As últimas cartadas de uma eleição incerta

À entrada para a última semana de campanha, as sondagens não mostram fumo branco, que é como quem diz, um resultado certo ou confortável para as eleições do próximo domingo.

As últimas cartadas de uma eleição incerta

Embora a tendência dos inúmeros estudos aponte para uma vitória da AD, a dúvida é se essa maioria vai ser uma “maioria maior” do que a obtida há uma ano, como tem pedido insistentemente Luís Montenegro. E é exatamente essa maioria menor que tem vindo a dar esperança aos socialistas de que os resultados finais ainda possam revelar uma inversão da tendência das sondagens e acabem por dar a vitória, por pouco, aos socialistas.
Em pista própria continua a jogar André Ventura, animado por estudos que não mostram uma diminuição das intenções de voto no Chega e que, nalguns casos dão até possibilidade de um crescimento.


No campeonato dos partidos mais pequenos há muita coisa em jogo. Até que ponto os partidos à esquerda se vão conseguir aguentar num ciclo de eleições sucessivas que têm mostrado um desgaste acentuado de comunistas e bloquistas, com a entrada no mesmo espaço político de um novo player, o Livre, que aposta em tornar-se a força mais votada à esquerda do PS. À direita, a Iniciativa Liberal faz o difícil caminho de partido responsável, com capacidade para entendimentos com a AD em cenário pós-eleitoral.

Quem dá maior estabilidade À entrada para a última semana de campanha, o primeiro-ministro dramatiza o discurso em torno da estabilidade. “Vão votar e pensem bem no que querem para o dia seguinte”, é a frase que Montenegro vai ensaiando, procurando passar a mensagem de que os eleitores devem evitar dispersar votos, porque o último ano já provou que um governo minoritário não tem capacidade para exercer as suas funções.


Agora que já ninguém tem dúvidas de que o “não é não”, não tem reversão possível, o líder da AD joga o trunfo do voto útil à direita, para os que não querem acordar no dia 19, “com um Governo que não escolheram, como aconteceu em 2015”. Para alcançar o objetivo, Montenegro vira-se sobretudo para o eleitorado do Chega, tentando não fazer mossa na Iniciativa Liberal, até porque, dentro da AD, é cada vez mais claro que terá de haver um entendimento pós-eleitoral com a IL. Mesmo que as duas forças políticas não consigam uma maioria absoluta, hipótese que cada vez parece menos provável, a aposta é que consigam somar mais deputados do que os eleitos da esquerda toda junta.


Simultaneamente a caravana da AD vai ter de estar particularmente atenta, nesta última semana de campanha, aos ataques que chegam do lado socialista. A perceção de que pode haver uma ADIL depois das eleições é o argumento perfeito para que os socialistas agitem o papão do radicalismo e do ataque ao estado social. Montenegro sabe, até porque já o ouviu durante esta campanha, que os pensionistas ainda não esqueceram os cortes da troica e que o processo de reconciliação entre os mais velhos e o PSD ainda é um processo em curso. É por tudo isto que é expectável que o discurso da reconciliação acenando com os aumentos dos últimos 11 meses de governação deverá estar no centro do discurso.

Vem lá o radicalismo As sondagens valem o que valem, é a resposta mais batida dos políticos em campanha, mas a verdade é que os indicadores que vão chegando às caravanas políticas têm uma grande influência no estado de espírito que se vive na estrada. Foi o que aconteceu na primeira semana de campanha eleitoral entre os socialistas, ao verificarem que sondagem após sondagem, a AD foi aparecendo à frente, ajudando à convicção de uma derrota.


Foi isso que levou a máquina socialista a mudar a estratégia e o que se espera nestes últimos dias é um carregar nas tintas dos perigos que podem estar para vir, sobretudo com um entendimento entre AD e Iniciativa Liberal. Pedro Nuno Santos vai apostar nos próximos dias no discurso do medo de um Governo “radical” que ameaça o Estado Social. É no voto dos pensionistas que o líder socialista mais aposta, procurando segurar o seu principal eleitorado com o argumento do voto de confiança.
A Spinumviva e a idoneidade do primeiro-ministro é um tema que tenderá a desaparecer do discurso de Pedro Nuno Santos, convencido de que já não possa render votos.


A seu favor, o Partido Socialista tem as oscilações que as sondagens vão dando e que, nalguns casos dão um crescimento ligeiro ao PS. Tal como a AD, também o PS deverá dramatizar a importância do voto útil à esquerda, que pode ainda permitir uma vitória.

O céu é o limite André Ventura não vai desviar-se do roteiro traçado para esta campanha, até porque todos os indicadores apontam para uma manutenção, ou mesmo, crescimento do partido.


O discurso de que “só a vitória interessa” vai continuar a ser utilizado pelo líder do Chega para convencer os descontentes com o sistema de que a tal “oportunidade” pode estar mesmo ao virar da esquina. A verdade é que Ventura sabe que se mantiver ou subir a sua votação continuará a ser essencial para viabilizar ou inviabilizar qualquer solução de futuro e essa é a sua força.


Depois de uma primeira semana em que procurou conquistar votos a norte, onde o partido tem mais problemas de penetração no eleitorado, os últimos dias vão concentrar-se a sul. Foi no Alentejo e, principalmente, no Algarve que o partido mais cresceu nas eleições de 2024 e estes são votos fundamentais para que o Chega possa manter o seu score eleitoral.


Até ao último dia de campanha Ventura deverá continuar a pedir “uma oportunidade” aos portugueses, não porque esteja convencido dessa vitória, mas porque sabe que essa ambição entusiasma os seus potenciais eleitores, muitos deles vindos da abstenção. Se conseguir repetir a proeza das eleições de 2024, com muitos votos vindos de eleitores que não costumavam ir às urnas, Ventura garante que a vitória é possível, não agora, mas numas próximas eleições que possam estar ao virar da esquina. Tudo depende dos resultados de domingo.

Sobreviver ao voto útil A Iniciativa Liberal à direita e o Livre à esquerda, caminham sobre gelo fino nesta última semana de campanha. São os dois partidos que têm maior expectativa de crescimento, porque não são radicais e porque podem ser úteis aos grandes partidos em cenário pós-eleitoral.
O grande desafio para os dois é evitar críticas que possam inviabilizar entendimentos futuros, mas ao mesmo tempo dar o tudo por tudo para evitar que os seus eleitores respondam ao apelo de voto útil que inevitavelmente socialistas e AD irão fazer.


Rui Rocha aposta tudo em mostrar-se como uma mais-valia para um Governo que nos últimos meses não foi suficientemente ambicioso e não “fez as mudanças que o país precisa”. Contrariando o discurso do voto útil, o líder da IL vai insistir na importância de fazer crescer o partido como única possibilidade de garantir um Governo estável de direita. O facto de todas as sondagens darem a vitória à AD funciona a favor dos liberais, já que as pessoas terão menos tendência em mudarem o seu sentido de voto, por considerarem que a vitória está garantida.


Do lado do Livre, Rui Tavares aposta nos cenários parlamentares e na soma de deputados depois das eleições, como o fator determinante para decidir quem vai governar. À semelhança do que aconteceu nas últimas eleições, o coordenador do Livre vai apostar na aritmética parlamentar, desvalorizando uma vitória socialista e realçando a importância de um partido forte à esquerda que, ao contrário de Bloco de Esquerda e PCP, dá garantias de uma solução segura para um governo de esquerda, ou não fosse Rui Tavares o pai da geringonça ainda antes de ela ter nascido.