Os debates sobre o mercado da habitação parecem quase sempre ignorantes das ‘leis da oferta e da procura’, aquelas que o Nobel Paul Samuelson dizia que até um papagaio recitava: «Quando a procura aumenta o preço sobe e a quantidade transacionada aumenta; quando a oferta aumenta o preço desce e a quantidade aumenta». Quanto menos reativa for a oferta ao preço de mercado, maiores serão aos aumentos de preço causados por uma dada expansão da procura. E parecem ainda ignorantes dos efeitos da imposição de limites máximos aos preços de mercado (no caso rendas): aumento da quantidade procurada, redução da quantidade oferecida, e agravamento, portanto, da escassez. A afetação dessa oferta de habitações, que é agora escassa relativamente à procura, gera incentivos à economia paralela (aquilo que para bens consumíveis se chama mercado negro, ou seja, pagamentos acima da renda tabelada) e de modo nenhum previne que as casas acabem por ir para aqueles que por elas mais estão dispostos a pagar (e o podem fazer).
Em Portugal, ‘Oferta’ e ‘Procura’ saíram dos manuais de Economia e tornaram-se uma arma político-ideológica. Para esquerda, a causa da escalada do preço das casas e das rendas nas grandes cidades é o aumento descontrolado da procura, em resultado do turismo, do alojamento local e dos investimentos imobiliários de não residentes ricos. (Interessantemente, à esquerda raramente se aduz a quadruplicação em 10 anos no número de imigrantes residentes como fator desse crescimento da procura.) Para a direita, a causa reside no lado da oferta, em anos e anos de construção nova insuficiente que levaram a uma escassez de oferta de habitação, (como o facto de hoje se construírem 1/5 das casas de há 15 anos atesta). Um complexo sistema legal e regulamentar faz com que seja caro e moroso construir e que, portanto, a oferta seja pouco elástica relativamente à subida do preço. Esta complexidade regulatória distorce também a distribuição dos preços das habitações em cada cidade, reduzindo a oferta de casa de menor qualidade e mais baratas relativamente à oferta de casas nos segmentos mais altos.
Ambas têm razão e nenhuma tem razão. Oferta e procura não podem ser encaradas isoladamente, mas sempre na relação de uma com a outra: o que interessa é a oferta condicional na procura. Em locais onde não existe procura de habitação a questão da oferta não se coloca.; se a oferta for muito elástica, a mesma expansão da procura de habitação consegue ser satisfeita com agravamentos moderados dos preços e rendas. Para complicar, variações na oferta e procura não são necessariamente independentes. Por exemplo, é concebível que um aumento da procura em Lisboa devida ao enorme boom turístico, induza uma retração da oferta de casas no mercado arrendamento, desviando-as para o mercado do alojamento local.
As questões aqui levantadas sobre o papel relativo da oferta e da procura no mercado de habitação são ultimamente empíricas. Faltando os estudos, ou sendo estes inconclusivos, resta-nos o bom senso educado pelas leis fundamentais da Economia. O problema da escassez de habitação a preços comportáveis tem causas do lado da oferta e da procura e a sua solução requer estimular a primeira e controlar a segunda.