O slogan de campanha da AD ‘Portugal não pode parar’ remete claramente para a campanha do PSD de Cavaco Silva em 1987, que lhe valeu uma maioria absoluta. Pelos vistos Luís Montenegro julga que pode convencer os eleitores de que o seu governo foi injustamente derrubado no parlamento, quando estava a ter imenso sucesso na realização das reformas de que o país precisa. A verdade, no entanto, é que essa narrativa não tem qualquer base nos factos e por isso nunca irá conduzir a um resultado semelhante ao que o PSD de Cavaco Silva teve em 1987. A História não se repete, especialmente quando não há nada de comum entre as duas situações.
Em primeiro lugar, Cavaco Silva, entre 1985 e 1987, liderou um governo minoritário altamente reformista, que por isso esteve em confronto permanente com o parlamento, que sistematicamente inviabilizava as reformas de que o país necessitava. Por isso é que os partidos da esquerda levaram o confronto ao ponto de apresentar uma moção de censura ao Governo, tentando substituir Cavaco para aproveitar o bom momento económico do país. Mário Soares optou, no entanto, por dissolver o parlamento levando a que o PSD de Cavaco obtivesse nas eleições mais de cinquenta por cento dos votos e uma enorme maioria parlamentar.
Luís Montenegro, pelo contrário, nunca apresentou uma reforma relevante no Parlamento, tendo-se limitado a continuar a desastrosa política dos governos de António Costa. Foi assim que na habitação foi incapaz de extinguir o infame imposto Mortágua e de alterar a lei do arrendamento, que afasta inúmeros proprietários do mercado, contribuindo para agravar permanentemente a crise da habitação. A ambiciosa reforma do IRC acabou por ser reduzida por acordo com o PS. No IRS a tributação mantém-se em níveis estratosféricos, tendo o Governo se limitado a baixar a taxa de retenção na fonte, levando a que os contribuintes sejam agora surpreendidos com uma enorme redução do reembolso ou mesmo com imposto a pagar. E, apesar dos elevados impostos pagos pelos contribuintes, os serviços públicos continuam de rastos, como se demonstra com o colapso evidente do Serviço Nacional de Saúde e os sucessivos atrasos nos processos judiciais mais complexos.
Para além disso, a queda do Governo em 1987 resultou de uma moção de censura do PRD, cuja justificação ninguém compreendeu. Pelo contrário, a queda do Governo em 2025 resulta de uma moção de confiança do próprio Governo, cuja justificação também ninguém compreende. Não há qualquer razão para que uma empresa da família do primeiro-ministro determine a queda de um Governo, por muitas comissões de inquérito que a oposição queira fazer sobre a situação.
E, por último, as eleições de 1987 determinaram uma maioria absoluta do PSD porque o PRD se evaporou, o que já na altura era claramente previsível se houvesse eleições. Pelo contrário, em 2025 o Chega e a Iniciativa Liberal não vão desaparecer, pelo que uma maioria absoluta da AD é completamente inviável. E até há o sério risco de o PS ficar em primeiro lugar nas eleições legislativas, como aliás ficou nas europeias, caso em que as possibilidades de ter um governo de direita seriam extremamente dificultadas.
Foi por isso completamente errada a estratégia de Luís Montenegro em provocar eleições antecipadas. Não vale a pena por isso a AD andar a reproduzir os slogans da campanha do PSD de Cavaco Silva de há quase quarenta anos, julgando que dessa forma consegue obter o mesmo sucesso eleitoral. Não é Cavaco Silva quem quer e, como afirmou Heráclito, ninguém se pode banhar duas vezes nas mesmas águas do mesmo rio.