Já há empresas que estão a sair dos consórcios no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência, apurou o Nascer do SOL. O nosso jornal sabe que na base desta decisão está o facto de muitas empresas perceberem que não terão tempo para cumprir os projetos até ao final do prazo e outras por perceberem que a verba que irão receber da bazuca não será a fundo perdido, mas sobre a forma de empréstimos. «Há muitas empresas que entretanto se aperceberam que não têm capacidade para levar a avante com os prazos definidos os projetos a que se propuseram, mas também há casos em se apercebem que têm de suportar mais custos do que estavam à espera e deixaram de ter interesse», revela fonte conhecedora do processo.
O nosso jornal sabe que esta desistência está relacionada sobretudo com as Agendas Mobilizadoras que contam com um financiamento de 2.874 milhões de euros, com o objetivo de concretizar 959 produtos, processos e serviços.
Mas o facto de as empresas virarem costas ao PRR não é de agora. Essa preocupação já tinha sido transmitida ao Nascer do SOL pelo presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP). «É uma situação que naturalmente preocupa a AEP, pelo efeito positivo que as Agendas Mobilizadoras têm na transformação e grau de sofisticação da especialização da economia portuguesa».
E já nessa altura Luís Miguel Ribeiro tinha referido que era necessário perceber o porquê destas desistências, referindo que «sobre este tema, as empresas têm manifestado, desde logo, queixas nos atrasos dos pagamentos», defendendo que «numa conjuntura financeira e económica desfavorável como a atual, a demora nos pagamentos gera dificuldade acrescida aos projetos, pelo que se exige uma execução célere, por forma a impulsionar este tipo de investimento, inovador e reprodutivo». E não hesita: «Os grandes atrasos tendem a gerar algum desinteresse, pois um projeto que é muito importante agora pode perder interesse alguns meses depois, em função da dinâmica do mercado».
Reprogramação avança
Aliás, o IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação levou a cabo a reprogramação das Agendas Mobilizadoras, ajustando os projetos às novas possibilidades do PRR depois destes ajustes terem recebido luz verde por parte de Bruxelas. «O IAPMEI dá início a um processo de reprogramação das Agendas Mobilizadoras, aumentando a ambição e ajustando estes projetos às novas circunstâncias e possibilidades no quadro da reprogramação do PRR», explicou, em abril.
No âmbito da reprogramação do PRR foi solicitada a extensão do prazo para cumprimento da meta final até 30 de junho de 2026 para garantir a implementação eficiente dos investimentos. E de, acordo com o organismo público, face à aprovação do prazo, é importante reprogramar os projetos, procedendo a ajustamentos das condições contratualizadas, de forma a concretizar «a meta final na data limite de implementação dos projetos e certificar a sua execução, assegurando o desembolso de fundos do PRR para Portugal».
Alterações que levam o ministro-adjunto e da Coesão Territorial a acreditar que Portugal vai «executar todas as subvenções até ao final de 2026» após a aprovação da reprogramação. «A aprovação europeia da estratégia do Governo para o PRR confirma que Portugal está no bom caminho e que irá executar todas as subvenções até ao final de 2026», disse, esta semana, Castro Almeida.
Recorde-se que o Conselho da União Europeia deu, na terça-feira, o OK à revisão do PRR de Portugal, abrangendo 108 medidas e que substituem «medidas inatingíveis» e visam a redução de encargos administrativos. Segundo a análise da Comissão, «as alterações visadas não afetam a relevância, a eficácia, a eficiência e a coerência dos PRR».
Segundo o gabinete do ministro, ficam agora reunidas as condições para que a Comissão Europeia prossiga com a avaliação do sexto pedido de pagamento, submetido por Portugal em novembro de 2024 e que representa um desembolso de 1.479 milhões de euros.
Atrasos fazem soar alarmes
E os números falam por si. De acordo com a AEP, a execução de 32% e de pagamentos a beneficiários de 33%, «apontam para uma execução bastante baixa, atendendo à data prevista de término do programa», daí ter visto com bons olhos a reprogramação da bazuca. «Além do alargamento do prazo de execução das Agendas Mobilizadoras, assinalámos também como positiva a possibilidade de as grandes empresas passarem a ser elegíveis no acesso a fundos para cofinanciamento dos seus investimentos, nomeadamente nas áreas do digital, das tecnologias limpas e da biotecnologia», disse o presidente Luís Miguel Ribeiro.
Também o Fórum para a Competitividade na sua última analise mostrou-se preocupado com os atrasos na execução do programa. «O valor de projetos do PRR aprovados subiu 107 milhões de euros para 21.235 milhões de euros (96% do PRR), enquanto os pagamentos a Beneficiários Diretos e Finais subiram 362 milhões para 7.525 milhões de euros (34% do total), uma deterioração face ao mês anterior, que já era insuficiente para cumprir o calendário». Já em relação aos projetos destinados às empresas diz que foi registado «um aumento de 22 milhões de euros nos projetos aprovados, para 6.003 milhões de euros, enquanto se verificou uma subida de 61 milhões de euros nos pagamentos para 2.611 milhões de euros (43% do montante aprovado)».
Ajustes
Com esta reprogramação da bazuca sofreram alterações de projetos no valor de 1.530 milhões de euros. A Barragem do Pisão no distrito de Portalegre (222 milhões de euros), a Dessalinizadora do Algarve em Albufeira (108 milhões) e a Tomada de Água do Pomarão (101 milhões) também no Algarve são alguns desses casos que passam para o Portugal 2030. Há outros projetos que serão financiados pelo Orçamento do Estado. A proposta do Governo mantém o valor global dos Fundos da Política de Coesão do Portugal 2030 (Fundo de Coesão) – 22.602 milhões de euros – bem como os montantes afetos a cada um dos programas Temáticos ou Regionais.
Ao Nascer do SOL, o presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR, Pedro Dominguinhos chegou a elencar outros projetos. É o caso da aquisição de equipamentos e construção e reabilitação de algumas unidades e serviços por parte do SNS, projetos de Inteligência Artificial para a administração pública, aquisição de autocarros elétricos ou movidos a hidrogénio, financiamento de projetos de combate à pobreza energética em bairros das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto e projetos no âmbito de Évora – Capital Europeia da Cultura em 2027.
Com esta troca de projetos deixa de estar previsto no Portugal 2030 o financiamento de material circulante ferroviário para a mobilidade urbana e transporte regional, uma vez que a litigância judicial está a atrasar a entrega daquele material, passando este investimento para o Orçamento de Estado.
Entre as principais alterações do Portugal 2030 propostas à Comissão Europeia, destaca-se a mobilização de 1.285 milhões de euros para a Plataforma de Tecnologias Estratégicas para a Europa – STEP, criada com o objetivo de apoiar projetos que incidam sobre tecnologias críticas na Europa, nomeadamente tecnologias digitais e inovação tecnológica, tecnologias limpas e eficientes em termos de recursos e biotecnologias. Passam também a fazer parte do Portugal 2030, 176 milhões de euros para o Apoio Regional de Emergência à Reconstrução – RESTORE, criado para reparar danos resultantes de catástrofes naturais ocorridas 2024 e em 2025.
«O PRR é um instrumento fundamental para o crescimento do País», já veio afirmar Castro Almeida. «É prioridade do Governo garantir que a sua execução decorre sem interrupções, cumprindo os objetivos estabelecidos e maximizando o impacto dos investimentos».
Recorde-se que, o PRR tem um valor de 22,2 mil milhões de euros, com 16,3 mil milhões de euros em subvenções e 5,9 mil milhões de euros em empréstimos do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, que dizem respeito a 376 investimentos e a 87 reformas. Atualmente, o país já recebeu 8,49 mil milhões de euros em subvenções e 2,9 mil milhões de euros em empréstimos.
Verbas comunitárias serão alvo de reformas
A presidente da Comissão Europeia acenou com a preservação dos «princípios fundamentais da política de coesão» no próximo Quadro Financeiro Plurianual, mas alertou para a necessidade de reformas. Numa carta a que a Lusa teve acesso, Ursula von der Leyen defende que o próximo Orçamento da União Europeia 2028-34 deve «basear-se num diagnóstico sobre o que funciona e não funciona» e retirar «ilações da implementação de todos os programas» anteriores. E acrescenta: «Vamos precisar de mobilizar reformas e investimentos para ajudar a construir aquilo que uma comunidade precisa para prosperar, preservando ao mesmo tempo os princípios fundamentais da política de coesão, como os princípios de parceria e de governação a vários níveis».
Esta é a resposta da presidente da Comissão Europeia a uma missiva enviada em outubro por 43 eurodeputados, cujo primeiro subscritor é o português André Rodrigues (PS), que expressavam preocupação devido às possíveis mudanças nos fundos da coesão no futuro quadro comunitário.
Para Von der Leyen, o próximo Orçamento de longo prazo é uma «oportunidade para criar uma política de coesão mais forte e moderna», chamando a atenção para o facto de a Europa ir enfrentar disparidades regionais e sociais. «Os desafios que a União enfrenta hoje são multifacetados. O meu objetivo é propor um novo Orçamento de longo prazo que seja mais focado e alinhado com as nossas prioridades e objetivos, mais simples na forma como funciona e com mais impacto», conclui.