“Não se entende que haja milhares de casa vazias”

Para o secretário-geral da Associação dos Inquilinos Lisbonenses, uma das soluções para o problema do arrendamento passa por regular e fiscalizar o mercado. E acredita que uma política fiscal progressiva poderá ajudar.

“Não se entende que haja milhares de casa vazias”

Como está o mercado de arrendamento?
Continua mal, a oferta é baixa, a procura é alta, apresentando preços elevadíssimos e os rendimentos ficaram mais ou menos estagnados.              

Há alguma perspetiva de os preços começarem a descer?
Não digo baixarem mas, pelo menos, estagnarem. Só seria possível se houvesse uma pressão política para a utilização dos imóveis que estão vazios. E aqui há duas situações, uns que estão vagos e outros que estão devolutos. Os vagos são casas relativamente recentes e os bancos têm bastantes por situações de incumprimento. Depois há os devolutos que são casas mais antigas. Por exemplo, tenho aqui ao lado um prédio da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa que quer vender, mas ninguém vai comprar por aquele preço. Está vazio e está pronto a usar, eventualmente, com pequenas reparações. Não se entende que haja milhares de casas vagas e devolutas quando não há restrições.

No caso da Santa Casa ou de imóveis do Estado é natural que sejam colocados no mercado, mas no caso dos privados não se pode obrigar…
O mercado está liberalizado não se entende porque é que não ganham dinheiro. É um bocado esquisito.

Muitos proprietários dizem que não têm confiança no mercado por incumprimento ou por terem receio de que as casas sejam destruídas…
Os incumprimentos são uma ninharia quando comparados com outros incumprimentos. Há muito mais dificuldades, por exemplo, em cumprir com o crédito pessoal junto da banca do que no arrendamento. Aliás, uma parte de algum incumprimento que se possa verificar tem a ver com a exorbitância das rendas. A necessidade é tal que há inquilinos que acabam por arriscar sabendo que no futuro vão ter dificuldade em pagar.

A solução passaria por uma maior regulação do mercado?
O mercado tem de ser regulado. Mas primeiro tem de ser registado, o que não acontece. Quem é quem? Quantos são dos particulares? Quais são das entidades sociais? Quais são das entidades públicas? Quantos são de fundos de investimento?, etc. Temos problemas de qualidade da oferta e situações de incumprimento dos dois lados. Depois não temos uma fiscalidade adequada à função económica e social da habitação do arrendamento e enquanto isto não for tratado não se resolve o problema.

O Governo e as autarquias têm acenado com programas das rendas acessíveis…
Tirando a consigna acessível não são nada acessíveis porque são 20% sobre a mediana e com o crescimento constante das rendas, essa tal mediana também vai crescendo. Também o programa Arrendar para Subarrendar só tem 300 casas. São programas que não funcionam, é preciso ir mais longe, é preciso fiscalizar o mercado, é preciso ter uma política fiscal escalonada e progressiva sobre as rendas, em que quanto maior for a renda, mais imposto paga.

O que espera do próximo Governo?
Estamos a elaborar um conjunto de propostas que vai na continuidade do que fizemos nos governos anteriores, em que insistimos que é preciso regular o mercado e para dar confiança às duas partes insistimos na criação de um seguro de renda e um de multirriscos. Também defendemos que é preciso fiscalizar por uma entidade que já esteja no terreno e que possa ter meios para fazer isso ou por uma entidade com meios adequados

A crise da habitação é um tema que falado nos debates políticos, mas têm sido apresentadas soluções?
As soluções que têm sido tentadas são todas avulsas, sem continuidade e com pouca expressão. Neste momento, não só somos pressionados pelos preços, mas também por mais de um milhão de cidadãos que vivem connosco e que precisam de habitação. Além disso, continuamos a assistir à não renovação de contratos, logo há despejos, não deixa de haver um conflito, mas é um conflito resolúvel. Depois há muita gente a viver em sobrelotação. Há problemas de dissolução de família que acabam por ter de continuar na mesma casa com os constrangimentos inerentes e filhos que voltaram para a casa dos pais. Socialmente estamos numa sociedade mais tensa, mais desequilibrada. É preciso encontrar soluções.