De que têm medo o Sérgio Sousa Pinto e o Miguel Morgado?

O poder não cairá no colo de Sousa Pinto e Morgado por aclamação. Isso não vai acontecer. O poder não é dado. O poder toma-se.

Chegou a altura de Sérgio Sousa Pinto. Chegou mesmo. A última geração da velha guarda retirou-se ou está em retirada. Ferro Rodrigues, Vieira da Silva, Santos Silva (que já não vai para novo), Ramalho, Costa… todos eles pertencem à geração que sucedeu a Soares, Almeida Santos, Medeiros Ferreira, Jaime Gama. É um ciclo que se fechou. E o que ficou?

O PS vive hoje uma armadilha terrível, que se aprofundou com os anos de poder e gestão tecnocrática. Uma das principais consequências é a pobreza dos seus quadros de primeira linha: figuras sem carisma, sem pensamento estratégico, sem experiência fora da máquina partidária. São socialistas de aviário, criados dentro do partido e desconectados do mundo real. Gente que nunca trabalhou fora do aparelho, que vive de conferências sobre equidade, gabinetes e carreiras internas. E que, no entanto, ocupa o topo da hierarquia política.

É neste cenário que o nome de Sérgio Sousa Pinto se destaca como exceção. Goste-se ou não do seu posicionamento, tem profundidade ideológica, visão de país e sentido histórico. Não recita a cartilha da moda. Tem mundo, tem leitura, tem coragem crítica. E não há muitos assim. Mas está à margem, talvez por escolha, talvez por cálculo. É aí que se impõe a pergunta: de que tem medo?

A situação interna do PS agrava essa urgência. O partido está intelectualmente esvaziado. As soluções em cima da mesa são fracas, irrelevantes ou recicladas. José Luís Carneiro é um político cinzento, sem presença nem rasgo. Fernando Medina é uma réplica menor de António Costa. Ana Catarina Mendes é apenas funcional. Já figuras como Alexandra Leitão, Marta Temido, João Costa ou Isabel Moreira representam o lado simbólico do PS: um esquerdismo identitário, urbano, sem impacto real nas massas populares. Não constroem alternativa nem mobilizam o país.

Neste contexto, o partido oscila entre esse esquerdismo de campus e o ódio reflexo e moralista ao Chega, como se o combate ao populismo se fizesse apenas com indignação e superioridade moral. É precisamente neste vazio que se abre espaço. Sousa Pinto devia intervir agora, enquanto ainda há palco.

A mesma lógica aplica-se ao PSD. Vale a pena olhar para Miguel Morgado, que, tal como Sousa Pinto, se distingue pela densidade cultural, pensamento estruturado, crítica ao sistema e visão estratégica. Sabe que o sistema liberal-tecnocrático faliu em representação, em valor e em verdade. E sabe também que a direita não pode limitar-se a gerir o que o PS deixou. No entanto, permanece entre o comentador e o pensador, sem dar o passo decisivo.

Mas o poder não cairá no colo de Sousa Pinto e Morgado por aclamação. Isso não vai acontecer. O poder não é dado. O poder toma-se. Têm mesmo de ir à luta. De arriscar. Até podem manter os seus ‘casacos’ – as suas marcas, os seus estilos próprios – mas têm de entrar no ringue. Descer do púlpito e falar com o povo real. Confrontar-se com a política como ela é: suja, imperfeita, mas decisiva. Porque, se não o fizerem, o espaço será tomado por outros nos quais não se reconhecem.

Importa, por fim, introduzir o terceiro elemento que já não pode ser ignorado: o Chega. Não como ameaça fascista – isso é um espantalho – mas como força disruptiva que capitaliza o vazio deixado pelos partidos tradicionais. É esse o adversário real. Não no plano moral, mas no plano político. E só se combate esse tipo de força com discurso concreto, ligação popular e coragem estratégica.