Creio na Santa Igreja 

Francisco morreu, a Igreja chora o Papa, com esperança. Deus não abandona a sua Igreja, por isso é que ela cá anda há 2000 anos.

A notícia da morte do Papa Francisco trouxe uma avalanche de elogios da direita à esquerda.

De Mariana Mortágua a André Ventura, de Donald Trump a Vladimir Putin, todos encontraram elogios à medida, não do Papa, mas dos próprios. Não estão em causa os elogios, que são de resto merecidos. O que me dá que pensar é o critério com que são feitos.

Fico com a sensação de que ninguém quer ficar de fora no elogio de um homem admirável, que ainda por cima já não está cá para ripostar. Não dizer nada fica mal, arranjar algo de bom para dizer, tratando-se do Papa Francisco, é fácil.

Parece-me que ficar pelos elogios redondos e parciais, não só é fazer uma injustiça a Jorge Mario Bergoglio, como é desperdiçar uma oportunidade de tornar evidente a razão pela qual um idoso, já para lá dos 70 anos, aceitou uma missão que lhe pediu que mudasse de nome e entregasse o último quarto da sua vida. Pense o caro leitor se estava disponível para a tarefa, contando só com as suas forças e em nome de privilégios e honrarias. Não estava, pois não? Nem eu.

Francisco, foi o sucessor de Pedro escolhido pela Igreja Católica para a conduzir nos últimos 12 anos. Ao aceitar a tarefa trouxe consigo as suas características pessoais e o seu modo singular de olhar o mundo. Foi escolhido tal como era, com as suas qualidades e os seus defeitos. Foi um Papa que levou a Igreja mais longe, que abriu e reabriu portas a todos, como gostava de sublinhar.

Mas isso não fez do Papa um produto branco, que agrada a todos. Pelo contrário, levou-o a assumir em nome da Igreja posições claras, em muitos casos, contra as correntes dominantes. Francisco foi um homem político, no sentido em que a missão que lhe foi confiada, a de pastor dos católicos em todo o mundo, a isso o obriga. Não olhar assim para o Papa que acaba de morrer, é não lhe fazer justiça e ignorar o que é a Igreja, fundada por Jesus Cristo e que por cá O faz permanecer vivo há mais de 2000 anos.

Retirar do menu do pontificado o que mais convém é esquecer o essencial. ‘A cultura do descarte’, as críticas aos que deixaram que o mediterrâneo se transformasse ‘num cemitério’, os alertas sobre ‘uma economia que mata’ e sobre ‘a cultura da morte’, não foram frases redondas, sem destinatário. Dois dias antes de morrer Francisco arranjou forças para receber JD Vance, o vice-Presidente dos EUA. Fraco e sem oxigénio para falar, o Papa arranjou forças para pedir uma outra política de imigração à administração americana. Não o fez por descargo de consciência, fê-lo com a autoridade de chefe da Igreja católica, a um governante que se diz crente.

Temer pelo futuro da Igreja e pela escolha que os cardeais venham a fazer é um absurdo para qualquer católico. Francisco marcou o mundo, sim, como todos os que lideraram a Igreja desde São Pedro. Em 2000 anos não há relato de Papas que tenham destruído a Igreja, nem de Papas que tenham desfeito aquilo que é essencial na Igreja. Não porque são todos iguais, nem porque têm todos o mesmo estilo, nem muito menos porque olham todos para o mundo e para os seus desafios, sempre novos e diferentes, da mesma maneira.

O segredo da autoridade do Papa está para lá da política, que também a há entre bispos, cardeais e várias tendências da Igreja. No dia em que os cardeais se fecharem na Capela Sistina em conclave, para escolher o novo Papa, lá dentro está o dono da casa: «Estarei convosco todos os dias até ao fim dos tempos». Este é que é o segredo que nos dá uma esperança contínua no futuro.