Esta semana os portugueses (e espanhóis) viveram uma sensação estranha: um ‘apagão’ geral da rede elétrica, que levou com ele o funcionamento de diversos sistemas eletrónicos que fazem a vida moderna, particularmente os relacionados com as telecomunicações.
Em primeiro lugar o óbvio, que a maioria de nós devia saber: os sistemas que fazem o conforto da vida contemporânea são muito complexos e, como tal, pouco resilientes. A singularidade do nosso contexto implica que, sem alarmismos exagerados, devemos preventivamente ter alternativas (leia-se não dependentes da eletricidade ou da eletrónica), pelo menos por 48 ou 72 horas.
Depois, dizer que recorrentemente não pensamos nestas questões antecipadamente, pelo que não nos preparámos devidamente com os avisos que vinham sendo feitos. Como vimos, um ‘apagão’ da eletricidade é possível. Um ‘apagão’ eletrónico também será.
No ano passado, já pouca gente se lembrará, houve um apagão cibernético no Reino Unido. Foram então afetados os sistemas bancário, de saúde e os aeroportos, que ficaram ‘em baixo’ durante algum tempo. Mudou alguma coisa na vida das pessoas no país, não creio. As pessoas ajustaram comportamentos? Não.
Paralelamente, e mais importante, importa recordar que o verniz das nossas sociedades é mesmo só isso, uma frágil camada de verniz. A ‘ordem social’ atual, conforme a conhecemos, depende destes sistemas complexos, muito pouco resilientes. Sem os mesmos, e sem alternativas pensadas antecipadamente, aproxima-nos do estalar do verniz. Sinais como o açambarcamento de bens, compreendidos como necessários em situação de rotura, são negativos e fazem prever o dito ‘estalar do verniz’.
Nestas dias, que sucedem ao ‘apagão’, já está a haver o devido aproveitamento político. Por parte da situação, querendo demonstrar liderança; da parte das oposições, aproveitando quaisquer pequenas falhas. Estes aproveitamentos têm tanto de previsível quanto de compreensível. Porém, para lá da espuma da política, o importante é perceber as falhas de organização do Estado, seja no sistema de fornecimento energético, que descobrimos ser um capítulo do idealismo ambientalista (mais um…), ou do SIRESP, que falha sempre que dele necessitamos. O reconhecimento por parte do ministro Miguel Pinto Luz das dificuldades de funcionamento do SIRESP, foi o que mais relevante sucedeu sobre aquele dia. Não melhoramos se não reconhecermos as falhas.
Quando a poeira assentar, e regressarem as preocupações que fazem o nosso dia-a-dia, não pensaremos mais no que foram aquelas horas, nem nas preocupações que nos invadiram.
Afinal, nem chegámos a tomar banho de caneca…