taguspark, o Município de Oeiras organizou o primeiro congresso internacional sobre habitação pública. Foi uma oportunidade para apender sobre o tema, ouvindo as melhores experiências internacionais e dando voz aos verdadeiros especialistas no tema da habitação. É impressionante como em Portugal não se ouve os seus melhores.

Apesar do desafio lançado pelo autarca de Oeiras ser sobre a questão que mais preocupa os portugueses, ainda esta semana um jornal fazia manchete que aumentaram em 67% os pedidos de ajuda para pagar renda, e que as famílias já cortam na alimentação para poder suportar a casa, dificilmente este acordo se vê como possível. O contexto de extrema polarização política em que atualmente se vive, com PSD e PS a tenderem a encostar mais aos extremistas do que ao centro nos acordos para governar, faz com que toda a questão seja campo de batalha.

Portugal precisa, há anos, destes acordos de regime nas questões centrais do desenvolvimento do país. Curiosamente, a necessidade dos mesmos apenas tem paralelo no tempo que passa sem que haja acordo algum. No lugar dos acordos temos uma verdadeira ‘esquizofrenia legislativa’: vem PS vai para um lado, vem PSD vai para o outro. Cidadãos e empresas não sabem com o que contar. O país vai-se adiando e o Povo deixando de acreditar. Mesmo na habitação, no qual o governo Costa adiantou caminho, o governo seguinte complementou e logo o PS criticou uma reforma que pouco mais queria fazer do que densificar o que vinha sendo feito.

Em tempo de campanha eleitoral, quem fosse capaz de propor estes acordos, de modo a acabar com o eterno adiamento nacional, sairia reforçado, e seria esse ator o novo refúgio para a estabilidade.

No lugar disso, temos uma campanha que apenas tem sido verdadeiramente esclarecedora sobre o desajustamento das forças políticas mais extremistas. Desajustamento na interpretação do mundo (nem parece que vivem neste), nas propostas e na forma confrontacional como fazem política.

Interrogo-me se algum dia falarão para lá da claque. Se verdadeiramente falam para os que vivem as dificuldades quotidiano. Aliás, se pensam para lá da claque. Se pensassem, perceberiam o alcance do que Isaltino Morais propôs.