Peter Sullivan foi condenado em 1987 pela morte de Diane Sindall na sequência de uma confissão ‘forçada’ e por marcas de mordidas encontradas no corpo. Ao fim de 38 anos de prisão e de evolução da ciência, foram realizados novos testes de ADN que provaram a sua inocência, algo que sempre garantiu apesar da primeira e única confissão. Foi agora exonerado e libertado, naquela que já é considerada uma das maiores falhas judiciais do Reino Unido.

O ano era 1986. Agosto, na cidade inglesa de Birkenhead, no condado de Merseyside. Diane Sindall, uma mulher de apenas 21 anos, foi assassinada depois de a sua carrinha ter ficado sem combustível ao final de um dia de trabalho e ter caminhado a pé até casa. Foi alvo de uma violenta agressão sexual e acabou por perder a vida. Passados todos estes anos, a sua lápide ainda se enche de flores. Lá, está escrito: «Assassinada a 2/8/1986 por ser mulher. Em memória de todas as nossas irmãs que foram violadas e assassinadas. Jamais deixaremos que isto seja esquecido».

Diane era florista mas trabalhava num bar para conseguir dinheiro extra para o seu casamento que aconteceria no ano seguinte. O casamento nunca aconteceu porque Diane nunca chegou a casa.

A polícia montou uma verdadeira caça ao homem com todos os meios que conseguiu e chegou à fala com mais de três mil pessoas. 

A 23 de setembro do mesmo ano, as autoridades prenderam Peter Sullivan por, alegadamente, ter dado várias versões à polícia sobre os seus movimentos na altura do crime. Não voltou a sair da prisão até agora, quase 40 anos depois, altura em que foi provada a sua inocência. 

Mas vamos aos factos. Tudo indicava ter sido Sullivan a cometer o crime. No dia seguinte ao assassinato de Sindall, algumas das suas roupas foram encontradas a arder num pequeno incêndio em Bidston Hill, e um casal que passava pelo local disse à polícia que viu um homem a correr para fora dos arbustos, a quem reconheceu como ‘Pete’. Foi assim que a polícia teve o primeiro contacto com Sullivan. 

Interrogado pela polícia, terá «caído em lágrimas» – conforme os relatos – e confessado o crime. Disse que sim e disse que não algumas vezes. Talvez porque não teve acesso a apoio jurídico – que lhe foi negado. Mas assim que o conseguiu, retirou a confissão e disse à polícia que a tinha inventado. 

O seu julgamento aconteceu um ano mais tarde e teve como base principal as suas aparentes confissões bem como as alegações de especialistas odontológicos que diziam que as marcas de mordidas no corpo da vítima poderiam corresponder aos dentes do alegado assassino. 

Na noite em que Sullivan foi condenado à prisão perpétua por assassínio, a BBC North West Tonight relatou como ele ficou em silêncio no banco dos réus do Tribunal da Coroa de Liverpool, enquanto a  sua mãe gritava. A irmã desmaiou e precisou de ser reanimada. Ninguém esperava este desfecho.

Depois de Sullivan ter sido sentenciado, o detetive superintendente Tom Baxter disse à BBC que Sullivan «não era uma pessoa agitada», acrescentando «ele parecia ser um rapaz quieto – mas que tipo de pessoa comete estes crimes?». 

Sullivan tinha 30 anos. Hoje tem 68. Apesar de ter confirmado a violação numa primeira instância, retirou esse testemunho logo de seguida. Diz que se sentiu pressionado, estava «exausto, confuso e assustado», não tinha um advogado presente – o que era comum na época em casos de grande repercussão – e, a partir daí, tentou durante anos que o ouvissem: não tinha sido ele. 

Os testes de ADN na altura não eram tão desenvolvidos como são hoje. Durante décadas não se reavaliaram as amostras biológicas da cena do crime e só muito mais tarde, com o avanço da ciência forense, essas evidências foram submetidas a testes ADN.

Ao longo dos anos foram feitos vários pedidos de revisão do caso que, ou foram rejeitados ou demoraram muito a ser analisados. Tudo se tentou: os advogados alegaram que a confissão de Sullivan foi obtida ilegalmente e que novas provas poderiam provar a sua inocência. E em 2010 a defesa começou realmente a pressionar por uma nova análise das provas, alegando que os testes de ADN evoluíram. Além disso, hoje sabe-se que a análise das marcas dos dentes não é uma prova confiável. Foi então em 2020 que a defesa solicitou uma nova análise do material biológico recolhido na cena do crime, incluindo amostras de sémen e saliva que ficaram guardadas. O resultado? Sullivan é excluído de autor do crime porque o ADN encontrado não lhe corresponde. 

Após uma longa batalha judicial, em maio deste ano, o Tribunal da Apelação do Reino Unido anula oficialmente a sua condenação.

Este é já considerada uma das maiores falhas judiciais do Reino Unido, tendo em conta o tempo que Peter Sullivan passou na prisão por um crime que não cometeu. 

Agora, o homem precisa ainda de procurar uma compensação financeira pelo tempo que passou injustamente na prisão. 

Daqui tiram-se duas conclusões: a justiça também falha e o verdadeiro assassino de Diane Sindall ainda está à solta.