O que é uma mulher?

A experiência transgénero desafia categorias herdadas e merece respeito. Contudo, isso não exige apagar os limites semânticos das palavras.

Chegámos a um ponto, no Ocidente de 2025, em que se discute publicamente o significado de ‘mulher’. O simples facto de tal debate ser necessário revela o estado cultural da nossa civilização. O progressismo contemporâneo, na sua ânsia de desconstrução, procurou substituir categorias fundamentais da identidade por conceções fluidas e autorreferenciais. Mas será que esta erosão dos fundamentos nos tornou mais livres, mais justos – ou apenas mais desorientados?
A ideia de que a identidade é puramente performativa e autodeterminada tornou-se, ironicamente, uma nova ortodoxia. Quem a questiona é frequentemente rotulado como retrógrado, instaurando-se uma moralização negativa do dissenso que sufoca o debate legítimo. Esta rigidez paradoxal expõe um traço comum às ideologias que se julgam libertadoras: a intolerância à discordância.
Recentemente, o Tribunal Superior do Reino Unido reafirmou que a definição legal de ‘mulher’ assenta no sexo biológico. A reação progressista acusou a decisão de excludente, mas essa crítica revela dois vícios do discurso dominante: a equiparação de divergência a preconceito e a substituição de argumentação por ‘slogans’ emotivos.
A pergunta essencial permanece: pode a identidade reduzir-se ao que alguém sente ou afirma ser? Se o ‘ser’ depende apenas da autodeclaração, então dissolve-se no mero ‘desejo de ser’. Qual seria, nesse caso, o limite para outras autodefinições igualmente subjetivas?
O progressismo atual tende a um relativismo extremo, onde a realidade se submete à subjetividade individual. Ignora, porém, que a identidade humana surge da intersecção entre biológico, cultural e simbólico – nunca é uma construção puramente interior.
Ter uma vagina não é condição suficiente, mas é necessária para ser mulher. A biologia impõe um horizonte objetivo, ainda que a cultura molde o género. Estudos do Instituto Karolinska (2023) mostram diferenças estruturais no cérebro entre homens e mulheres, reforçando uma base material para além da vivência subjetiva.
A experiência transgénero desafia categorias herdadas e merece respeito. Contudo, isso não exige apagar os limites semânticos das palavras. O caso das crianças é especialmente sensível: entre 2010 e 2021, os encaminhamentos para clínicas de género no Reino Unido aumentaram dez vezes (NHS, 2022), e 80% das crianças com disforia deixam de a sentir após a puberdade (Singh, Gender Identity and Gender Dysphoria in Children, 2021). Dados como estes justificam que cada vez mais países europeus restrinjam ou proíbam mesmo os bloqueadores hormonais em menores.
Os riscos são alarmantes: pessoas transgénero operadas têm 19 vezes mais probabilidade de suicídio (Journal of Psychiatric Research, 2021), e 70% dos adolescentes com disforia têm historial de autismo, trauma ou ansiedade (Journal of Pediatrics, 2023). Estes números exigem políticas prudentes, não preconceito.
Devemos:
Reconhecer a base material da condição humana (sem reducionismos);
Respeitar experiências singulares de género (sem relativismo absoluto);
Proteger menores de intervenções irreversíveis (com base em evidência).
Há homens e mulheres, há intersexualidade, e há a condição transexual – que merece reconhecimento próprio, sem redefinir conceitos fundamentais. Porque não reconhecer a condição transexual como distinta – nem homem, nem mulher – mas com igual dignidade, direitos e deveres enquanto pessoa?