A razão para se ocultar a identificação do denunciante/informador pode ter por base motivos genuínos e compreensíveis ao cidadão comum. O cidadão que tem conhecimento da prática de um crime pode ter razões muito válidas para não querer ser identificado no processo. Desde o receio de represálias físicas e/ou profissionais até à circunstância de ser apelidado de delator. O cidadão denunciante merece toda a proteção do sistema e, nesse sentido, tem de ter todas as garantias de que a sua identidade jamais será revelada a não ser a um juiz e de acordo com a Lei.
Contudo, os órgãos de polícia criminal, com a cobertura de uma boa parte do Ministério Público e dos juízes, têm permitido, ao longo do tempo, o acesso a essa informação sem nenhum controlo judiciário. O recurso aos denunciantes/informadores é um meio de investigação enraizado numa grande parte das investigações criminais, permitindo que estas se tornem autênticos lamaçais ao nível da prova. Sob a capa e a proteção dos polícias, estes indivíduos ocultam interesses da mais variada ordem.
Muitos processos criminais são desencadeados contra cidadãos comuns, ultimamente, visando personalidades com visibilidade na sociedade e sempre com o mesmo mote, ‘através de informadores chegou ao conhecimento desta polícia…’, ‘indivíduos que trabalham com esta polícia, mas não se querem identificar…’, ‘várias denúncias anónimas que a polícia reputa de sérias e honestas…’. Estas pretensas informações são, na maioria das vezes, autênticas simulações probatórias que visam esconder violações da Lei e que, a serem reveladas, inquinariam toda a prova do processo.
Excetuando os casos dos denunciantes genuínos, a maioria dos informadores/denunciantes presta colaboração com intenções bem definidas. Celebrizou-se a frase que um juiz exarou num processo-crime mediático: «A utilização de denunciantes/informadores tornou a investigação num autêntico lamaçal». À boleia de uma pretensa denúncia anónima, instaura-se um processo-crime contra um cidadão quando, na verdade, não existe nenhum denunciante. Ainda é frequente a realização de diligências intrusivas contra cidadãos fundamentada em denúncias anónimas.
A má utilização dos denunciantes/informadores ganhou enorme expressão no processo denominado ‘Tancos’ com consequências gravíssimas e cujos reais contornos ainda falta apurar. Um cidadão (identificado) dirige-se às autoridades para denunciar o propósito de vários indivíduos (identificados) pretenderem assaltar os paióis de Tancos. Os suspeitos foram identificados e foram fornecidas as moradas e os números dos seus telemóveis. Por opção da investigação foi decidido ocultar a identidade do denunciante. Essa circunstância impediu – e muito bem, pois é o que resulta cristalino da Lei – que um juiz autorizasse escutas telefónicas. Ora, se a identidade do denunciante não fosse ocultada, a escuta telefónica teria sido autorizada e, muito provavelmente, o assalto aos paióis de Tancos teria sido evitado.
As denúncias anónimas: o lodo da investigação
Excetuando os casos dos denunciantes genuínos, a maioria dos informadores/denunciantes presta colaboração com intenções bem definidas.