O tema das averiguações preventivas está na ordem do dia. Primeiro o caso Spinumviva do primeiro-ministro, Luís Montenegro. Agora o do secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos. O que é uma averiguação preventiva? A questão dos factos consumados.
A averiguação preventiva é uma ferramenta inovadora no combate ao crime que permite ao Ministério Público e à Polícia Judiciária intervir antes do ilícito penal. Esta figura jurídica permite ao MP ou à PJ investigar situações de iminente risco de crimes de corrupção ou económico-financeiros antes de haver indícios suficientes para abrir um inquérito-crime. Nos casos em concreto já ocorreram os factos que motivaram a abertura de averiguações preventivas. Estamos perante factos consumados que deveriam ser investigados no âmbito de um inquérito-crime. Levanta questões o espaço entre o propósito teórico da averiguação preventiva e a aplicação prática. Se os factos aconteceram o que há de ‘preventivo’ na investigação? Não estaremos perante uma forma de contornar os requisitos legais para a abertura de um inquérito-crime?
Averiguação Preventiva vs. Inquérito-Crime
O inquérito-crime é o procedimento formal quando há indícios de ter sido cometido um crime. O MP recolhe provas, ouve testemunhas e, se for o caso acusa os suspeitos. Porém, quando os factos que motivam a investigação já ocorreram, perde-se a lógica da prevenção e a averiguação preventiva torna-se uma espécie de ‘inquérito informal’.
Os casos mediáticos e a relevância excessiva das denúncias anónimas
Torna-se mais sensível quando os casos envolvem políticos. O MP tem frequentemente tornado públicas as averiguações preventivas quando resultam de denúncias anónimas, expondo ao julgamento mediático. Quando são já conhecidos os factos porque não abrir logo o inquérito-crime? A resposta levanta dúvidas sobre a utilização da averiguação preventiva de forma a contornar os requisitos legais da investigação formal.
Outro aspeto é a relevância excessiva dada às denúncias anónimas quando envolvem figuras públicas em contextos sensíveis como períodos eleitorais. O facto de o MP tornar públicas averiguações baseadas em denúncias anónimas, por vezes sem uma verificação prévia, tem implicações para a reputação dos visados e também para o normal funcionamento do processo democrático. A instrumentalização de denúncias anónimas para fins políticos ou mediáticos é um risco e o MP deverá ser cauteloso para que a justiça não seja usada como arma de arremesso em disputas eleitorais. Afinal a presunção de inocência não é só um princípio jurídico, mas um pilar fundamental da confiança pública na justiça.
Conclusão
A averiguação preventiva é uma espécie de alarme de incêndio para soar antes de se alastrar o fogo. Se o alarme toca após o edifício já ter consumido é questionável a sua utilidade. A sua aplicação em casos de factos consumados levanta dúvidas legítimas sobre a adequação e o respeito pelos princípios do Estado de Direito. É essencial que o MP a utilize com rigor, garantindo que a averiguação seja preventiva e assegurando que a justiça não seja palco de disputas políticas ou mediáticas em momentos sensíveis como os períodos eleitorais. Se o objetivo é proteger pessoas com relevância no estado de denúncias anónimas, por que razão há divulgação? O sigilo é a regra de ouro para tornar a investigação eficaz e proteger a reputação dos visados. Assim, o MP só conseguiu lançar o país numa nova confusão, como o caso recente de António Costa.
Advogado, Sócio fundador Melo Alves