Nuno Álvares Pereira é, sem dúvida, uma das figuras mais marcantes e estudadas da história de Portugal. Conhecido como o Condestável do Reino, foi um homem que encarnou o espírito vencedor e determinado do povo português em momentos cruciais. Mas, para além da sua grandeza militar, a sua jornada até à santidade revela uma vida de devoção e abnegação raramente vista entre os grandes líderes da sua época. A história deste homem é uma fusão perfeita entre a espada e a fé, entre a defesa da pátria e a entrega ao divino. Diria mesmo, simbioses de estranha perfeição!
É sabido que Nuno Álvares Pereira nasceu em 1360 e que se destacou, desde muito jovem, como um líder militar de exceção. A sua lealdade inabalável ao Mestre de Avis, D. João I, foi fundamental na consolidação da independência de Portugal face às pretensões castelhanas. A Batalha de Aljubarrota, em 1385, foi o ponto alto da sua carreira militar, onde, com uma força bastante inferior em número, liderou o exército português numa das maiores vitórias militares da história europeia. Esta vitória não foi apenas uma batalha pela soberania de Portugal, mas também um momento definidor para a identidade nacional, e Nuno Álvares Pereira esteve no centro dessa narrativa.
No entanto, é bom lembrar que o título de Condestável, que lhe foi concedido em reconhecimento pelo seu valor, foi mais do que um simples cargo militar, representava a confiança total do reino nas suas capacidades e liderança. Porém, Nuno nunca usou o seu poder em benefício próprio. A sua humildade e dedicação à causa pública destacam-se no seu legado. Ao contrário de muitos nobres da sua época, que viam as glórias militares como uma oportunidade para enriquecer e aumentar a sua influência, Nuno Álvares Pereira manteve-se sempre fiel aos princípios de justiça e serviço à pátria.
Anos mais tarde, após uma vida dedicada à guerra e ao Reino, o Condestável começou a sentir uma chamada mais profunda. Aos poucos, distanciou-se das intrigas políticas e dos luxos da corte. O momento de mudança estava a chegar… Um dos pilares da construção do reino moderno, buscava agora outra forma de serviço – desta vez, ao serviço de Deus.
O marco histórico desta decisão é 1423, o ano em que Nuno abdicou das suas posses e títulos e entrou para o Convento do Carmo, em Lisboa, como simples frade. Para muitos, esta decisão pode ter parecido surpreendente, mas, para quem conhecia a profunda fé que sempre acompanhou Nuno, este passo era natural. A sua vida de frade carmelita foi marcada pela simplicidade e pela oração, afastando-se das glórias passadas para viver em humildade.
Alguns séculos depois, em 2009, dá-se a canonização de Nuno Álvares Pereira, pelo Papa Bento XVI, um reconhecimento tardio, mas certamente merecido, que já vinha desde o século XV, quando o povo o começou a venerar como santo pela sua vida de virtude e devoção. Nuno sempre demonstrou uma fé inabalável e uma devoção à Virgem Maria. Acreditava profundamente que a vitória em Aljubarrota se devia à intervenção divina e, por isso, sempre viveu com um sentido de gratidão e serviço ao sagrado.
A sua canonização foi um momento de grande orgulho para Portugal. A figura do Condestável transcendeu o campo militar para se tornar um símbolo de virtude, de sacrifício e de fé. Tornou-se um exemplo de como o poder pode ser exercido com humildade e como a glória terrena pode dar lugar à devoção espiritual.
Hoje, Nuno Álvares Pereira é visto como um herói não apenas pelas suas conquistas militares, mas pela forma como soube equilibrar a espada e a cruz. A sua vida é uma lição de serviço: primeiro ao seu país e depois a Deus. Num tempo em que tantas figuras de poder são vistas com desconfiança, o exemplo do Condestável mostra-nos que é possível liderar com integridade, com fé e com um sentido profundo de dever.
O Santo Condestável, como atualmente é também conhecido, tornou-se uma inspiração, não só para os portugueses, mas para todos aqueles que acreditam que a verdadeira grandeza vem do serviço aos outros e da abnegação pessoal.
Docente da UP do Instituto Universitário Militar